Na sexta-feira (31/05), vozes ecoaram pela capital gaúcha alertando que as enchentes que atingem o RS têm causas e culpados. A juventude organizada, partidos políticos, movimentos sociais, organizações ambientalistas e pessoas afetadas estiveram na Marcha pelo Clima, ato organizado pelo Eco Pelo Clima junto a outras organizações, como a União Estadual dos Estudantes.
Embalado por cantos como “essa chuva não é normal, capitalismo é desastre ambiental” e “Do Lami ao Sarandi, prefeito Melo eu não te vi”, somados a gritos de “Fora Leite” e “Fora Melo”, o ato denunciou o descaso de governantes com o povo e a responsabilidade do sistema capitalista na emergência climática. Destacou, ainda, a relação da devastação da natureza, imposta por projetos políticos que colocam o lucro acima da vida, com o atual cenário de enchentes no RS.
A tragédia também é política. E na receita deste caos anunciado, está a decisão do prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), assim como do governador do estado, Eduardo Leite (PSDB), em ignorar avisos há tanto proferidos por ambientalistas, movimentos sociais, organizações por justiça socioambiental e cientistas. Está, também, a falta de investimento destes em políticas públicas e as ações de desmonte e sucateamento do que é público. Nas privatizações massivas, no desmonte da proteção ambiental e no avanço do agronegócio, da mineração e da especulação imobiliária, que nos trazem a um profundo desequilíbrio ecológico.
Na concentração do ato, na Esquina Democrática, uma faixa anunciava: “Essa enchente é movida a carvão”. O RS concentra 90% das reservas de carvão do Brasil, e é o estado cotado para ser “a nova fronteira minerária do país”. Junto ao petróleo e ao gás, figurando na indústria fossilista, o carvão é um dos principais fatores de emissão de CO2 na atmosfera, gás de efeito estufa que mais acelera o aquecimento global e a emergência climática.
O governo de Eduardo Leite privatizou serviços complicando o acesso e a qualidade destes, dilacerou o código ambiental do RS, flexibilizou a legislação ambiental e abriu brecha para que grandes empresas e os ricos que lucram com o carvão, com a mineração, cravem suas garras em territórios de vida. O mesmo ocorre quanto ao agronegócio, outra atividade de alto impacto socioambiental negativo e que nos traz a emergência climática – defendida por Leite e em expansão no RS. Ao menos 20% da geografia do estado é monocultivo de soja para exportação, o que além de tudo nos mantém em uma relação de dependência do capital estrangeiro, minando a soberania. Todos estes são fatores que agravam a situação trágica, hoje vivida na pele por mais de dois milhões de gaúchos afetados. De acordo com a última atualização da Defesa Civil (01/06 – 9h), são 475 municípios afetados,
37.812 pessoas em abrigos, 580.111 desalojadas, 806 feridas, 43 desaparecidas e 171 óbitos confirmados.
Em marcha até o Palácio do Piratini, o ato contou com falas salientando que o povo não merece cidades provisórias ou de lona, como as que Sebastião Melo insiste em implementar, em total descaso com o povo, especialmente jovem, negro, ribeirinho, indígena e periférico. Houve denúncia da cidade provisória que o Prefeito Sebastião Melo insiste em querer criar no Complexo do Porto Seco. Na mesma data do ato, 31 de maio de 2024, Melo anunciou pela manhã plano realizado com apoio da Alvarez & Marsal, especialista em processos de gentrificação social e privatização, além de limpeza de nome dos responsáveis por tragédias.
No ato foi abordado o racismo ambiental que eclode em solo gaúcho, e que também existe na Palestina ocupada, que vive um processo de colonização e genocídio pelo Estado de Israel. Pauta presente, que contou também com fala e momento de silêncio em respeito às vítimas palestinas do processo de colonização, apartheid social, violência e limpeza étnica promovida pelo Estado de Israel contra o povo palestino.
Após segunda concentração do ato pelo clima, no Palácio do Piratini, manifestantes se somaram a outra manifestação, que teve ponto de encontro no Largo do Zumbi dos Palmares e foi organizada por moradores e comerciantes do bairro Cidade Baixa, também afetado pela enchente. A marcha seguiu pelas ruas do bairro, pautando com mais força o Fora Leite e Fora Melo.
Não há justiça climática sem justiça social. O mesmo sistema capitalista, racista e patriarcal que causa a morte de rios, florestas e biomas, é o que retira direitos da classe trabalhadora, suas casas, sua saúde, as condições de vida digna e os territórios dos povos. Quando um território é afetado, todos são. As fronteiras coloniais impostas pelo mundo capitalista não nos servem, e tampouco as águas que avançam após serem represadas por projetos de morte pedem licença para passarem de uma fronteira a outra.
Que na confluência das lutas, e nesse entendimento, sejamos capazes de somar forças e organizar a revolta. Demandando direitos, a começar pelo investimento em políticas públicas que considerem a emergência climática, construídas a partir das demandas e necessidades dos territórios, e em diálogo permanente com atingides.
Seguimos na luta!
Leia também a nota de posicionamento da Amigas da Terra Brasil “INUNDAÇÃO NO RS: A emergência é climática, a responsabilidade é política. A solidariedade, a nossa força”