Site da Amigas da Terra Brasil, organização ambiental anticapitalista, em defesa da soberania e dos direitos coletivos dos povos
Categoria: Florestas e biodiversidade
As florestas e os biomas do mundo estão ameaçadas. A privatização, o aumento das exportações e os acordos de livre comércio internacional tem levado a crescimentos massivos de plantações em grande escala, utilizadas para produção e exportação de madeira e de polpa. Este modelo, tem aumentado a demanda de carne, de madeiras exóticas e de colheitas de soja e de palma. Todas estas pressões têm levado ao desaparecimento da metade das florestas do mundo. Precisamos proteger as florestas pois elas provêem o sustento de muitas comunidades locais e indígenas, além de servirem como reserva de carbono, elemento fundamental na luta contra as mudanças climáticas. Além disso, são habitats em que há a maior diversidade de espécies da Terra. Os grupos do Amigos da Terra trabalham com comunidades locais com a intenção de preservar as florestas e manter o direitos destas comunidades em administrar os recursos e assim garantir uma vida sustentável. Fazemos campanhas contra a produção de monocultivos, contra plantações industriais de grande escala e contra iniciativas de comercialização de florestas e da biodiversidade
É inadmissível o que vem ocorrendo com o povo indígena Pataxó, no extremo sul da Bahia. Com suas aldeias cercadas pelas monoculturas de eucalipto da Suzano e da Veracel Celulose, vigiadas por guarda privada, perseguidas pela PM do Estado da BA e por milícias regionais de latifundiários, o povo Pataxó resiste.
Luta pela demarcação de seus territórios, por seus direitos de povos originários, pela preservação de suas águas e matas atlânticas, pela transmissão de seus modos de vida, memória e sabedoria ancestral.
Na sociedade civil brasileira não podemos tolerar que o Estado e as Corporações da Celulose e suas milícias ameacem, criminalizem e matem as guerreiras e guerreiros pataxós que lutam por seus direitos.
Cacique Bacurau foi preso injustamente, acusado de um crime que não cometeu, uma armadilha de fazendeiros e ruralistas da região, com apoio do próprio Estado e de seu sistema jurídico. Cacique Bacurau é um preso político, por sua luta histórica e por sua liderança em defesa da regularização do território indígena Pataxó.
No país da impunidade dos mais ricos, da anistia a militares golpistas e torturadores, da normalização dos crimes do latifúndio; é uma vergonha nacional que o Estado tenha encarcerado o Cacique Bacurau, representante da luta pataxó por seu território, conforme anunciado pela Tv Pataxó em seu canal no Instagram.
O que ocorre no extremo sul da Bahia, com os Pataxós, se repete em muitas regiões do Brasil, o que evidencia um método, um manual de ação, um modo de operar das “CORCRIM”, as corporações criminosas da celulose, como a Cia. Suzano, que opera em muitos estados do país. No Espírito Santo e no Maranhão, no Mato Grosso do Sul e no Rio Grande do Sul, em Minas Gerais, no Rio de Janeiro e São Paulo, por onde operam, as empresas de celulose montam uma “máquina de guerra”.
Uma guerra química com a vizinhança, pois suas monoculturas de árvores transgênicas não sobrevivem sem toneladas de agrotóxicos. Uma guerra pela água, demandando os rios e córregos de toda a região, para seus plantios e plantas industriais. Uma guerra jurídica, com batalhão de advogados processando e criminalizando as lideranças das comunidades mais resistentes. Uma guerra de vigilância e ocupação armada, contratando empresas privadas e subordinando a própria PM para sua segurança patrimonial. No campo, em seus monocultivos, uma empresa como a Suzano Celulose quase não gera emprego, a não ser no setor formal e informal de sua vigilância. Sua celulose é produzida na base da violência.
Viva o povo Pataxó! Demarcação Já! Titulação Já! De seu território ancestral.
Liberdade para o Cacique Bacurau!
Criminosa é a Suzano. Criminosa é a Veracel. Criminoso é o Estado Brasileiro e da Bahia.
Rede Alerta contra Desertos Verdes 4 Setembro 2024
Nos dias 12 e 13 de março, acontece, em Porto Alegre (RS), o 12º FIMA (Fórum Internacional do Meio Ambiente), com o tema Água e Energias Renováveis, busca possibilitar reflexões sobre as formas de produção de energia e o uso da água. O evento é promovido pela ARI (Associação Riograndense de Imprensa), em conjunto com o Ministério Público do Rio Grande do Sul, PPGCom da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e FAMECOS (Faculdade de Comunicação da PUCRS – Pontifícia Universidade Católica do RS).
O 12ª FIMA será realizado de forma presencial no auditório da FAMECOS, na PUCRS (Avenida Ipiranga, 6681). No dia 12/03 (3ª feira que vem), no final da tarde, ocorre a abertura do evento e a conferência inicial com a participação de Junior Hekurari Yanomami, presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami no estado de Roraima. É a 1ª vez que Junior vem à capital gaúcha. Ele irá falar sobre os problemas enfrentados pelo Povo Yanomami em suas terras, entre eles o garimpo, e o papel do jornalismo nessas situações de confronto e de crise humanitária.
A 4ª feira (13/03) concentra os painéis de exposição e de debate, iniciando às 8h30min e encerrando às 18h30min, com a leitura da carta produzida pelo 12º FIMA. A Amigas da Terra Brasil participa do 3º painel, às 16h15min, na presença da conselheira e integrante do Comitê Executivo da Federação Internacional Friends of the Earth, Lúcia Ortiz, que irá abordar o tema da Transição Energética Justa.
A programação completa do 12º FIMA pode ser acessada AQUI. Para assistir a conferência de abertura e participar dos debates, basta se inscrever neste link. A inscrição é gratuita. Não haverá transmissão online do evento.
Vitória! Este 21 de setembro é um dia histórico aos indígenas e não indígenas do Brasil. O STF (Supremo Tribunal Federal) invalidou a tese do Marco Temporal para demarcação de terras indígenas.
A Corte do STF começou a analisar o tema em 2021, tendo sido suspenso naquele ano e retomado agora em 2023. Esta decisão é muito importante, pois repercutirá para todos os casos de demarcação de terras indígenas que estão sendo discutidos ou que poderiam ser questionados na Justiça.
Marco Temporal é uma tese jurídica que restringia o direito dos povos indígenas apenas às terras que ocupavam ou já disputavam na data de promulgação da Constituição de 1988. Atualmente, existem cerca de 300 processos de demarcação, os quais serão influenciados por essa decisão do STF.
