Resistimos ao poder corporativo! Solidariedade Feminista Internacional contra o poder das corporações transnacionais

Frente às múltiplas crises do nosso tempo histórico, à emergência climática e ao avanço dos projetos de morte do capital, todos orquestrados por grandes corporações, mulheres erguem suas vozes. Denunciam falsas promessas dos discursos corporativos, a impunidade e o poder das empresas transnacionais, que em nome do lucro deixam um rastro de violência e destruição, sangrando corpos e territórios de vida. 

Em defesa das águas, florestas, sementes, do conhecimento e do cuidado, mulheres resistem e constroem economias alternativas, criam soberanias feministas e se organizam para proteger a vida e os bens comuns. Por todos os lados, marcham por uma transformação radical da sociedade, contra  a mercantilização. Em 24 de abril, durante a Semana de Solidariedade Feminista Internacional contra as Corporações Transnacionais, te convocamos a: agir, denunciar a violência corporativa e ampliar alternativas feministas.  

Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra - 13/03/25

Organizadas em amplas cadeias globais de produção, as empresas transnacionais prosperam graças ao roubo, à exploração do trabalho e à devastação dos bens comuns. Por onde passam, expropriam territórios e os transformam em suas propriedades. Atacam bens comuns para impor megaprojetos de mineração e da especulação imobiliária. Derrubam florestas para dar espaço ao agronegócio, principal causador da emissão de gases de efeito estufa (que nos levam à emergência climática) aqui no Brasil. Além disso, fazem armas e guerras, privatizam a água, a saúde e a educação. Vendem falsas soluções para os problemas que elas mesmas criaram.  O desenvolvimento que tanto pregam tem base na exploração, exclusão e no colapso ecológico. Na sua sanha sem fim por lucro, extraem tudo que podem de um planeta finito, o levando a um profundo desequilíbrio, o  que se reflete em enchentes de um lado, secas extremas e ondas de calor nunca antes vivenciadas do outro.

 

Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra - 13/03/25

 

As corporações detêm um poder que controla a economia, a política, a cultura e as formas de produção da vida. É contra esse poder que nascem as lutas ao redor do dia 24 de abril. A data relembra as mais de mil vítimas do desabamento do prédio Rana Plaza, em Bangladesh, em 2013. Memora as afetadas do Desastre de Bhopal, quando o vazamento de gás da fábrica de pesticidas Union Carbide India Limited matou quase 4 mil pessoas na Índia. Ou ainda, as 272 pessoas mortas em Brumadinho e as 19 mortas em Mariana, nos rompimentos de barragens de mineração em Minas Gerais. As vítimas fatais e afetadas da enchente de maio de 2024 no Rio Grande do Sul. A lista de graves violações aos direitos humanos por empresas é longa. E quase sempre, na linha de frente, estão mulheres. Em geral, as que mais sentem os danos sociais e ambientais, especialmente se empobrecidas, negras, indígenas e lgbtqiap+. 

 Nos levantamos por direitos para os povos, para desmantelar o poder corporativo e para que a vida esteja acima do lucro! Seguimos em marcha por uma economia feminista e popular. Nossos corpos, territórios e bens comuns não estão à venda.

Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra - 13/03/25

#tbt Nas imagens, registros do dia 13/03/25, quando Mulheres Sem Terra realizaram ato em frente a fábrica de produção de celulose da CMPC, em Guaíba (RS), denunciando a flexibilização ambiental, o avanço dos monocultivos no bioma Pampa e a responsabilidade de grandes empresas por crimes ambientais. O ato expôs que o agronegócio e os megaprojetos causam envenenamento da natureza e das pessoas, e que os créditos de carbono dos monocultivos (como o de eucalipto, caso da CMPC) são sujos – falsa solução para a crise climática. Outra denúncia foi do anúncio da CMPC sobre nova fábrica em Barra do Ribeiro, maior que a de Guaíba, ainda mais poluidora. Além disso, o momento foi de solidariedade às pessoas trabalhadoras e moradoras do entorno, que no dia 23 de fevereiro foram afetadas por vazamento de dióxido de cloro da fábrica.

https://www.instagram.com/p/DHZQIeIR3a2/

Leia a  Declaração Internacional da MMM: Resistência feminista contra o poder corporativo: a vida acima do lucro, a paz acima da guerra

Leia a nossa coluna no Jornal Brasil de Fato: Os impactos das empresas transnacionais na vida das mulheres

“Eucalipto não é floresta”: Em jornada de luta mulheres sem terra denunciam expansão do monocultivo no RS

Na quinta-feira (13/03), Mulheres Sem Terra realizaram ato em frente a fábrica de produção de celulose da CMPC, em Guaíba (RS). A Amigas da Terra Brasil e o Levante Popular da Juventude somaram ao momento, protagonizado por mulheres e pessoas LGBTQIAP+. Entoando que “Eucalipto não é floresta” e que “os mesmos que destroem a natureza são aqueles que destroem a vida das mulheres”, presentes denunciavam  o avanço dos monocultivos no bioma Pampa, a responsabilidade das grandes empresas por crimes ambientais e a necessidade da luta por dignidade, terra, território e em defesa de direitos e da natureza.

Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra - 13/03/25

Com falas, cartazes e cantos, expuseram que o agronegócio e os megaprojetos causam o envenenamento da natureza e das pessoas, e que os créditos de carbono dos monocultivos (como o de eucalipto, caso da CMPC) são sujos – uma falsa solução para a crise climática. Outra denúncia foi quanto ao anúncio da CMPC sobre nova fábrica em Barra do Ribeiro, ainda maior que a de Guaíba, ressaltando os impactos socioambientais de atividades do ramo. O momento também foi de solidariedade às pessoas trabalhadoras e moradoras do entorno, que no dia 23 de fevereiro deste ano foram afetadas por vazamento de dióxido de cloro da fábrica.

Neste encontro entre MST, juventudes e mulheres organizadas, a expansão dos monocultivos de árvores (desertos verdes) da CMPC foi abordado como crime ambiental e projeto de morte do capital.  Durante a ação em frente à fábrica de celulose da CMPC, mulheres e aliades entoavam: “Eucalipto não é floresta, CMPC devolve o pampa já. As mulheres da reforma agrária querem terra para trabalhar”.

Quem não pode com as mulheres, não atice o formigueiro

“Estamos aqui para denunciar essa empresa criminosa que acaba com a vida das mulheres. Nós, mulheres sem terra, mulheres da cidade, mulheres acampadas, seguiremos denunciando o capital e a destruição que o agronegócio provoca nos nossos corpos e nos nossos territórios. Nós lutamos pela vida, pela biodiversidade e pela defesa da produção de alimentos saudáveis. Nós ainda estamos aqui, e faremos a luta contra todas as formas de violência”.  Fala coletiva durante ato em frente à CMPC. 

Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra - 13/03/25

Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra - 13/03/25

Na data, foram realizadas ações em diversos pontos do Rio Grande do Sul para denunciar o avanço da silvicultura, em especial do eucalipto, e o risco que traz para a vegetação nativa e vida da população, sobretudo para o Bioma Pampa, ameaçado de extinção.  A ação também ocorreu em  Porto Alegre, Pelotas, Santana do Livramento e Tupanciretã, com marchas, intervenções culturais, debates, entrega e plantio de mudas. Sob o lema “Agronegócio é violência e crime ambiental, a luta das mulheres é contra o capital!”, a ação faz parte da mobilização do Movimento Sem Terra (MST) para marcar o 8 de março, por meio da Jornada Nacional de Lutas de 2025. Entre 11 e 14 de março, o MST realizou encontros, formações, plantios, marchas e protestos por todo o Brasil para denunciar as violências do agronegócio, das corporações e dos monocultivos – que expropriam corpos e territórios, envenenam povos e terras, mercantilizam alimentos e a natureza, secam rios, aprofundam desigualdades e agravam a crise ambiental.

Confira o vídeo de cobertura do ato e relatos das mulheres organizadas:
INSERIR AQUI

“Nós, mulheres do movimento, nos sentimos nesse compromisso com a sociedade brasileira e principalmente com o nosso bioma Pampa. Queremos alertar que um avanço desses do agronegócio e ainda hoje liberado por lei sem um zoneamento ambiental, ele pode ser uma catástrofe, ainda mais no Rio Grande do Sul que sofre drasticamente com as mudanças climáticas”, diz Lara Rodrigues, dirigente nacional do MST no RS. Lara também destacou que o avanço da soja, e a substituição por eucalipto, além de trazer impactos ambientais, tem impactos no modo de vida da população, das mulheres e na paisagem do bioma Pampa. O principal alvo da mobilização é a empresa CMPC, que está dominando a silvicultura no estado. “Ela tem um milhão de hectares plantados de eucalipto e a previsão de avanço de quatro milhões, principalmente no bioma Pampa. Estamos denunciando que essa empresa e esse avanço da silvicultura no Rio Grande do Sul não vão passar limpo”, afirmou Lara. O Bioma Pampa equivale a cerca de 64% do território do RS, mas mais de 30% de áreas nativas foram perdidas entre 1995 e 2023. A denúncia do MST é de que o principal motivo para a devastação é a silvicultura, por meio da produção industrial de árvores exóticas como eucalipto, pinus e acácia.

Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra - 13/03/25

Durante o ato frente à CMPC, Letícia Paranhos, presidenta da Amigas da Terra Brasil, falou sobre a impunidade corporativa, a relação da CMPC com a ditadura chilena e a importância da mobilização popular e das mulheres em defesa da terra: “Essa empresa vazou cloro, afetou mais uma vez a vida das pessoas e das mulheres. Todas essas casas foram cobertas, não houve alerta, não houve cuidado, não vai haver fiscalização e muito provavelmente vai seguir impune. A CMPC é criminosa desde sempre, no Chile estava junto com a ditadura e aqui segue violando os nossos direitos”. Ao contextualizar sobre a nova fábrica da empresa, questionou se a mulherada deixaria barato. A resposta, em uníssono, foi que não, que quem mexe com as mulheres se coloca para correr. “A ampliação da fábrica só serve para o lucro deles. Para a gente fica o custo das nossas vidas, da nossa saúde, da nossa terra”, expôs Letícia.

 

Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra - 13/03/25

Após o ato, uma moradora da comunidade que presenciou a ação abordou manifestantes. Em relato, solicitando não ser identificada, contou que quando houve vazamento de dióxido de cloro na empresa ela, que mora perto, foi acometida com mal estar, enjoo e vômito. A moradora comentou que tentou contatar a CMPC algumas vezes e acabou indo ao hospital, onde atestaram contaminação. Também comunicou que ao sair de casa viu fumaça por todo entorno, e após o contato começou a passar mal, o que reforça relato de outros moradores e até mesmo materiais em vídeo que comprovam que a fumaça saiu dos muros da CMPC, situação que a empresa contrapõe,  alegando que sensores localizados em seus muros não identificavam a presença de dióxido de cloro na ocasião.  “Eles afirmaram que sensores não identificaram dióxido de cloro, que a pluma de dispersão ficou dentro da empresa. Informaram num relatório oficial que foi para a Fepam que não extrapolou os limites da empresa, sendo que tem vídeos, tem muitos depoimentos que indicam que não foi o caso”, expôs o engenheiro ambiental Eduardo Raguse, da Amigas da Terra Brasil.

Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra - 13/03/25

A atividade em Guaíba teve continuidade no Assentamento 19 de Setembro. Contou com mística, partilha de refeições, acolhida e debate sobre a importância do cuidado e acolhimento na luta.  “Faremos uma linda formação com irmã num momento de acolhimento, que pra nós também é luta. Estarmos saudáveis também é uma ferramenta de fortalecimento e de enfrentamento contra o capital, porque nós precisamos estar vivas, precisamos estar fortes para lutar pelo que vem pela frente”, expôs Lara. De acordo com seu relato, a presença física em Guaíba se conectava com a presença de mulheres em luta por todo Brasil: “Estamos sincronizadas em todo estado. Vamos somar aqui no RS mais de mil mulheres, e nacionalmente estamos com várias companheiras em luta, no Espirito Santo dentro da área da Suzano, que companheiras ocuparam, na Paraíba, Mato Grosso,  Sudeste, muitas mulheres estão mobilizadas. É um grande dia, ficará marcado por esse nosso retorno do enfrentamento contra o capital, que sempre fizemos, mas é dada a largada que nosso 8M seguirá na denuncia e no autocuidado”.

Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra - 13/03/25

Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra - 13/03/25

Com palavras de ordem que evocavam a construção da reforma agrária popular, mulheres em luta semeavam a resistência. Além de ações orquestradas e postas em prática em todo território nacional, a atuação da mulherada em luta também se deu a partir de seus territórios locais, com incidências em espaços institucionais. No Rio Grande do Sul, uma das estratégias foi a entrega de Notícia de Fato ao Ministério Público Federal.

Notícia de Fato: Denúncia sobre a desregulamentação das normas ambientais relacionadas à silvicultura e seus impactos socioambientais no RS

“Entregaremos uma Notícia de Fato,  junto a movimentos ambientalistas. Teremos uma reunião com a Procuradoria Geral da União (PGU) e estamos pedindo a inconstitucionalidade da lei 14.876/2024, que libera a silvicultura (que é plantio de eucalipto, de pinus, dessas árvores exóticas), sem o licenciamento ambiental, que é mais ou menos: pode plantar eucalipto no bioma Pampa que isso é terra de ninguém. Entregaremos essa carta, simultaneamente nossas companheiras de outras três regiões estarão fazendo essas ações nos Ministérios Públicos e Procuradorias Regionais”, explicou Lara. Outro ponto abordado é a flexibilização a nível estadual, marcada pela Resolução do Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema) do RS, em 2023, quanto à aprovação de novo Zoneamento Ambiental para Atividade da Silvicultura (ZAS). Pontos que representam um retrocesso na proteção ambiental e ameaça aos direitos humanos, em especial, ao direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações.

