Organizações sociais denunciam conflito de interesses e exigem saída de advogada da Vale de conselho da ONU

 

Movimentos participaram de grupo de trabalho do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas na Suíça.

Organizações e movimentos sociais de todo o mundo, inclusive do Brasil, estiveram em Genebra, na Suíça, participando nesta semana da Consulta Interseccional do Grupo de Trabalho Intergovernamental de Composição Aberta (OEIGWG) do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). Este grupo é responsável por elaborar um Tratado Vinculante internacional que responsabilize e regule as atividades de Empresas Transnacionais (ETNs) por violações aos direitos humanos.

As organizações da sociedade civil aproveitaram o início da reunião, na terça-feira (15), para fazer uma denúncia pública da participação da advogada Clara Serva entre os especialistas jurídicos no Grupo de Trabalho do Tratado Vinculante. A presidenta da Amigas da Terra Brasil, Letícia Paranhos, leu parte da carta enviada há duas semanas para a presidência do GT, em que as organizações apontam o conflito de interesses e pedem que ela seja destituída da equipe de especialistas jurídicos.

Serva é sócia de um grande escritório de advocacia, que tem corporações transnacionais como seus principais clientes. Uma delas é a mineradora Vale S.A., do Brasil, envolvida em diversas situações de violações de direitos humanos. O crime mais grave foi o rompimento da barragem de rejeitos da Mina Córrego do Feijão, na cidade de Brumadinho (Minas Gerais), em 2019, que provocou a morte de 272 pessoas e um enorme impacto social e ambiental na região.

Na carta, as organizações sociais ressaltam que ainda no Brasil, a advogada contou com apoio financeiro declarado da empresa Vale S.A. para emitir uma nota técnica, com críticas do setor empresarial, ao Projeto de Lei (PL) nº 572/2022, que pretende criar uma lei marco sobre Direitos Humanos e Empresas no país, responsabilizando as megaempresas por suas violações. Os crimes cometidos pela mineradora Vale são usados como evidência pela sociedade civil e parlamentares que querem a aprovação do PL.

Advogada defende empresas transnacionais

A advogada Clara Serva também é membro da Global Business Initiative on Human Rights (GBI), uma plataforma composta por empresas transnacionais como a Nestlé, a petrolífera Chevron, Vale, a multinacional de mineração e metais BHP Billinton, Google, a Coca-Cola, a Total Energies (produção e comercialização de energia), todas elas envolvidas em alegações de graves violações de direitos humanos pelo mundo. Segundo as organizações da sociedade civil, a participação dela entre os especialistas jurídicos fere a Resolução A/RES/60/251, que determina que a independência e a transparência são mandatos obrigatórios para todos os parceiros da ONU.

“No caso de Clara Serva, há uma grave violação desses princípios. Seu histórico e desempenho profissional impossibilitam que ela emita opiniões imparciais, pois seu compromisso e prioridade profissional estão diretamente ligados aos interesses das transnacionais (TNCs), muitas das quais são responsáveis por violações de direitos humanos em todo o mundo”, afirmam as entidades na carta.

Brasil de Fato RS entrou em contato com a advogada por email e aguarda seu posicionamento, que será postado neste mesmo espaço.

A carta foi enviada para a presidência do GT pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), em nome da Campanha Global para Desmantelar o Poder Corporativo, Recuperar a Soberania dos Povos e Acabar com a Impunidade, articulação formada por mais de 250 organizações, movimentos, comunidades atingidas por transnacionais e sindicatos do mundo todo.

Em seu pronunciamento, Paranhos afirmou que no ano passado foram feitas várias denúncias em relação às entidades que representam o setor empresarial, como associações de empregadores internacionais, por exemplo, que defendem a visão das empresas transnacionais.

“Também, no ano passado, houve a seleção de ‘especialistas’, de ‘experts’ em direitos humanos e empresas. A Campanha [Campanha Global para Desmantelar o Poder Corporativo] exigiu, desde o início, que fosse um processo transparente, com critérios. Uma das coisas que pedimos é que tivesse representantes, juristas, advogados de movimentos sociais, comunidades atingidas, sindicatos. Infelizmente isso não aconteceu, e o que vimos é que a grande maioria dos advogados selecionados representam o setor empresarial”, afirmou ela.