A Amigas da Terra Brasil saúda a todos os povos indígenas do Brasil e às suas organizações que, após muita mobilização e pressão, vencem uma grande batalha nesta guerra que perdura desde 1.500. Afinal, o que está em jogo são os territórios de vida e não do capital.
É preciso seguir em alerta para as novas propostas trazidas durante o julgamento no STF e a outras tentativas judiciais, assim como no parlamento, que tentem flexibilizar o Marco Temporal e atacar os direitos dos povos originários e seus territórios. A luta segue pela demarcação das terras indígenas, por reparação histórica, pela manutenção da biodiversidade e em defesa da vida de todos e de todas nós.
No início do mês, a Amigas da Terra Brasil acompanhou a denúncia deste conflito feita pelo Povo Tembé durante o Diálogos Amazônicos e a Cúpula da Amazônia, no Pará. Apoiamos dando divulgação ao ataque sofrido por três liderenças do povo , que haviam sido baleadas em 7 de agosto, durante as atividades organizadas pelos movimentos e organizações sociais e o governo brasileiro. Também entrevistamos Jesus Gonçalves, da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH), que falou sobre a situação de vulnerabilidade e as constantes ameaças que ocorrem ao Povo Tembé.
Divulgamos, abaixo, as matérias publicadas pelo jornal Brasil de Fato e o material produzido pela Amigas da Terra Brasil:
Indígenas denunciam que monocultivo de dendê envenenou colheitas e nascentes, adoeceu animais e gerou pragas de insetos
Murilo Pajolla
Brasil de Fato | Tomé-Açu (PA) |
Em uma área repleta de dendezais, o líder indígena Urutaw Tembé aponta para uma nascente de igarapé mal-cheirosa. Na superfície da água sem peixes, flutuam porções de matéria orgânica decomposta, entre largos tubos de concreto abandonados. “Aqui era um lugar onde meus pais, meus avós e meus tios caçavam e pescavam há uns anos atrás. Nunca imaginavam que ia chegar a uma contaminação tão grande. É horrível”, suspira a liderança indígena.
O igarapé, conhecido como Braço Grande, já não é mais sinônimo de água potável e alimento para os indígenas Tembé. Eles afirmam que o motivo da contaminação foi o descarte da tiborna, um resíduo químico da produção de óleo de palma, descrito como um caldo de cheiro insuportável. A responsável pelo descarte seria uma gigante do agronegócio “sustentável” que afirma ter nascido para “mudar a matriz energética na região Norte” em “100% de harmonia com a floresta amazônica”: a Brasil BioFuels (BBF).
O despejo da tiborna é apenas um dos graves impactos socioambientais documentados em agosto deste ano pelo Brasil de Fato no município de Tomé-Açu (PA) e que estão na origem da chamada “Guerra do Dendê”. Em três anos, o conflito resultou em pelo cinco mortes de indígenas e quilombolas, que tentam resistir à destruição das suas condições básicas de vida na floresta: água para beber e terra para plantar.
“Eles falam que a atividade deles é sustentável, mas é um sustentável manchado de sangue”, denuncia Urutaw Tembé.
Com um exército de seguranças privados e fortemente armados, a BBF é acusada de reagir com violência desproporcional a protestos de moradores, além de restringir a circulação de pessoas e de atirar, bater e até torturar lideranças. A truculência é vista como uma forma de garantir que a revolta que explode entre as populações tradicionais não afete o crescimento da operação. Desde 2021, a BBF afirma ter dobrado a capacidade de produção de biodiesel e aumentado em 10% a área plantada no Norte brasileiro, chegando a 75 mil hectares, mais do que o tamanho da cidade do Rio de Janeiro. O faturamento previsto é de R$1,5 bilhão para 2023.
Nascente do igarapé Braço Grande com indícios de contaminação pela tiborna, subproduto do beneficiamento do dendê / Murilo Pajolla/Brasil de Fato
Enquanto isso, indígenas Tembé relataram à reportagem uma vida devastada por uso abusivo de agrotóxicos, proliferação de insetos e desaparecimento da caça, pesca e água potável. E dizem que o cultivo de dendê está em áreas previamente griladas de onde seus antepassados foram expulsos por pistoleiros – e até mesmo dentro de terras indígenas demarcadas. Tudo, segundo os indígenas, sem qualquer procedimento de consulta prévia, na contramão de leis brasileiras e tratados internacionais.
Parte das alegações feitas pelos Tembé já foram reconhecidas no âmbito de processos judiciais pelo Ministério Público Federal (MPF), que já pediu a prisão do dono da BBF por tortura, acusação negada pela empresa.
A BBF afirma que sua segurança privada atua em defesa da integridade dos seus funcionários, maquinário e instalações, contra “invasores” “criminosos”. Sustenta ainda que faz o “cultivo sustentável da palma no estado, exercendo a posse pacífica, justa e ininterrupta das áreas privadas da companhia”. Confira o posicionamento da empresa na íntegra no final do texto.
Tiborna comprometeu igarapés e adoeceu caça
Urutaw Tembé se lembra do terror que sentiu ao ver pela primeira vez o impacto do despejo da tiborna, o subproduto do beneficiamento do dendê.
“Todas as espécies de peixes e cobra de dentro do rio vinham boiando na água. Tinha muita mosca, muito urubu, e um fedor que não dava nem para chegar perto. Essas moscas ferravam a paca, a cotia… Os animais da floresta que a gente caça. Quando a gente olhava, os animais tavam com a pele, o couro caindo, se desprendendo do corpo”, relata.
Segundo Urutaw, a substância venenosa se espalhou aos poucos e comprometeu todos os igarapés ao redor do território.
“A gente não se arrisca a beber água, nem a tomar banho. Quem entrava na água saía com coceira. Por isso começamos a reivindicar para a empresa cavar poço artesiano”, diz.
A construção dos poços foi feita “pela metade”, diz o líder Tembé. “Algumas partes a BBF atendeu, mas outras não. Ela cavava o poço, mas não colocava a estrutura ou não colocava a caixa d’água, não colocava bomba.. Algumas aldeias ela atendeu, mas o restante não”.
“Essa é a nossa revolta. De eles virem estragar nossa água e não dar estrutura para que nós pudéssemos viver”, explica Urutaw També.
Dendê avançou sobre terra demarcada, diz liderança Tembé
Na aldeia Yriwar, comandada por Urutaw Tembé, o líder indígena janta com a família. Na mesa que alimenta cerca de 10 pessoas estão açaí, farinha, e carne de tatu assada na brasa. “Confesso que não sou o melhor caçador, mas de vez em quando trago alguma coisa”, comenta Urutaw em tom de brincadeira.