Entrega Notícia de Fato MPF

Na Procuradoria Geral da República do Ministério Público Federal em Porto Alegre (RS), estiveram presentes para entrega do documento o Movimento Sem Terra (MST),  a Amigas da Terra Brasil (ATBr), o Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (Ingá) e a Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan). Também assinam o documento o Comitê dos Povos e Comunidades Tradicionais do Pampa, Fundação Luterana de Diaconia e Instituto Preservar.  “Estamos aqui para ver algum caminho por qual a gente tá lutando, e tentar pelas vias jurídicas algum apoio para a nossa luta. Luta que é feita no dia a dia nos territórios, que não é só a defesa das pessoas, dos nossos corpos, é a defesa do bioma Pampa que somos parte. Nossos territórios de assentamento estão dentro do bioma. A monocultura é uma denuncia que o Movimento Sem Terra faz há um bom tempo, e nesse último período vimos esse agravamento. A gente já vive muito a presença do avanço da soja nos territórios, mas a silvicultura nos assusta muito também, pela destruição que ela faz e também por essa mudança nessa essência que nós somos, na nossa vida, na biodiversidade dos territórios que a gente tá”, falou Lara durante a entrega da Notícia de Fato.

Entrega Notícia de Fato MPF  (8)

Letícia complementou: “Para nós é muito complicada essa flexibilização, para quem tá no território é ainda mais chocante porque é uma mudança radical da paisagem. Tu chegar no assentamento e ver 7 mil hectares de eucalipto plantado, tu perder o sol, tu ter uma seca devastadora como nunca teve antes, tu ver as crianças com sintomas porque o veneno chegou…Foi feito enfrentamento e depois se viveu na pele os impactos de um milhão de hectares no estado. Agora a proposta é passar para quatro milhões, e a gente sabe que o investimento está sendo muito pesado do setor da celulose aqui no estado, a gente percebe o marketing que está sendo feito para colocar uma outra narrativa para a CMPC, que está patrocinando o Gaúchão, com um projeto que chama Defensores da Natureza, fazendo jogos de futebol e com um poder muito grande da mídia. A gente sabe que mexe no imaginário político da população, até porque se colocam como a solução, com os canudos de papel, ou com financiamento que eles conseguem colocar, só que a contaminação, as violações que acontecem, isso não vem à tona. Vemos de um milhão passar para quatro milhões de hectares, então vão ser quatro vezes maiores as violações que vão ser sofridas. Temos que frear, é muito importante colocar alguma restrição porque depois que a violação acontece ela vai seguir impune”.

Expansão dos desertos verdes em um Pampa em extinção

Após almoço coletivo, no Assentamento, ocorreu a formação “Expansão dos desertos verdes em um Pampa em extinção”, apresentada pela Amigas da Terra Brasil. Nela, foi abordada a impunidade corporativa e a forma de operar de grandes empresas poluidoras, violadoras de direitos humanos e dos territórios. A lógica da CMPC, suas estratégias e ferramentas de cooptação via muita propaganda verde foram expostas, assim como dados sobre o impacto de suas atividades.

Formação Expansão dos Desertos Verdes num Pampa em extinção

A CMPC, do chileno Grupo Matte, anunciou recentemente um investimento bilionário na construção de uma nova fábrica de celulose, no município de Barra do Ribeiro, hipocritamente chamado de “Projeto Natureza”. A empresa investe muito em propaganda buscando construir uma imagem de sustentável, patrocina até mesmo o Campeonato Gaúcho e chegou ao cúmulo de criar um time fictício chamado “Defensores da Natureza”. Seu novo projeto, assim como a fábrica existente, irá despejar seus efluentes industriais no já tão poluído Guaíba, e impactar ainda mais o bioma Pampa com a expansão de seus monocultivos de eucaliptos transgênicos, gerando créditos de carbono sujos com mais desertos verdes num Pampa em extinção.

Em apresentação, dados científicos exibiam os impactos socioambientais do avanço dos monocultivos e de desertos verdes no Pampa, dando dimensão ao tamanho da ameaça e como uma nova fábrica de celulose pode causar ainda mais danos aos gaúchos, assim como à natureza. O (falso) discurso de socialmente responsável e ambientalmente sustentável da CMPC foi desmontado, e ponto a ponto de sua propaganda verde esteve em discussão.  Além disto, a  formação deu um mergulho no contexto histórico da celulose no Brasil e sua relação com a ditadura e opressões foram pauta.  A planta de produção de celulose de Guaíba (RS), emblemática em termos de impactos socioambientais, foi inaugurada pela norueguesa Borregaard em 1972, como um dos resultados da política desenvolvimentista da ditadura militar brasileira que convidava os investidores do mundo à “poluírem aqui”. Após diversas trocas acionárias ao longo dos anos, hoje a fábrica e os monocultivos de eucalipto são de propriedade da chilena CMPC, pertencente à família Matte, conhecida por ter sido uma das principais apoiadoras da ditadura de Pinochet. A empresa foi acusada, ainda, de crime de lesa-humanidade, no massacre de 19 de Laja, no Chile, com graves acusações que a apontam como protagonista do “Massacre de Laja”.

Confira a cobertura fotográfica aqui

8M: Mulheres reivindicam direitos, fim da escala 6×1 e denunciam o negacionismo climático

#8mportoalegre Dezenas de mulheres estiveram nas ruas do Centro de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, na manhã deste sábado, Dia Internacional de Luta das Mulheres.

O ato unificado foi organizado por sindicatos, centrais, movimentos e organizações sociais.

Foram às ruas pela vida das mulheres, contra os ataques aos direitos já conquistados, pelo fim da escala 6×1 de jornada de trabalho e melhores salários e condições de trabalho. Denunciaram o negacionismo climático e os responsáveis por essa destruição que vivenciamos.

Exigiram o fim da violência contra as mulheres e femicídios e o direito de decidirem sobre seus corpos e suas vidas. Querem permanecer vivas e com condições de vida digna a si próprias, aos seus filhos e a toda a humanidade.

Levaram sua solidariedade aos povos massacrados pelas grandes corporações capitalistas e seus governos, especialmente às mulheres palestinas, que seguem sendo assassinadas na Palestina. #palestinalivre!

Não aceitamos retrocessos, nem as tentativas de retirar direitos! Seguimos na luta até que todas sejam livres!