Confira o pronunciamento:

Editado por: Katia Marko

Matéria publicada originalmente no jornal Brasil de Fato em https://www.brasildefato.com.br/2025/04/19/organizacoes-sociais-denunciam-conflito-de-interesses-e-exigem-saida-de-advogada-da-vale-de-conselho-da-onu/

 

Amigas da Terra Brasil participa de Missão de Monitoramento dos Direitos Humanos de atingidos por enchentes no Vale do Taquari (RS)

Nestes dias 27 e 28 de novembro, acontece a Missão de Monitoramento dos Direitos Humanos no Vale do Taquari. Depois de duas grandes enchentes que atingiram a região, em menos de três meses, a Missão fará visitas em quatro municípios para verificar como estão sendo feitas as ações de reparação das famílias e a reconstrução das condições de vida e de trabalho dos atingidos.

As atividades estão sendo organizadas pela Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, pelo Conselho Estadual de Direitos Humanos, pelo CDES Direitos Humanos, pela Acesso Cidadania e Direitos Humanos e pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

Além das visitas nos bairros de Lajeado, Cruzeiro do Sul, Arroio do Meio e Roca Sales, no dia 27 será realizada uma Audiência Pública no Seminário Sagrado Coração de Jesus, em Arroio do Meio, com a presença de atingidos de todas as cidades do Vale do Taquari e de autoridades. O objetivo é ouvir os relatos dos moradores da região sobre como estão sendo implementadas as políticas públicas e apresentar um relatório de monitoramento dos direitos humanos.

A Missão se encerra no dia 28 com uma mesa de diálogo com as autoridades locais para acompanhamento das ações que estão sendo realizadas e indicação de novas possibilidades para a reconstrução das regiões atingidas. Estarão presentes autoridades, entre elas a deputada estadual Laura Sito, presidente da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, e representantes da Comissão de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado, da Ordem dos Advogados do Brasil e do Tribunal de Justiça do estado.

“As mudanças climáticas já são uma realidade presente no nosso cotidiano e no Vale do Taquari atingiram diretamente milhares de pessoas. O Estado brasileiro e os governos das esferas federal, estadual e municipais precisam proteger vidas”, disse Alexania Rossato, coordenadora do Movimento dos Atingidos por Barragens. “A Missão quer alertar para o problema, ouvir a população e fazer o monitoramento dos diretos humanos”, completou Júlio Alt, presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos.

Acompanhe a cobertura da missão pelas redes sociais da Amigas da Terra Brasil (ATBr):

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Bairro Navegantes, em Arroio do Meio (RS). Bairro Navegantes, em Arroio do Meio (RS). Novembro, 2023. Foto: Carolina Colorio
Álbum de fotos da ATBR sobre a ronda no Vale do Taquari, no Rio Grande do Sul, nos dias 27 e 28 de novembro de 2023.

*Texto do post é o relise enviado à mídia
** Foto: Carolina Colorio/ ATBr

De punho esquerdo alto, rumo ao dia 2 de outubro

 


O dia 2 de outubro apenas irá inaugurar um árduo trabalho do povo brasileiro para reconstruir sua soberania – Carol Ferraz/ ATBr

 

O filósofo e crítico literário Walter Benjamin, ao se referir à revolução, não a definiu como a “locomotiva da história”, mas como um “freio de emergência”. É precisamente esse o sentimento de milhares de brasileiros e brasileiras, que se sentem dentro de um trem em alta velocidade para o colapso, com o Governo Bolsonaro.

Diante disso, precisamos ir com consciência para votar, com punhos cerrados, no próximo dia 2 de outubro, tal qual nossos braços estavam abertos à vacina, por um compromisso coletivo com a derrota do fascismo e com a clareza de não haver tempo para hesitação. Aqueles que resistem por devaneios individuais estão condenando, a si e ao povo brasileiro, a riscos de ameaças democráticas maiores.

Queremos substituir a integralidade do projeto de ódio e intolerância do governo por uma administração pública de transformações profundas, que seja capaz de superar a dependência histórica estrutural que conforma nosso lugar geopolítico, para que não haja espaço para ingerências internacionais sobre nosso destino como nação. Na verdade, o dia 2 de outubro apenas irá inaugurar um árduo trabalho do povo brasileiro para reconstruir sua soberania.

Juntamente com o nosso voto presidencial, precisamos garantir que haja condições de governabilidade e que nossa radicalidade também se faça presente no “puxar o freio”, sobretudo que as questões ambientais tomem centralidade na agenda pública. Para isso, precisamos estar atentos em nossos votos aos representantes parlamentares.