Por estar dentro dos limites da Terra Indígena Turé-Mariquita, a menor do Brasil com 146 hectares, a aldeia Yriwar ainda abriga matas nativas que proporcionam a carne de caça.
Mas nem o território regularizado e protegido por lei escapou do dendê. Ao olhar para a placa do governo federal que sinaliza os limites da Turé-Mariquita, é possível ver os dendezais.
Nordeste tem grande fluxo de caminhões da BBF carregados de dendê / Murilo Pajolla/Brasil de Fato
“Aqui é a placa onde é o território já homologado, território indígena”, aponta Urutaw. “E ali o Dendê encostou [nos limites da demarcação], não respeitou limite de amortecimento. Hoje nós podemos dizer: o dendê está plantado dentro do território indígena”.
Pouco maior do que um campo de futebol, a Terra Indígena Turé-Mariquita abriga cerca de 50 pessoas. “Pouca terra para muito índio”, diz Urutaw, subvertendo o lema ruralista. Por isso, a luta dos Tembé é por espaço. Eles pedem à Funai a ampliação da terra indígena para as áreas ao redor, que estão em disputa com fazendeiros e com a própria BBF.
Agrotóxicos inviabilizaram produção
A aldeia Pitàwà está fora de terras indígenas demarcadas e é lar de 15 famílias Tembé. Na mesa do almoço, Deusalina Tembé senta com sua filha e seus netos ao redor de um pote de farinha e de uma panela com caldeirada de peixe tambaqui. “Toda a nossa comida é comprada na cidade, nada vem daqui”, lamenta a idosa.
“Hoje a gente já não come mais um peixe ou uma caça do mato, só se a gente comprar. Tudo isso foi a destruição dessa empresa, dessa maldita empresa ao nosso redor”, diz Deusalina aos prantos.
Os agrotóxicos jogados sobre os dendezais, que ficam a 30 metros das casas e da escola da aldeia, transformaram a comunidade em uma terra infértil e infestada de insetos.
“Meu pai me criou na roça, trabalhando. E hoje em dia nós não podemos mais trabalhar. Nós já ficamos até desanimados de plantar. Porque nós plantamos uma mandioca e ela apodrece. Tudo apodrece por causa desse veneno que jogam”, relata Deusalina Tembé.
“Eles estavam jogando o veneno por baixo, e a gente começou a reclamar, porque estava destruindo os nossos igarapés. Aí eles já começaram a vir de avião, por cima. Onde [o agrotóxico] pegava nas nossas plantas, todas morriam. A gente vivia só dentro de casa por causa daquele veneno com as crianças.
Infestação de insetos
A infestação de borboletas, baratas, cobras, aranhas e escorpiões está entre os impactos ambientais mais graves, porém silenciosos, relatados pelos Tembé que moram em áreas próximas de cultivos da BBF. Segundo os indígenas, as “nuvens” de insetos estão relacionadas à aplicação de agrotóxicos nos dendezais.
“Teve o tempo em que a gente já não podia comer mais caju, porque era muita borboleta em cima dele. E hoje a gente não consegue mais dormir sem mosquiteiro porque os embuás [também conhecido como piolho de cobra] caem em cima da gente e dá muita coceira”, conta Deusalina.
Caju encoberto por borboletas: “comer frutas ficou impossível”, diz Deusalina Tembé / Acervo pessoal
“Cobra, muita cobra. Já escapei de ser mordida por uma dentro da minha casa. “Esses insetos vêm todos do meio do dendê. Todo do meio do dendê esses insetos para perto da casa da gente. E aí traz mais revolta para a gente. Mais revolta, porque antigamente não era assim”, completa a matriarca Tembé.
O vislumbre de uma terra sem BBF
Com 30 moradores, a aldeia I’ixing é uma área de retomada do povo Tembé próxima ao distrito de Quatro Bocas, no município de Tomé-Açu. Localizada entre uma fazenda e um dendezal, a comunidade foi fundada em julho de 2012, mas o pedido de regularização do território vem desde 1996, como forma de compensação por um mineroduto da Pará Pigmentos que cruzou o território.
“No passado aqui morou o meu tio Lúcio”, conta Miriam Tembé, líder da comunidade. “Foi onde ele teve seus primeiros filhos. Ele teve que sair por conta da chegada de fazendeiros. Primeiro aqui foi ocupado por fazendeiros. E depois eles passaram a terra para a empresa Biopalma, depois Biovale [ex-subsidiária da Vale] e agora BBF”.
Há dois anos, em meio à pressão do movimento indígena, a BBF deixou de manejar as palmeiras de dendê na comunidade I’ixing, para alívio dos moradores. Um ano depois, a infestação de insetos que inviabilizava a coleta de frutas e o cultivo de alimentos começou a cessar.
“Por incrível que pareça a gente já consegue ver o mamão crescendo, madurando. Mas até o ano passado os insetos não deixavam. E a gente não conseguia ter uma manga, um mamão, uma banana sequer. Você falava e as moscas iam entrando na boca, caindo no alimento, na água”, relata Miriam.
Para os Tembé, a comunidade de Miriam é o vislumbre de como pode ser um futuro sem o monocultivo de dendê e com uma vida verdadeiramente sustentável.
“A BBF prega uma propaganda lá fora que produz de forma sustentável. Não é. Porque o sustentável não destrói a floresta, não polui os rios, não destrói a fauna e a flora. Da forma que ela faz, ela destrói tudo isso, impactando as nossas vidas. A vida da população que precisa da floresta para sobreviver”, diz Miriam Tembé.
Sociedade civil e Funai se solidarizam com os Tembé
A presidenta da Funai, Joenia Wapichana, ouviu as reivindicações das lideranças Tembé no início de agosto em Belém (PA). Em nota, o órgão indigenista manifestou apoio aos indígenas e disse que busca a regularização do componente indígena do processo de licenciamento ambiental.
“(…) Apesar de a empresa ter realizado diversas ações pontuais de apoio em prol da comunidade indígena, não houve avaliação adequada dos impactos sinérgicos e cumulativos, tampouco uma atuação eficaz para dirimir os problemas ambientais”, declarou a Funai por meio de nota.
Os Tembé receberam declarações de solidariedade da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia (Coiab) e de inúmeras lideranças dos povos originários.