🔗 Acesse a galeria de fotos no Flickr da Amigas da Terra Brasil e saiba mais: 

8M Unificado - 08/03/25 - Porto Alegre

Seguimos na luta feminista frente aos ataques contra a democracia

A luta feminista é fundamental para alcançar a justiça ambiental. A resistência e o desmantelamento do patriarcado formam parte integral da Soberania Alimentar, da gestão das florestas e da democracia, assim como da luta contra os sistemas econômicos e as instituições políticas opressivas. Abaixo, apresentamos três entrevistas com pessoas que estão liderando lutas pela mudança de sistema e por um mundo mais feminista, centrado na justiça de gênero. 

Florestas e Biodiversidade – Rita Uwaka, Amigos da Terra Nigéria
Como é que o patriarcado e outras opressões se tornam obstáculos na luta pela democracia, pelas florestas e pela biodiversidade?

Existe uma forte ligação entre o patriarcado e a gestão florestal, porque o sistema patriarcal domina a governança das florestas e da biodiversidade e é um agente chave da apropriação das florestas. As relações de poder desiguais que o patriarcado reforça promovem falsas soluções e modelos agrícolas destrutivos, que transformam as florestas em commodities do agronegócio, por exemplo.

O patriarcado afeta todas as pessoas. O patriarcado influencia os processos de tomada de decisões relacionadas com a gestão florestal em detrimento das mulheres que dependem destas florestas, que são excluídas dos espaços de decisão e cujas vozes e preocupações não são tidas em conta nas políticas e práticas que afetam as florestas e a biodiversidade. Contudo, as mulheres são as principais cuidadoras e guardiãs das florestas, bem como aquelas que possuem conhecimentos tradicionais. 

A falta de controle na tomada de decisões se traduz em um desequilíbrio de poder que marginaliza as mulheres, as comunidades locais e outros grupos já excluídos.  Quando as partes interessadas não incorporam adequadamente as considerações destes grupos e quando os espaços de tomada de decisão não são suficientemente inclusivos e representativos, não se pode avançar e nem progredir. 

No entanto, ao enfrentar o poder e defender ao lado das mulheres o seu direito à autodeterminação, bem como o seu direito de dizer sim e de dizer não, fazemos com que as coisas mudem. Através do empoderamento das mulheres e da resistência contra as estruturas patriarcais, estamos formando líderes comunitárias.

É essencial que as pessoas compreendam o valor ecológico, social e cultural das florestas, bem como o que as florestas contribuem para as suas vidas e comunidades. Além disso, devemos permanecer alertas à ameaça constante do poder corporativo e às tácticas que as empresas utilizam – tais como subornar comunidades com subvenções e empréstimos – apenas para assumir o controle das suas terras e impedir o seu acesso às florestas. Ser capaz de tomar decisões informadas é fundamental para a nossa luta pela democracia, pelas florestas e pela biodiversidade.

Desmantelar a influência que o patriarcado tem nos processos de tomada de decisão relacionados com a gestão florestal e a conservação da biodiversidade exige resistir, mobilizar e transformar as atuais relações e estruturas de poder. Assim como criar processos de tomada de decisão inclusivos e participativos, que valorizem as contribuições das mulheres.

Lembremos que não há justiça ambiental sem justiça de gênero. Não há justiça de gênero sem mulheres!

 

Soberania Alimentar – Joolia Demigillo, Amigos da Terra Filipinas
Como o feminismo contribui na construção da Soberania Alimentar e como a democracia é defendida nessa perspectiva?

A Soberania Alimentar é uma aspiração a uma alternativa ao sistema atual, incapaz de alimentar a população com alimentos nutritivos, diversos e ecológicos. Baseia-se na consideração da alimentação como uma questão política que não deve ser separada dos contextos sociais, culturais e econômicos.

As mulheres em todo o mundo desempenham um papel muito importante na produção de alimentos, bem como na garantia de que estes estejam sempre disponíveis nas suas casas e comunidades. No entanto, a maioria, senão todas estas tarefas, não são reconhecidas, não são remuneradas ou são consideradas responsabilidades exclusivas das mulheres. Isto torna ainda mais difícil para as mulheres obterem oportunidades de participar em assuntos políticos.

É uma luta diária para as mulheres enfrentarem relações assimétricas de poder e a opressão de gênero – a nível pessoal e estrutural. As mulheres escolhem estar na linha da frente de muitas lutas pela democracia. Em todo o lado vemos a ascensão de governos autoritários que minam a democracia e impedem a realização do direito humano à alimentação adequada. A luta pela Soberania Alimentar é uma luta pela democracia e contra a opressão. Através da Soberania Alimentar, mulheres e pessoas de todos os gêneros podem expressar os seus direitos, a sua dignidade e aspirações.

Podemos viver o sonho da Soberania Alimentar quando este é deixado nas mãos dos povos, mulheres e jovens, para determinar que alimentos, como e onde são produzidos, distribuídos e consumidos. Portanto, isto requer uma mudança radical nos sistemas e estruturas da nossa sociedade.

O apelo à Soberania Alimentar é feminista porque quer transformar o sistema. É quando as mulheres e outras expressões de gênero são libertadas que podemos dizer que emancipamos a nossa sociedade da discriminação, da injustiça e da opressão.

 

Economia Feminista – Karina Morais, Marcha Mundial das Mulheres Brasil
Quais são as principais contribuições da economia feminista para as lutas em defesa da democracia?

A Economia Feminista é a nossa resposta objetiva ao sistema capitalista, neoliberal, racista e patriarcal, baseado na mercantilização da vida. O modelo econômico hegemônico baseia-se na separação entre trabalho produtivo e trabalho reprodutivo, o que historicamente criou a ideia de que o primeiro está ligado à esfera pública e o segundo à esfera privada. Trabalho produtivo é entendido como aquele que pode ser precificado e, portanto, gerar lucro. Já o trabalho reprodutivo envolve o trabalho doméstico e de cuidado, nas suas diversas dimensões. Isto inclui tarefas domésticas, cuidados com crianças, doentes e idosos, bem como apoio emocional aos familiares.

Essas atividades, por sua vez, são realizadas majoritariamente por mulheres, a partir da naturalização de uma construção social patriarcal. O que é visto como algo “natural” no universo feminino, até mesmo como expressão de “amor”, é na verdade um trabalho invisível, não remunerado, e que não é entendido como um componente da economia. Em outras palavras, exploração. Isso é o que chamamos de dia duplo e triplo das mulheres. Afinal, realizam atividades produtivas, mesmo que estejam em desvantagem no mercado de trabalho, e também realizam atividades de sustentabilidade da vida.

Esta transformação proposta pela Economia Feminista implica também a defesa da democracia, porque a lógica do modelo económico hegemónico é imposta através da violência e da desapropriação (expropriação), e é combinada com a opressão patriarcal e racista. A expressão do mercado livre que hoje domina a economia é profundamente antidemocrática. Mudar a economia para mudar a vida das mulheres é também um ato radical de defesa da democracia e da liberdade.