Muitas candidaturas estão assumindo o compromisso político com a construção da justiça ambiental. Inclusive, essas eleições estão com um número expressivo de candidatos e candidatas provenientes de coletividades marginalizadas. Temos por volta de 17 candidaturas quilombolas, 178 indígenas e 260 candidaturas LGBTQI+. Importantes movimentos populares, como MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), também lançaram candidaturas individuais e coletivas pelo país.

Uma vez mais, anunciar e construir nossas bandeiras

Nos últimos anos, tem-se utilizado o termo justiça ambiental para caracterizar a existência de uma desigualdade na distribuição dos danos e riscos ambientais, diretamente conectada a uma distribuição desigual da renda, moradia, etc. Ela é incorporada por várias organizações ao redor do mundo, dentre elas a Amigos da Terra Internacional, como uma bandeira de construção de uma sociedade mais justa, igualitária e harmonizada com a produção da totalidade da vida.

Vivemos uma interação de várias crises sistêmicas: climática, alimentar, de biodiversidade, hídrica, energética. Em muitas partes do mundo, estamos chegando a um ponto de não retorno, que ameaça a continuidade dos modos de produção e reprodução da vida. Tais crises são atravessadas pelas desigualdades estruturantes da sociedade, como classe, raça e gênero, e em nossa região, na América Latina, estão interligadas à presença da colonialidade do poder.

A luta por justiça ambiental envolve os debates das mudanças climáticas, sobretudo em uma vertente crítica à economia verde, mas não apenas. Pensar em justiça ambiental está conectado a construir direitos para os povos, soberania popular e, dentro dela, a soberania alimentar, hídrica, energética; construir uma economia popular para a vida, recriar laços sociais de proteção e cuidado popular e comunitário nos territórios, avançar numa transição energética justa e feminista. Não existe ambiente sem ser humano.

Desse modo, entre as bandeiras que dialogam com o tema está a retomada da Reforma Agrária, a construção da Reforma Urbana, a retirada das políticas de austeridade que cortaram gastos públicos com saúde, educação, programas sociais; a proteção dos direitos territoriais de povos indígenas, quilombolas e povos e comunidades tradicionais, os quais têm assegurado a proteção de várias áreas verdes. Não podemos seguir privatizando nossas Unidades de Conservação, cedendo à iniciativa privada o controle de bens naturais comuns.

Ano que vem, sob um novo governo e um novo Congresso Nacional, teremos que enfrentar os estragos do Governo Bolsonaro e, portanto, revisar os investimentos na proteção e conservação ambiental, as liberações de agrotóxicos, as concessões minerárias; a ofensiva no Pampa, na Amazônia, no Cerrado e no Pantanal e o histórico desmatamento da Mata Atlântica. Novamente, a política de desenvolvimento de grandes projetos como hidrelétricas, termelétricas, expansão minerária, portos e ferrovias para o agronegócio, terão que ser repensados à luz dos danos socioambientais que provocam.

Entendemos que a justiça ambiental se constrói nos direitos dos povos e na soberania popular por meio da organização social e política da sociedade, tão vasta em suas formas e expressões. Esse projeto não começa nessas eleições, nem tampouco terminará, mas se não pudermos construir uma melhor correlação de forças agora estaremos nos distanciando desse horizonte não apenas por 4 anos, mas talvez muitos séculos diante do imaginário que o bolsonarismo tenta nos impor.

Assim, construiremos nosso voto no próximo domingo com punhos altos para triunfar ainda na primeira volta, e faremos disso a continuidade de várias caminhadas da esquerda que nos trouxeram até aqui, para seguir construindo as possibilidades do futuro que queremos.

Afirmamos que a justiça ambiental está no centro da agenda ecológica para o Brasil. Somos um país com um acúmulo de lutas, resistências, saberes e fazeres populares que nos permitem parar a locomotiva do capital e trilhar um caminho outro que não o do perverso desenvolvimentismo, recolocando a produção da vida como o bem mais importante que devemos cultivar.

Vote com consciência. Vote para mudar o rumo para onde vamos. Vote em quem se compromete com justiça ambiental. Vote e siga se organizando e construindo o real poder transformador, o popular!

* Coluna publicada originalmente em 26 de Setembro em https://www.brasildefato.com.br/2022/09/26/de-punho-esquerdo-alto-rumo-ao-dia-2-de-outubro

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