A situação de vulnerabilidade dos indígenas e quilombolas da região é acompanhada e vista com preocupação por diversas entidades de direitos humanos, como Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SPDH), Comissão de Direitos Humanos da OAB Pará, Comissão Pastoral da Terra (CPT), Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e Associação Brasileira de Juízes para a Democracia (ABJD).
BBF rebate impactos ambientais
O Brasil de Fato pediu respostas à BBF sobre cada uma das alegações feitas pelos indígenas na reportagem.
Sobre o despejo da tiborna na nascente do Igarapé Braço Grande, a empresa disse que “a acusação não procede”.
“O Grupo BBF enfatiza que suas operações não causam prejuízo ambiental, pelo contrário, recuperam áreas degradadas pelo desmatamento. Em suas áreas de cultivo de palma, a empresa utiliza o processo de fertirrigação, método 100% natural e orgânico. Por meio da água do cozimento dos frutos de dendê – conhecida como tiborna – que é rica em vitaminas e nutrientes, é realizada a fertirrigação somente das áreas privadas de plantio de palma, como uma alternativa sustentável para os tratos culturais necessários do palmar”, diz a nota.
A respeito da utilização de agrotóxicos, a BBF repetiu que “a acusação não procede”.
“O Grupo BBF esclarece que utiliza apenas produtos permitidos por lei em suas áreas de cultivo de palma e que realiza monitoramento contínuo, nunca foram detectados valores de substância química em concentrações que não sejam seguros à saúde pública, respeitando os indicadores definidos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) para o cultivo da palma de óleo. Para corroborar com a não procedência desta falsa acusação, em março deste ano, o inquérito da Polícia Federal (número 1035068-94.2022.4.01.3900) concluiu que não existe contaminação por agrotóxico ou qualquer outro tipo de poluição ambiental causada pela empresa ao longo da reserva indígena Turé Mariquita e que existe, apenas e em grande quantidade, a presença de contaminação por coliforme fecais de humanos e animais que residem no local. No inquérito, foram colhidas amostras de água em 11 pontos distintos em localidades indicadas pelos próprios indígenas Tembé e que foram periciados pela Polícia Federal e pelo Instituto de Criminalística Evandro Chagas, referência na área no Brasil e no mundo”, escreveu a BBF.
Quanto a alegação de não ter concluído a instalação de poços artesianos acordada com os indígenas, a empresa reafirmou que “acusação não procede”.
“O Grupo BBF reforça que investe de forma contínua no desenvolvimento socioeconômico das comunidades onde atua. Entre os destaques das benfeitorias em infraestrutura e serviços realizados pela empresa no último ano, estão a construção de nove pontes, a manutenção de mais de 650 quilômetros de estradas vicinais, construção de poços artesianos e estruturas de caixas d’água para as comunidades, cursos profissionalizantes, palestras de preservação ambiental em escolas públicas, assistência técnica de fitossanidade aos agricultores da região, entre outros”, afirma o comunicado.
Em relação ao dendê plantado no interior na divisa da terra indígena Turé-Mariquita, a BBF reiterou: “a acusação não procede”.
“O Grupo BBF (Brasil BioFuels) reforça que não existe sobreposição de terras, conforme relatado por representantes do INCRA e ITERPA em reunião realizada com a Comissão Agrária, que contou com a presença do Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, representantes do Judiciário e outros participantes. A companhia realiza suas atividades agrícolas respeitando os limites territoriais e apenas em suas áreas de posse. Vale ressaltar que o cultivo sustentável da palma de óleo realizada pela empresa respeita o Zoneamento Agroambiental da Palma de Óleo (decreto 7.172 do Governo Federal de 7 de maio de 2010), uma das legislações mais severas do mundo, cujo objetivo é recuperar áreas da Amazônia degradadas até dezembro de 2007, com as diretrizes de proteção ao meio ambiente, conservação da biodiversidade e utilização racional dos recursos naturais, além do respeito à função social da propriedade. Como histórico, o Grupo BBF adquiriu em novembro de 2020 a operação da antiga empresa Biopalma (subsidiária da Vale) no Pará, dando continuidade ao cultivo sustentável da palma no estado, exercendo a posse pacífica, justa e ininterrupta das áreas privadas da companhia”, disse a BBF.
Se aprovada, tese permitiria avanço do agro e afetaria 99% da população indígena de Tomé-Açu
Murilo Pajolla
Brasil de Fato | Tomé-Açu (PA) |
A eventual validação do marco temporal das terras indígenas, tese ruralista que volta a ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quarta-feira (30), afetará 99% da população indígena de Tomé-Açu, nordeste do Pará.
Há três anos a região é palco da chamada “Guerra do Dendê”, um conflito entre forças desproporcionais que resultou em pelo menos cinco mortes de indígenas e quilombolas nos últimos três anos.
O percentual de indígenas atingidos é uma estimativa da Associação Indígena do Vale do Acará, presidida por Miriam Tembé. Segundo ela, a mudança no critério de demarcação poderia anular os direitos territoriais de cerca de 1300 Tembé em quatro territórios de ocupação tradicional que foram retomados recentemente.
“Se o marco temporal for aprovado, para nós seria um desastre imenso. Estamos cercados por fazendas e grandes empresas, e nossos parentes estão morrendo. Nós já comprovamos que temos a necessidade e o direito de estar no nosso território”, diz Miriam Tembé.
O primeiro e único advogado Tembé, Jorde Tembé, que presta jurídico aos indígenas, também manifestou preocupação.
“Algumas áreas requeridas pelas comunidades são de ampliação do território já demarcada e outras são de reconhecimento de um território. Se houver a aplicação do marco temporal, as comunidades que buscam esse reconhecimento e que foram vítimas de tentativa de genocídio, acabam sendo privadas novamente dos seus direitos fundamentais”, explicou Jorde Tembé.
“Mesmo com eventual aplicação do marco temporal, nós entendemos que em 1988 as comunidades já exerciam a posse tradicional ao território requerido que está em discussão com a empresa de óleo de palma da região”, acrescentou o advogado.
Marco temporal poderá ser arma jurídica de gigante do agro
Na “Guerra do Dendê”, a empresa produtora de biocombustível Brasil BioFuels (BBF) é acusada por indígenas e quilombolas de impactar territórios tradicionais ao envenenar plantações e nascentes, adoecer animais e gerar pragas de insetos. O dendê é o fruto de uma palmeira usado na fabricação do biodiesel.
Revoltadas, as populações afetadas organizam protestos contra a empresa, que vem respondendo de forma cada vez mais violenta. As manifestações são reprimidas com tiros, e a circulação dos moradores é restringida por seguranças fortemente armados.