Neste sentido, desde a fundação da Marcha Mundial das Mulheres defendemos que não basta incluir as mulheres neste modelo econômico, em que o lucro está acima da vida e as vidas existem para gerar esse lucro. Precisamos romper com esse paradigma e propor um projeto político em que a sustentabilidade da vida esteja no centro da economia. Esta compreensão é central para as nossas formulações da Economia Feminista. É conceitual, mas faz parte da realidade prática da vida, principalmente quando observamos o conjunto de experiências alternativas que as mulheres construíram que vão na contramão ao modelo hegemônico, no campo e na cidade.

A Amigas da Terra Internacional manifesta solidariedade com o povo palestino e apoia a sua luta para acabar com a ocupação de Israel. Ao abordar a questão da democracia, é impossível celebrar o 8 de Março e o Dia Internacional dos Direitos da Mulher sem prestar homenagem à resistência passada, presente e contínua do povo palestino, especialmente das mulheres, que são os seus pilares. É imperativo reconhecer que a abordagem dos problemas ambientais não pode ser separada do reconhecimento do direito dos povos à soberania nacional na sua própria terra.

A Palestina é uma causa de direitos humanos e de justiça climática”, disseram Rasha Abu Dayyeh e Abeer Butmeh, membros do PENGON – Amigos da Terra Palestina, nesta entrevista publicada em dezembro de 2023.

Texto originalmente publicado no site da Amigas da Terra Internacional, em: https://www.foei.org/es/la-lucha-feminista-para-la-democracia/

 

8 de março volta às ruas sem medo e sem anistia!

Nessa 4ª feira (08/03), a Aliança Feminismo Popular (AFP), composta pela Marcha Mundial das Mulheres do Rio Grande do Sul (MMM RS), Movimento das Trabalhadoras e Trabalhadores Sem Teto (MTST) e Amigos da Terra Brasil, marcou presença no ato unificado do #8m2023  em Porto Alegre (RS). O ato se concentrou na Esquina Democrática, no centro da cidade, e encerrou no Largo Zumbi dos Palmares. Contou com a presença de movimentos sociais, coletivos e organizações feministas, fechando um dia de intensas atividades, que começaram logo pela manhã.

No ato, os cantos das companheiras ecoavam as reivindicações deste #8m , que pautaram desde a responsabilização de Jair Bolsonaro por seus crimes até a construção de soberania nos territórios, garantindo que água, moradia, alimento, energia, saúde e educação sejam um direito assegurado a todas, todes e todos. As vozes se levantaram pelo fim do feminicídio, em defesa das liberdades democráticas, pela revogação da lei de alienação parental, pelo combate à fome, por empregos e salários iguais entre gêneros. Clamavam, ainda, pelo perdão das dívidas de famílias empobrecidas, revogação das reformas Trabalhista, da Previdência e do Ensino Médio, que nos impõem tantos retrocessos. Outra pauta central foi a descriminalização e legalização do aborto e seu debate dentro da saúde pública, assim como a defesa do SUS (Sistema Único de Saúde) e do SUAS (Sistema Único de Assistência Social).

CLIQUE AQUI para acessar galeria de fotos do ato unificado realizado no centro da Capital gaúcha. Crédito: Jonatan Brum/ ATBr

Artigo da ATBr no jornal Brasil de Fato >> 8 de março: nossa bandeira é a economia feminista

Animações da Capire e da ATI (Amigos da Terra Internacional) explicam o que é a economia feminista. VEJA AQUI

O PATRIARCADO MATA – JUSTIÇA POR DEBORA!


Mulheres organizadas nos movimentos sociais realizaram ato de denúncia ao perigo de rompimento da barragem da Lomba do Sabão e ao feminicídio de Débora Moraes – Foto: Carolina Lima/ Brasil de Fato

No início da manhã, mulheres do MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens) realizaram ato ecumênico em denúncia ao feminicídio de Débora Moraes, coordenadora do movimento assassinada pelo marido em 2022 em Porto Alegre (RS). A manifestação também evidenciou os riscos do rompimento da barragem da Lomba do Sabão, desativada desde 2013, e o descaso vivido pela população atingida. Mais informações nesta matéria do jornal Brasil de Fato

Em paralelo, mulheres camponesas ocuparam a superintendência do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). Também ocorreu audiência pública no parlamento gaúcho sobre o tema das mulheres e reunião com secretarias do governo estadual.

Seguimos em marcha, até que todas sejamos livres!

8 de março: nossa bandeira é a economia feminista

Nós, mulheres, somos 51,8% da população brasileira, e mesmo assim não chegamos a ser metade das cadeiras do Congresso Nacional (17,7%) ou do Judiciário (38,8%). Tampouco temos a representatividade devida nas Assembleias Estaduais, Câmaras Municipais ou na direção do Executivo. A única mulher eleita Presidenta, Dilma Rousseff, sofreu um golpe misógino em 2016. Será impossível pensar em igualdade de gênero quando sequer somos capazes de construir uma equidade de representação política.

O cenário se agrava quando olhamos os quatro últimos anos de Governo Bolsonaro. Quando as políticas públicas se destinaram a retificar papéis históricos de gênero que reforçam a divisão sexual do trabalho. A mensagem política transmitida pelo governo e representações políticas era sintetizada em expressões como: “bela, recatada e do lar”; “meninas vestem rosa e meninos azul”.

Neste universo conservador, agregava-se o fundamentalismo religioso propagado pelas posições fascistas que confrontavam diretamente os direitos historicamente conquistados das mulheres, especialmente os sexuais e reprodutivos.

As estatísticas comprovam os retrocessos. Segundo o relatório de transição, houve uma desidratação das políticas públicas destinadas às mulheres; apenas no primeiro semestre de 2022, o país bateu recordes de feminicídio. Em 2021, 66 mil brasileiras foram vítimas de estupro e 230 mil sofreram agressões físicas por violência doméstica. Se olharmos esses dados sob o recorte racial, ainda encontraremos que 67% das vítimas de feminicídio e 89% das vítimas de violência sexual são mulheres negras. A partir de 2016, a Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres sofreu um corte de 90% de seu orçamento.

A crise sanitária atingiu de forma distinta as mulheres, refletindo a urgência de um debate público sobre a economia de cuidados. Isso porque as mulheres ocuparam as linhas de frente de combate ao coronavírus sendo as enfermeiras dos hospitais, as cuidadoras dos doentes nas casas e as que sustentaram o isolamento doméstico. As trabalhadoras domésticas foram as primeiras a serem infectadas pela pandemia e as mais impactadas pelos efeitos do covid-19.