O marco temporal das terras indígenas prevê que os povos só podem reivindicar territórios que estavam ocupando em 1988, quando foi promulgada a Constituição Federal. O critério arbitrário desconsidera o histórico de expulsões violentas que tiraram as terras dos Tembé e os confinaram em pequenos territórios.
O advogado Alberto Pimentel, da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH), avalia que a BBF e outras forças econômicas poderiam usar o marco temporal para reivindicar na Justiça áreas de retomada indígena. Por ainda não estarem regularizadas, as terras estão vulneráveis ao avanço do agronegócio, mineradoras e madeireiros.
“No caso dos Tembé de Tomé-Açú uma possível votação favorável do STF ao marco temporal implicaria em sérias violações sobre seus direitos. Poderia dificultar a luta legítima que este povo tem para ampliação da área de seu território atualmente reivindicada”, afirmou Pimentel, em nome da SDDH.
A BBF nega todos os impactos ambientais alegados pelos Tembé e afirma que sua segurança privada atua em defesa da integridade dos seus funcionários, maquinário e instalações contra “invasores” “criminosos”. Sustenta ainda que faz o “cultivo sustentável da palma no estado, exercendo a posse pacífica, justa e ininterrupta das áreas privadas da companhia”.
Exigir comprovação de conflitos é “piada de mal gosto”, diz líder Tembé
O critério do marco temporal abre uma exceção para indígenas que conseguirem comprovar a existência de disputa judicial ou conflito material em 1988. Nesses casos, as populações poderiam pleitear a posse da terra. Para Miriam Tembé, a necessidade de comprovação de conflito é “uma piada de mal gosto”.
“Isso é algo totalmente desrespeitoso com as populações que viviam nesse território. Muitos foram mortos, outros tiveram que fugir para não serem mortos. Não havia Defensoria Pública da União, Ministério Público, nem a Funai existia. Não havia meios de comunicação, nem como chegar até as autoridades, era um lugar totalmente isolado. E aí eles pedem para a gente comprovar?”, questiona a líder Tembé.
Um exemplo está na comunidade I’ixing, liderada por Miriam. A pequena aldeia está localizada entre uma grande fazenda de gado e um dendezal que foi manejado pela BBF até 2022. Após os indígenas retomarem a área, a BBF deixou de utilizar as áreas de plantio, dando aos 30 moradores do local um alívio nos impactos ambientais.
“Até o ano passado não conseguíamos colher uma manga, um mamão, uma banana sequer, por causa das nuvens de insetos provocadas pelos agrotóxicos. Você falava e as moscas iam entrando na boca, caindo no alimento e na água”, relata Miriam.
Segundo Miriam, a aldeia I’ixing foi onde seu tio Lúcio Tembé teve os primeiros filhos. Ainda com a mata preservada e livre do agronegócio, a área era usada pelos indígenas como fonte de pesca, caça e água limpa para plantar, beber e cozinhar. Tudo mudou a partir da década de 1960, quando os antepassados da líder indígena foram expulsos por pistoleiros.
“Isso se deu por conta de madeireiros invadindo o território. Os madeireiros chegavam, nos expulsavam, faziam todo o desmatamento e passavam para fazendeiros. Esse fazendeiros iam comprando as terras na base da grilagem, e muitas dessas terras passaram hoje para as mãos da BBF”, relata Miriam.
O advogado Jorde Tembé diz que a exigência de comprovação de posse tradicional se mostra muito desleal para os Tembé.
“Porque, desde a demarcação das terras, muitos dos direitos das comunidades tem sido preteridos, pois durante um longo período elas não foram devidamente acompanhadas pelo Estado, por isso não deram início a sua luta por direitos nesse período”, afirmou Jorde.
No vídeo, Jesus Gonçalves, da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH), fala sobre a situação de vulnerabilidade e as constantes ameaças que ocorrem ao Povo Tembé:
A Amigos da Terra Brasil participou do encontro “Quando vale uma floresta? Quem paga pode poluir?”, que aconteceu no final de semana e encerrou na 2ª feira (12/06), na cidade de Assis Brasil, estado do Acre, na fronteira do Brasil com o Peru e a Bolívia.
A atividade foi organizada pelo CIMI Amazônia Ocidental (Conselho Indigenista Missionário) e contou com a participação de povos indígenas, comunidades e trabalhadores rurais da Amazônia e organizações sociais.
O principal assunto debatido foram os impactos dos projetos e programas REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação florestal), de mercados de carbono e de soluções baseadas na natureza, que têm crescido no Acre, no Pará e na Amazônia em geral.
Os participantes e as participantes trocaram informações e socializaram experiências, abordando também mecanismos como o PSA (pagamentos por serviços ambientais) e o manejo florestal, falando das ameaças que esses projetos trazem para os povos. O encontro resultou num posicionamento comum entre os presentes, formalizado em um documento aprovado pela plenária do encontro. Esta declaração já manda um forte recado para a cúpula de presidentes dos países amazônicos, que deve ocorrer em Agosto, em Belém (no Pará). Acesse o documento na íntegra AQUI.
À esquerda, Valdenice Nukini puxando o grito: #MarcoTemporalNÃO!
À direita, Seu Pedro Teles, seringueiro, sindicalista e liderança histórica de Xapuri, no Acre. Fotos Lúcia Ortiz/ATBr
Nas fotos, Valdenice Nukini, do Rio Môa no município de Cruzeiro do Sul/Acre, e Pedro Teles, liderança da Resex Chico Mendes (Reserva Extrativista), situada na cidade de Xapuri (Acre). Em sua fala, Valdenice rechaçou o marco temporal e criticou os projetos de REDD e de mercado de carbono. Seu Pedro chamou os povos a se organizarem para terem seu próprios projetos de vida e para não aceitarem projetos que vêm “de fora pra dentro”.
A natureza não é mercadoria! A Constituição Brasileira, em seu artigo 225, estabelece que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é bem de uso comum do povo. Entendemos que os processos com os quais a floresta sustenta a vida, como regulação do clima, estocagem de carbono, purificação das águas, preservação da biodiversidade e do solo, precisam ser preservados e defendidos por nós como sociedade e pelo poder público.
NÃO À FINANCEIRIZAÇÃO DA NATUREZA!
*Com informações de Lucia Ortiz (ATBr) e CIMI Amazônia Ocidental
Não ao Marco Temporal! Do Império de Pedro II ao fascismo brasileiro, Lei de Terras e anulação da demarcação de terra indígena
Em terra brasilis, terra vermelha, terra preta, a estratégia genocida permanece intacta há 500 anos.
Artimanha do poder branco, que se faz e se constitui em espaços usurpados, marcando pela violência os corpos indígenas ao feri-los de morte e, pelo etnocídio, por meio do escondimento de sua cultura.
Nas linhas que traçam um espaço territorial dito Brasil, o racismo permanece como estratégia de uma ontologia prepotente.
Senhores de terras e sesmarias, homens de Dom Pedro II, planejaram o campo brasileiro, modelo que permanece até os dias atuais. Somente o lavrador poderoso tinha êxito no roubo de terras no interior do Brasil; tinha o poder eficaz de arrancar o indígena de suas terras, extraindo com violência suas raízes, matando-o. Era necessário que os indígenas desaparecessem e que as terras roubadas fossem registradas com o “selo branco” do colonizador.
No Brasil agrário do Império de Pedro ao fascismo bolsonarista, sesmeiros (hoje latifundiários) eram minoria e, os posseiros, maioria. Somente 0,7% das propriedades são superiores a 2 mil hectares, mas somadas ocupam quase 50% de toda área rural.
A disputa desigual por terras e suas riquezas naturais continua usando os instrumentos capitalistas institucionais, como o Legislativo e o Judiciário, por meio do lobby político com bolsos recheados de poder. Hoje, o espaço de legislação continua sendo um poder colonizador, e o judiciário, exercendo uma política branca e racista.
Mas as terras pretas e vermelhas seguem a fervilhar de vida e, em uma brecha legal aberta por seu poder cosmológico, imprime na Carta Magna brasileira, a Constituição, o direito originário. Indígenas, povos nascidos e de ancestralidade por estes territórios de linhas traçadas em cor branca, adquiriram institucionalmente, em 1988, o direito de existir e de ser.
Em maio de 2023, o sesmeiro agrário, etnocida, fez sangrar a instituição ocupada pelo Cocar, o Ministério dos Povos Indígenas, e o legislador colonizador aprovou, na Câmara dos Deputados, o PL 490/07, sobre a tese do Marco Temporal.
Neste dia 7 de junho entra, mais uma vez em pauta, no STF (Supremo Tribunal Federal), um julgamento de disputa de direitos sob o prisma da Justiça não indígena, que pode colocar em xeque este direito originário. Poderá se tornar uma decisão com repercussão geral (RE-RG 1.017.365) o resultado deste julgamento; se for desfavorável ao direito originário, será uma tentativa de esmagamento dos originários pelo poder das sesmarias de Dom Pedro II, atualizadas no agronegócio. Trata-se do julgamento de um pedido de reintegração de posse por parte do estado de Santa Catarina (SC) contra o povo Xokléng no território lãklaño, na cidade de Ibirama.
Ainda será julgada, no STF, uma ação civil originária 1.100, que trata de um pedido de anulação da demarcação da terra indígena Ibirama Lãklaño, situada no alto do Vale de Itajaí, também em SC. Esta terra indígena possui 37 mil hectares e uma população de aproximadamente 2 mil pessoas (https://terrasindigenas.org.br/pt-br/terras-indigenas/3682).
Esta ação foi demandada pelo modo de exploração territorial capitalista de uma madeireira (Batistela Agroflorestal), famílias de colonos, com o apoio do governo do Estado de Santa Catarina, tendo como rés a instituição FUNAI (hoje ocupada por indígenas) e a União.
A decisão sobre esta ação influenciará a ideia de repercussão geral no julgamento do recurso sobre a reintegração de posse, pois embasa seus argumentos na tese do Marco Temporal. Esta tese coloca, em dúvida, a existência originária dos indígenas no Brasil, uma forma de seguir o ocultamento e apagamento étnico.
A história do Povo Xokleng ilustra as histórias dos povos que marcam seu modo de ser neste território, demarcado à força por linhas capitalistas colonizadoras.
Viveram caçados, escravizados, torturados, mortos por infecções, aldeados, confinados, sujeitados ao modo cidadão pobre.
Porém, sentimos os ventos movidos pelos cantos e danças desses povos e, ainda, vemos as cores da terra.
Do Império de Pedro II ao fascismo brasileiro, a cosmologia ou a ontocosmoecologia indígena faz a terra viver e pulsar por dias em que o céu não cairá!
Após 2 meses do início do ano letivo nas escolas das redes públicas gaúchas, finalmente o governo do Estado contratou professor para garantir o aprendizado não-Mbya na Retomada do Arado Velho (zona sul da capital). Em Cachoeirinha, na região metropolitana, os Mbya Guarani ainda aguardam encaminhamento que está sendo tomado pelo poder público. Essa situação de abandono já havia sido denunciada pelo CPERS Sindicato no final de março, reforçada pelo CIMI (Conselho Indigenista Missionário) e pela Amigos da Terra Brasil no início deste mês. 🔗Confira em http://bit.ly/3nJu4oh
No entanto, as condições para as crianças terem aula nas aldeias estão muito precárias. Não há quadros, nem bancos e mesas adequadas. O material didático (caderno, lápis, borracha etc.) é muito pouco. As aldeias não possuem um espaço fechado, com telhado, para abrigar crianças e professores em dias de chuva ou frio. Também faltam alimentos para a merenda e refeições.
Os Mbya Guarani das Retomadas do Arado Velho (Porto Alegre) e de Cachoeirinha pedem uma contribuição para viabilizar as escolas nas retomadas, proporcionando o aprendizado às crianças indígenas. Estão sendo aceitas doações de materiais para a sala de aula, escolar e para construir o espaço da escola. As doações também podem ser feitas em dinheiro.
Como entrar em contato e fazer a doação:
📌 Cachoeirinha (RS): Cacique Luciano Kuaray (Chave PIX para doações em dinheiro: CPF 01492513008). Para doar materiais, ligue no (51) 99755-6959
📌 Arado Velho (Porto Alegre/RS): para a doação de materiais e/ou dinheiro, ligue no (51) 99697-6974
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✊🏽💧 Hoje, 22 de Março, é o #diamundialdaagua . É a água que torna a vida possível; é o que nos garante higiene, saúde, alimento. Durante a pandemia, vimos e sentimos a importância de poder lavar as mãos, de tomar água de qualidade, de consumir alimento saudável, e o impacto disso na imunidade e na saúde das pessoas.