O retorno do país ao mapa da fome afeta sobremaneira as mulheres: 1 em cada cinco lares chefiados por mulheres não tem o que comer no dia a dia. A sobrecarga de trabalho doméstico, já excessiva, aumentou ainda mais no desmantelamento de políticas sociais como escola e creches, agravando uma conjuntura marcada pelo desemprego generalizado. Nossas mulheres estão cansadas, doentes.

Em realidade, as disparidades de gênero cresceram em todo o mundo com a pandemia, estima-se que para atingir a igualdade de gênero levaríamos 135,6 anos. O Brasil ocupa a 93ª posição no mundo, de 153 países, sendo o penúltimo na lista latino-americana. O que nos torna um gigante de desigualdade.

O Informe Global de Gênero, do Fórum Econômico Mundial, propõe que para superar as lacunas são necessários investimentos no setor de assistência social, construção de políticas para igualdade no mundo do trabalho e capacitação das mulheres. A retórica da organização financeira é bastante peculiar, já que se de um lado propõe essas diretrizes, de outro promovem políticas de austeridade e desregulamentação nos países para facilitar a privatização de serviços e a entrada e permanência de empresas transnacionais.

Como podemos observar, as políticas públicas para as mulheres se resumem a uma sujeição à sociedade capitalista e patriarcal, e para outra grande parcela delas, a morte. Assim estão nos matando; eliminam nossos corpos, nossas mentes, nossa libertação. No entanto, somos feitas da terra e da resistência, e neste 8 de março queremos semear nosso projeto político alternativo: a economia feminista.

A economia feminista nos liberta

Mulheres são maioria nas iniciativas de solidariedade contra a fome que surgiram durante a pandemia, como as cozinhas solidárias do MTST – AFP

O sistema capitalista, desde sua origem, estruturou-se fazendo o uso do patriarcado como instrumento de dominação e exploração das mulheres, e rebaixando ainda mais sua posição como grupo social. Assim, organizou uma divisão sexual do trabalho, separando o trabalho produtivo, assalariado, do trabalho reprodutivo, este último legado às mulheres. Todas as tarefas de cuidado que são necessárias para a manutenção das condições de vida estão designadas às mulheres e não são remuneradas. Se assim o fosse, seria impossível sustentar os baixos salários e o avanço da mercantilização e privatização à medida que exigiria que a sociedade não estivesse orientada para o individualismo e, sim, para a coletividade.

Ocorre que a crise de cuidado é permanente em nossa sociedade; não à toa, vivemos uma profunda crise do capital versus vida. A orientação da produção mundial para a produção constante de lucro, concentrado numa cada vez menor parcela de indivíduos acionistas de grandes corporações que controlam cadeias globais de produção, é insustentável.

A crise ambiental instalada desde a separação do homem da Natureza na modernidade tem produzido cada vez mais a nossa insustentabilidade como espécie humana neste planeta. “A ruptura entre as nossas sociedades e a natureza não é de responsabilidade de toda a população, pois foi projetada e é perpetuada por esses sistemas de poder em nível global”, expressa Karin Nansen, ex-presidenta da Federação de Amigas da Terra Internacional. Precisamos, urgentemente, superar nossa separação com a Natureza, suas gentes e suas culturas, e incorporar valores de ecodependência.

Frente aos desafios da crise múltipla da acumulação do capital, feministas de todo mundo têm construído a economia feminista e popular como projeto político alternativo. A economia feminista é uma aposta política para transformar a sociedade, as relações entre as pessoas, e entre elas e a natureza. Reconhecer o trabalho de cuidado invisibilizado e propor sua reorganização é um primeiro passo. Determinar uma nova lógica de produção mundial na qual a economia esteja centrada na vida, dando especial atenção aqueles que trabalham para sustentá-la.

Todas e todos, ao longo de nossas vidas, precisamos de cuidados; não há condição de vida sem relações de reciprocidade. É por isso que precisamos subverter a lógica da ganância das empresas transnacionais que dirigem o mundo, e tomar consciência da centralidade da vida humana e sua reprodução. Ter esses sujeitos e sujeitas no centro do pensar nossa política, como propõe Karin: “Precisamos de respostas que coloquem no centro as classes populares, a classe trabalhadora, as mulheres, os povos indígenas, as comunidades quilombolas, as comunidades camponesas e todas aquelas comunidades que sofrem diretamente os impactos desse sistema e desse modelo de acumulação”.

A economia feminista não é um projeto acabado, é um projeto em permanente construção no andamento dos processos de luta de classes, do qual convidamos a todos e todas para se engajarem. Construir a economia feminista é resistir aos projetos de morte, e mesmo depois de tantas pilhagens, semearmos a esperança. Muitas mulheres ao redor do mundo estão fazendo isso, construindo cotidianamente novas práticas coletivas de cuidado, novas relações sociais e com a Natureza.

Assim, deixamos para este 8 de março o repensar a organização da sociedade em quatro eixos centrais de enfrentamento ao capitalismo, desde a economia feminista: 1) o reconhecimento e organização do cuidado; 2) a centralidade da vida; 3) interdependência; 4) ecodependência. Marchando com nossa bandeira, seguimos e nos atrevemos a viver a nossa vida com valor, força e dedicação.

Texto publicado no Jornal Brasil de Fato RS, no link: https://www.brasildefators.com.br/2023/03/01/8-de-marco-nossa-bandeira-e-a-economia-feminista 

#8M em Porto Alegre: Na luta pela vida e pelos direitos das mulheres

Chamamos a todas companheiras, companheires e companheiros para tomarmos às ruas na quarta-feira, 8 de março, fazendo ecoar nossas reivindicações políticas e a centralidade das mulheres nas lutas. Marchamos em não ao sistema capitalista, patriarcal e racista, que se sustenta via o ódio e a violência sistemática contra as mulheres.

Em Porto Alegre (RS), uma série de atividades marcarão a data. Entre elas, das 7h às 9h haverá denúncia de ameaça de rompimento da Barragem na Lomba do Sabão e Ato Ecumênico de denúncia do feminicídio de Débora Moraes, militante do Movimento Atingidos e Atingidas Por Barragens (MAB). Às 10h, a violência contra as mulheres e os desmontes das políticas públicas serão debatidos em Audiência Pública, no Plenarinho. E a partir das 17h começa concentração na Esquina Democrática para encerrar a data em ato unificado do #8M 2023, que começa às 18h.

Após quatro anos de Governo de Jair Bolsonaro, finalmente é possível respirar. O ódio do ex-presidente contra as mulheres e pessoas oprimidas, em especial aquelas que pertencem à classe trabalhadora, resultou em aumento do desemprego, da fome, do endividamento, da miséria, da violência física e psicológica, do extermínio de indígenas, do culto às armas, de chacinas nas comunidades negras e da perseguição às mulheres e crianças vítimas de estupro, além do desprezo pela vida das vítimas da COVID. Apesar de tudo, sobrevivemos! Não é possível permitir que aqueles que defendem a ditadura militar e a tortura, e que organizaram e financiaram a invasão dos três poderes em Brasília saiam impunes. A ação livre do Bolsonarismo ameaça a todas, e a prisão de Bolsonaro é urgente! Nesse #8M reivindicamos: #SemAnistia!