Atualmente, nem todos os brasileiros e as brasileiras, e muito menos em âmbito mundial, têm o acesso à água garantido. A Amigos da Terra Brasil e parceiros vêm realizando estudos nos territórios e têm constatado que essa água é assegurada de forma precária. Em boa parte das cidades já se detecta o problema na captação, onde a água chega contaminada, seja por agrotóxicos, devido à mineração e à siderurgia, entre tantos outros vários fatores e irregularidades.
A água é um dos direitos fundamentais, o direito à vida, como consta na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Portanto, o acesso à água potável deve ser garantido a todos os assentamentos humanos, mas não é a realidade de muitas ocupações irregulares, aldeias indígenas não demarcadas, quilombos não titulados, nas periferias, especialmente das grandes cidades.
A água é um direito ainda a ser conquistado! E nesse sentido, a privatização das empresas públicas de água e saneamento vêm na contramão do acesso à água potável. Este bem essencial deve ser garantido pelo Estado e não ser entregue à iniciativa privada, com a falsa promessa de que vai garantir esse direito para todos e todas. Temos exemplos no Brasil e no mundo de que a privatização não resolveu a questão do acesso, pelo contrário: a partir do poder econômico, as pessoas ficaram excluídas, sem ter água potável para beber, alimentar-se, para viver! Os custos dessa água privatizada aumentaram, e os investimentos feitos pelas empresas privadas não ampliaram, de forma necessária, os sistemas e nem as estruturas.
Neste #diamundialdaagua é que se torna cada vez mais urgente a ação do Estado e governos que garanta o acesso às águas e que responsabilize os agentes que contaminam.
Neste dia de reflexão e de luta, a Amigos da Terra Brasil destaca a voz de agricultores agroecológicos e contra a privatização. Veja os vídeos abaixo:
Necessitamos um Marco Mundial da Biodiversidade com políticas ambientais rigorosas, que assegurem que o mundo volte a viver dentro dos limites planetários.
A biodiversidade está em crise em todo o planeta. O número de espécies, e de indivíduos dentro das próprias espécies, diminuiu de forma retumbante nas últimas décadas, e a comunidade científica adverte que nos próximos anos podemos perder um milhão a mais de espécies. Para quem está seguindo o tema de perto é mais evidente que essa crise da biodiversidade é, na verdade, uma faceta a mais da crise sistêmica, causada pelo modelo econômico atual e pelo mantra do crescimento infinito.
O Convênio sobre a Diversidade Biológica (CBD nas siglas em inglês) iniciou um processo para estabelecer um novo Marco Mundial da Biodiversidade durante a Conferência das Partes das Nações Unidas no ano de 2018, um encontro em que muitas das nações participantes se comprometeram a respaldar um marco para a “mudança transformadora” elaborado pela comunidade científica. Aí então, se abrigava a esperança de que essa decisão fosse uma oportunidade real para mudar o modelo econômico e proteger a biodiversidade. Frente a essa premissa, escrevi para um bom número de amigas, amigos e ativistas ecologistas de todo o mundo para lhes dizer: “você tem que participar desse processo, vai ser transformador”. Enquanto o Convênio sobre a Diversidade Biológica fingia escutar as necessidades da sociedade civil e dos povos indígenas na primeira ronda de consultas, quando veio a luz o primeiro rascunho, tomei um duro golpe: as medidas que poderiam transformar verdadeiramente o sistema econômico que minava a biodiversidade – tais como normas/políticas rígidas e coordenadas para minimizar o dano ambiental – não tinham nenhuma possibilidade de êxito.
O plano das grandes empresas é seguir devastando a biodiversidade a curto prazo, com a promessa de que compensarão esses danos a longo prazo
Por sua vez, nos demos conta rapidamente de que a participação das grandes empresas nas discussões estava obstruindo qualquer avanço, tal como acaba de demonstrar um novo estudo da Amigos da Terra Internacional. Inclusive empresas criminosas como BP, responsável pelo derramamento de petroleiro de Deepwater Horizon em 2010, ou a Vale, que envenenou centenas de quilômetros de rios com rejeitos tóxicos de suas minas diante do rompimento de duas represas de rejeitos no Brasil. Grandes contaminantes como estas empresas criam coalizões que se apresentam como ‘verdes“ ou “sustentáveis”. Porém, nas salas de negociação, com as portas fechadas, advogam por medidas voluntárias e de maquiagem verde que simulam uma regulação verdadeira. Está evidente que entendem que qualquer medida eficaz frente a perda de biodiversidade os prejudica e constitui um obstáculo para suas ganâncias.
Durante anos temos visto como os estados participantes e os altos funcionários da ONU recebem de braços abertos essas coalizões empresariais e suas propostas. Isso faz com que os resultados deste convênio- chave sobre a biodiversidade – e as políticas que vão reger a próxima década – estejam repletos de propostas de lavagem verde. Os conceitos de “Natureza positiva” e “soluções baseadas na natureza” são algumas dessas medidas, que colocam em perigo as verdadeiras soluções da crise urgente da biodiversidade.
O conceito de “Natureza positiva” ou “positivo para a natureza” pode soar bem, mas sua definição é muito confusa. O termo natureza pode ser uma referência a políticas que nada tem a ver com a biodiversidade e “positivo” é, inclusive, mais ambíguo
Ainda que possa parecer que implique em algo bom, na realidade gera um resultado duvidoso, se seguem destruindo ecossistemas e os processos de restauração são questionáveis. O plano das grandes empresas é seguir devastando a biodiversidade a curto prazo, com a promessa de que compensarão esses planos a longo prazo. O que esperam aqueles que propõem o conceito de “Natureza positiva” é que no ano de 2030, o resultado possa ser ligeiramente positivo. Porém, quando dimensiono a perda de biodiversidade que vi ao longo da minha vida, fica evidente que não podemos permitir mais perdas.
Muitos dos projetos baseados na natureza não são mais que plantações de monocultivos de árvores, que não aportam nenhuma biodiversidade.
Tanto o conceito de “natureza positiva” quanto o de “soluções baseadas na natureza”, o SBN, se baseiam em compensar, sejam as emissões atuais de CO2 ou os ecossistemas que querem destruir, o que supõe que um tipo de ecossistema possa ser compensado com outros, sem levar em conta a sua capacidade de absorção de CO2, a complexidade de organismos que existe em cada ecossistema, o caráter único de cada espécie ou o território sagrado para os povos indígenas. Tal compensação é uma “solução” para as empresas que querem manter seus benefícios e seguir minando a biodiversidade com a desculpa de que sua destruição é sustentável porque se compensará em outro lugar. O conceito não só é totalmente errôneo, como não é realista. Na realidade, compensar dessa forma requer grandes extensões de terras para capturar carbono, que excedem a superfície de terras disponíveis a nível mundial.
Permitir a compensação de emissões dá para as empresas um passe livre para seguir arrasando o meio ambiente apesar da emergência climática e da perda exacerbada de biodiversidade. Muitos dos projetos baseados na natureza não são mais que plantações de monocultivos de árvores, que não aportam nenhuma biodiversidade. Reservar terras para compensar emissões de carbono também compete com a demanda de terras de cultivo do agronegócio.
Porém, alguns poucos projetos pontuais de soluções baseadas na natureza que incluem práticas agroecológicas e a participação de Povos Indígenas e comunidades locais são apresentados em folhetos atrativos, em todas as cores, e afirmam falsamente que as soluções baseadas na natureza representam uma mudança de significado para o clima e a biodiversidade.
Ao mesmo tempo, ambos conceitos empresariais representam uma grande carga para os Povos Indígenas e para as comunidades locais. Muitos projetos de compensação acontecem em suas terras e frequentemente os expulsam de seus territórios. As empresas tendem a afirmar que o uso da terra feito pelas comunidades nativas prejudica a biodiversidade, ainda que seja demonstrado o contrário. Cerca de 80% do remanescente de biodiversidade terrestre se preservou graças aos povos indígenas e comunidades locais, apesar das violações de seus direitos e o assassinato de defensores e defensoras ambientais.
Embora a destruição de ecossistemas faça parte de uma crise mundial que temos que resolver, não é apenas uma questão técnica, como também de justiça. Necessitamos um Marco Mundial da Biodiversidade com políticas ambientais rigorosas que garanta que o mundo volte a viver dentro de limites planetários. As empresas têm que ser submetidas a uma regulamentação rigorosa, ao invés de ser permitido que criem as suas próprias medidas para evitarem as responsabilidades. Mas, antes de qualquer coisa, é preciso proteção aos direitos dos povos indígenas e comunidades locais, que são os verdadeiros guardiões que protegem a biodiversidade.
*Artigo de opinião de Nele Marien, Coordenadora do Programa Bosques e Biodiversidade da Amigos da Terra Internacional. Publicado originalmente no site El Salto, no dia 14 de dezembro, em: www.elsaltodiario.com/opinion/cumbre-de-biodiversidad-cop15
A cooptação empresarial se infiltra e influencia a COP15 do Convênio sobre a Diversidade Biológica (CBD) e tenta fazer da natureza um negócio. Quem mais perde e perderá com isso são os povos e o meio ambiente. O novo informe da Amigos da Terra Internacional, intitulado “A natureza dos negócios”, convoca a UN Biodiversity a salvar a biodiversidade e a resistir à Captura Corporativa. Confira o material na íntegra:
Informe “A natureza dos negócios”
A cooptação empresarial infiltra-se e influencia a COP15 da Convenção sobre Diversidade Biológica e tenta fazer da natureza um negócio. Quem mais perderá com esse fato são os povos e o meio ambiente.
De acordo com o informe de avaliação global da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES) e o relatório das Nove Fronteiras Planetárias, a biodiversidade está em perigo e o mesmo acontece com a vida na Terra.
Embora se saiba que as grandes empresas são um dos principais motores da crise da biodiversidade, muitas destas empresas afirmam que são parte da solução e estão à mesa das negociações; infiltram-se nos processos da ONU para assegurar que os seus interesses permaneçam protegidos e para que não existam “soluções” que prejudiquem os seus lucros.
A influência empresarial não é nada de novo, mas tem aumentado nos últimos anos. Tem sido estimulada pela necessidade de parecer responsável perante os consumidores e investidores interessados nas questões ambientais, pela sedutora possibilidade de lucros “verdes”, e pela atitude acolhedora do sistema das Nações Unidas em geral e especialmente da Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB). Nestes fóruns, as grandes empresas são vistas como um interveniente necessário, em linha com a ideia de que sem as empresas (e o seu dinheiro) não podemos resolver os problemas ambientais
Este informe com o título “A Natureza do Negócio”: A influência empresarial na Convenção sobre Diversidade Biológica e no “Marco Mundial da Diversidade Biológica”, estabelece as estratégias e táticas utilizadas pelas entidades empresariais na CDB. Também analisa em detalhe as muitas coligações empresariais e os seus membros, bem como as propostas de maquiagem verde (greenwashing) que eles elaboram.
Táticas e estratégias utilizadas pelas empresas para influenciar ou cooptar agências e processos da ONU
As grandes empresas utilizam uma variedade de táticas e estratégias para alcançar os resultados pretendidos nos processos da CDB. Em particular, formam coligações com nomes promissores para defender (e fazer lobby com) soluções sustentáveis que protegem os seus interesses comerciais, mas não fazem nada pelo meio ambiente. Mecanismos de compensação (tais como “nenhuma perda líquida”, “ganho líquido”, “natureza positiva” e “soluções baseadas na natureza”), auto-relatórios, auto-regulação e auto-certificação são alguns exemplos.
Salvar a biodiversidade requer uma mudança transformadora, não uma cooptação empresarial
O envolvimento das grandes empresas na CDB é revelador de um conflito de interesses fundamental: como poderiam os principais responsáveis pela perda da biodiversidade – as mesmas empresas que têm de pagar dividendos aos seus acionistas – promover a transformação radical de que necessitamos? Será que aceitariam um espaço operacional restrito e receitas reduzidas como resultado?
A resposta curta é não; eles não o farão. E o impacto da influência empresarial na CBD COP15 já é evidente no projeto do Marco Mundial da Diversidade Biológica. Longe de ser transformadora, não aborda métodos de produção insustentáveis e permite que o negócio continue como de costume, que sigam fazendo os seus negócios como sempre.
Recomendações do informe
Este informe é dirigido à ONU e aos seus estados membros para lhes lembrar que a sua prioridade máxima deve ser servir ao interesse público – incluindo todas as pessoas e seres não humanos do planeta – e abordar urgentemente a cooptação corporativa da CDB. Convida a ONU a:
– Rejeitar a pressão das grandes empresas – Fortalecer a transparência em torno do lobby – Limitar o papel do setor empresarial e colocar um limite à sua participação -Divulgar todas as relações e vínculos existentes com o setor privado – Estabelecer um código de conduta para as/os funcionárias/os da ONU – Encerrar todas as parcerias existentes com grandes empresas e entidades comerciais – Estabelecer um quadro juridicamente vinculativo de obrigações que possa responsabilizar as empresas pelas leis ambientais, de direitos humanos e de direitos laborais.