Desde o #EleNão, as mulheres foram incisivas na oposição e derrota de Bolsonaro, na defesa das liberdades democráticas e dos direitos e na vitória eleitoral de Lula. Mas a luta continua e é a hora de destruir todo o legado do golpe de 2016. Precisamos pôr fim à misoginia, racismo e à LGBTIA+fobia entranhados no Estado capitalista que destrói as políticas sociais tão necessárias às nossas vidas. É hora de ir além, de construir a transformação social que o Brasil tanto precisa.

Nossa luta é pelo fim do feminicídio, em defesa das liberdades democráticas, por nenhum direito a menos, pela revogação da lei de alienação parental, pelo combate à fome, por empregos, salários iguais entre gêneros, acesso à saúde, educação, moradia, alimento, água e energia a todas. Pelo perdão das dívidas de famílias empobrecidas. Pela revogação da reforma trabalhista, da previdência e do ensino médio, que nos impõe tantos retrocessos. 

Pela descriminalização e legalização do aborto e seu debate dentro da saúde pública. Em defesa do SUS e do SUAS. Pela educação sexual nas escolas para combater a violência de gênero. Por um programa nacional de habitação voltado a moradoras de áreas de risco e mulheres vítimas de violência doméstica e pela construção de casas abrigo para mulheres vítimas de violência.

Basta de violência! Pelo fim do feminicídio 

No primeiro semestre de 2022, a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos registrou 31.398 denúncias e 169.676 violações envolvendo a violência doméstica contra as mulheres. No Rio Grande do Sul uma mulher é agredida a cada 22 minutos, de acordo com dados de janeiro de 2023. Passados oito anos da promulgação da Lei 13.104, de 9 de março de 2015, conhecida como Lei do Feminicídio, o assassinato de mulheres em situação de violência doméstica e familiar ou em razão do menosprezo ou discriminação à sua condição aumentaram no país. O Brasil bateu recorde de feminicídios, registrando 699 casos no primeiro semestre de 2022. Somos, há 14 anos, o país que mais mata pessoas trans; foram 131 em 2022. Prevenir e combater, sistematicamente, as diferentes formas de violência de gênero é dever do Estado, criando políticas públicas que dêem conta de erradicar a violência e acabar com o feminicídio. Queremos que o Estado tenha tolerância ZERO com os casos de violência doméstica e feminicídio e que criem ações para além do enfrentamento a violência, com políticas públicas no viés da transversalidade e que dêem conta das especificidades das mulheres.

Combate ao racismo

Ainda que todas nós mulheres estejamos expostas a essas violências, fica escancarado o racismo: as mulheres negras são 67% das vítimas de feminicídios e 89% das vítimas de violência sexual. As mulheres negras são as maiores vítimas também da violência urbana direta e indiretamente. A construção de uma sociedade feminista e antirracista é o caminho para que consigamos alcançar um país com justiça social e igualdade para todas, todes e todos. 

Urgente a revogação da Lei de Alienação Parental (LAP)

Desde a aprovação da LAP (2010) ocupamos o 5º lugar em feminicídios, há 13 anos em média quatro mulheres são assassinadas por dia e 80% das tentativas de feminicídios foram contra mães. Revogar essa lei misógina e punitivista para as mulheres/mães, que foi criada a partir de um conceito sem validade científica, é URGENTE. Precisamos banir e abolir este conceito que desqualifica e banaliza os testemunhos das vítimas mulheres/mães, obrigando a convivência com seus agressores. A violência é real: estuprador não é pai, agressor não é pai e violência não é vínculo.

Combate à fome, por empregos, salários iguais entre os gêneros e educação infantil

Existe uma diferença gritante entre homens e mulheres na questão da insegurança alimentar que se alastrou com a política assassina de Bolsonaro, em especial durante a Pandemia, fato este que colocou o Brasil de volta ao mapa da fome mundial. É necessário apoio à economia solidária, que tem papel central para uma nova economia, justa e livre da opressão capitalista. Sendo nós mulheres a principal fonte de renda da maioria das famílias trabalhadoras desse país, seguir existindo a diferença salarial entre homens e mulheres, e a diferença brutal se compararmos o salário entre homens brancos e mulheres negras, é contribuir para seguirmos vendo a desigualdade e a miséria aumentando. Além disso, é necessário que o Estado crie condições para que mães e pais possam trabalhar e isso passa por garantir vagas na Educação.

Inclusão e acessibilidade, acesso e permanência de mulheres na escola e na educação

O direito das mulheres com deficiência aos aspectos básicos da vida, como transporte (que é precarizado), acessibilidade e seu direito de ir e vir, que muitas vezes se torna uma situação perigosa, precisa ser garantido de forma plena. O acesso a oportunidades de trabalho e condições adequadas para poder executá-lo, direitos básicos para à sua sobrevivência e de sua família. As mães atípicas, muitas vezes sem uma rede de apoio, sem poder suprir as necessidades de seus filhos com deficiência, na luta para que tenham um atendimento adequado, acabam invisibilizadas, sem suporte, sem atendimento de saúde para si, acarretando em uma sobrecarga de trabalho e cuidados. Pelo direito dessas mulheres, mães/avós, muitas vezes sozinhas serem enxergadas e acolhidas pela sociedade. Pelo direito de permanecer na escola, seja mãe adolescente, seja uma chefe de família, incluindo aí, o direito dessas crianças à vaga nas escolas e creches. Pelo direito à educação, desde a educação infantil ao ensino superior, possibilitando o acesso ao conhecimento e a melhores oportunidades de trabalho e renda!

Confira o manifesto do #8mPOA aqui

Estão nos matando, mas ainda assim semeamos a esperança

Nós, mulheres, somos 51,8% da população brasileira, e mesmo assim não chegamos a ser metade das cadeiras do Congresso Nacional (17,7%) ou do Judiciário (38,8%). Tampouco temos a representatividade devida nas Assembleias Estaduais, Câmaras Municipais ou na direção do Executivo. A única mulher eleita Presidenta, Dilma Rousseff, sofreu um golpe misógino em 2016. Será impossível pensar em igualdade de gênero quando sequer somos capazes de construir uma equidade de representação política.

O cenário se agrava quando olhamos os quatro últimos anos de Governo Bolsonaro. Quando as políticas públicas se destinaram a retificar papéis históricos de gênero que reforçam a divisão sexual do trabalho. A mensagem política transmitida pelo governo e representações políticas era sintetizada em expressões como: “bela, recatada e do lar”; “meninas vestem rosa e meninos azul”.

Neste universo conservador, agregava-se o fundamentalismo religioso propagado pelas posições fascistas que confrontavam diretamente os direitos historicamente conquistados das mulheres, especialmente os sexuais e reprodutivos.

As estatísticas comprovam os retrocessos. Segundo o relatório de transição, houve uma desidratação das políticas públicas destinadas às mulheres; apenas no primeiro semestre de 2022, o país bateu recordes de feminicídio. Em 2021, 66 mil brasileiras foram vítimas de estupro e 230 mil sofreram agressões físicas por violência doméstica. Se olharmos esses dados sob o recorte racial, ainda encontraremos que 67% das vítimas de feminicídio e 89% das vítimas de violência sexual são mulheres negras. A partir de 2016, a Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres sofreu um corte de 90% de seu orçamento.

A crise sanitária atingiu de forma distinta as mulheres, refletindo a urgência de um debate público sobre a economia de cuidados. Isso porque as mulheres ocuparam as linhas de frente de combate ao coronavírus sendo as enfermeiras dos hospitais, as cuidadoras dos doentes nas casas e as que sustentaram o isolamento doméstico. As trabalhadoras domésticas foram as primeiras a serem infectadas pela pandemia e as mais impactadas pelos efeitos do covid-19.

O retorno do país ao mapa da fome afeta sobremaneira as mulheres: 1 em cada cinco lares chefiados por mulheres não tem o que comer no dia a dia. A sobrecarga de trabalho doméstico, já excessiva, aumentou ainda mais no desmantelamento de políticas sociais como escola e creches, agravando uma conjuntura marcada pelo desemprego generalizado. Nossas mulheres estão cansadas, doentes.

Em realidade, as disparidades de gênero cresceram em todo o mundo com a pandemia, estima-se que para atingir a igualdade de gênero levaríamos 135,6 anos. O Brasil ocupa a 93ª posição no mundo, de 153 países, sendo o penúltimo na lista latino-americana. O que nos torna um gigante de desigualdade.

O Informe Global de Gênero, do Fórum Econômico Mundial, propõe que para superar as lacunas são necessários investimentos no setor de assistência social, construção de políticas para igualdade no mundo do trabalho e capacitação das mulheres. A retórica da organização financeira é bastante peculiar, já que se de um lado propõe essas diretrizes, de outro promovem políticas de austeridade e desregulamentação nos países para facilitar a privatização de serviços e a entrada e permanência de empresas transnacionais.

Como podemos observar, as políticas públicas para as mulheres se resumem a uma sujeição à sociedade capitalista e patriarcal, e para outra grande parcela delas, a morte. Assim estão nos matando; eliminam nossos corpos, nossas mentes, nossa libertação. No entanto, somos feitas da terra e da resistência, e neste 8 de março queremos semear nosso projeto político alternativo: a economia feminista.

A economia feminista nos liberta

Mulheres são maioria nas iniciativas de solidariedade contra a fome que surgiram durante a pandemia, como as cozinhas solidárias do MTST – AFP

O sistema capitalista, desde sua origem, estruturou-se fazendo o uso do patriarcado como instrumento de dominação e exploração das mulheres, e rebaixando ainda mais sua posição como grupo social. Assim, organizou uma divisão sexual do trabalho, separando o trabalho produtivo, assalariado, do trabalho reprodutivo, este último legado às mulheres. Todas as tarefas de cuidado que são necessárias para a manutenção das condições de vida estão designadas às mulheres e não são remuneradas. Se assim o fosse, seria impossível sustentar os baixos salários e o avanço da mercantilização e privatização à medida que exigiria que a sociedade não estivesse orientada para o individualismo e, sim, para a coletividade.

Ocorre que a crise de cuidado é permanente em nossa sociedade; não à toa, vivemos uma profunda crise do capital versus vida. A orientação da produção mundial para a produção constante de lucro, concentrado numa cada vez menor parcela de indivíduos acionistas de grandes corporações que controlam cadeias globais de produção, é insustentável.

A crise ambiental instalada desde a separação do homem da Natureza na modernidade tem produzido cada vez mais a nossa insustentabilidade como espécie humana neste planeta. “A ruptura entre as nossas sociedades e a natureza não é de responsabilidade de toda a população, pois foi projetada e é perpetuada por esses sistemas de poder em nível global”, expressa Karin Nansen, ex-presidenta da Federação de Amigas da Terra Internacional. Precisamos, urgentemente, superar nossa separação com a Natureza, suas gentes e suas culturas, e incorporar valores de ecodependência.

Frente aos desafios da crise múltipla da acumulação do capital, feministas de todo mundo têm construído a economia feminista e popular como projeto político alternativo. A economia feminista é uma aposta política para transformar a sociedade, as relações entre as pessoas, e entre elas e a natureza. Reconhecer o trabalho de cuidado invisibilizado e propor sua reorganização é um primeiro passo. Determinar uma nova lógica de produção mundial na qual a economia esteja centrada na vida, dando especial atenção aqueles que trabalham para sustentá-la.

Todas e todos, ao longo de nossas vidas, precisamos de cuidados; não há condição de vida sem relações de reciprocidade. É por isso que precisamos subverter a lógica da ganância das empresas transnacionais que dirigem o mundo, e tomar consciência da centralidade da vida humana e sua reprodução. Ter esses sujeitos e sujeitas no centro do pensar nossa política, como propõe Karin: “Precisamos de respostas que coloquem no centro as classes populares, a classe trabalhadora, as mulheres, os povos indígenas, as comunidades quilombolas, as comunidades camponesas e todas aquelas comunidades que sofrem diretamente os impactos desse sistema e desse modelo de acumulação”.

A economia feminista não é um projeto acabado, é um projeto em permanente construção no andamento dos processos de luta de classes, do qual convidamos a todos e todas para se engajarem. Construir a economia feminista é resistir aos projetos de morte, e mesmo depois de tantas pilhagens, semearmos a esperança. Muitas mulheres ao redor do mundo estão fazendo isso, construindo cotidianamente novas práticas coletivas de cuidado, novas relações sociais e com a Natureza.

Assim, deixamos para este 8 de março o repensar a organização da sociedade em quatro eixos centrais de enfrentamento ao capitalismo, desde a economia feminista: 1) o reconhecimento e organização do cuidado; 2) a centralidade da vida; 3) interdependência; 4) ecodependência. Marchando com nossa bandeira, seguimos e nos atrevemos a viver a nossa vida com valor, força e dedicação.

 

Abaixo, divulgamos dois vídeos sobre economia feminista produzidos em parceria pela Capire e pela Amigas da Terra Internacional. A locução está em espanhol e inglês, mas tem legenda em português.

Parte 1

Parte 2

 

Coluna publicada originalmente no Jornal Brasil de Fato, no link: https://www.brasildefato.com.br/2023/02/28/estao-nos-matando-mas-ainda-assim-semeamos-a-esperanca 

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