Missão de Monitoramento no Vale do Taquari é marcada por relatos que expõem série de violações

Comitiva de entidades visitou as cidades de Lajeado, Roca Sales e Arroio do Meio nos dias 27 e 28 de novembro

Após visita a três cidades gaúchas fortemente impactadas pelas enchentes no Vale do Taquari, que contou com conversa com pessoas afetadas, a Missão de Monitoramento de Direitos Humanos realizou uma audiência pública para ouvir moradores de regiões atingidas pelas enchentes. Uma série de denúncias evidenciou o descaso do poder público municipal e estadual. Encerrando as atividades, a Missão realizou, no dia 28, uma reunião com representante do governo federal, movimentos sociais e moradores. Convidadas, as prefeituras locais não compareceram, se isentando do diálogo.

Em audiência, moradores da região relataram as dificuldades enfrentadas após as enchentes que atingiram o estado – Foto: Carolina Colorio
Moradoras atingidas pelas enchentes reivindicam os seus direitos | Foto: Carolina Colorio

A roda de diálogo contou com a participação de representantes de variados entes sociais: Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), Movimento de Trabalhadores Sem Teto (MTST-RS), Movimento de Pequenos Agricultores (MPA), Amigas da Terra Brasil, Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do RS, Conselho Estadual de Direitos Humanos, Centro de Direitos Econômicos e Sociais (CDES), Defensoria Pública do RS (DPE-RS), Ouvidoria da DPE-RS,  Conselho Estadual do Direito da Mulher, deputados e representantes de mandatos, Fórum Permanente de Mobilidade Humana (FPMH) do RS, Secretaria Estadual de Direitos Humanos, Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares (RENAP), Ministério do Desenvolvimento Social, Organização Internacional para Migrações das Nações Unidas (ONU-OIM), sindicatos e outros movimentos sociais.

Presidenta da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, a deputada estadual Laura Sito (PT) abriu o encontro falando sobre a escuta realizada com moradores atingidos pelas enchentes nas cidades de Lajeado, Roca Sales e Arroio do Meio, respectivamente nos bairros Conservas, Centro e Navegantes.

A parlamentar também citou a audiência realizada no dia anterior, ressaltando que a Missão convidou representantes das prefeituras locais e autoridades, que não compareceram ao debate. “Foi muito emblemático porque convidamos todas as prefeituras da região para acompanharem a nossa ação e a audiência pública. Chamamos para reunião de hoje. Nos causou bastante estranheza o descaso das prefeituras de responderem a um chamado sobre situações muito mais ligadas à sua atuação cotidiana. A única prefeitura que esteve na audiência foi a de Arroio do Meio”, afirmou.

Segundo Laura, a escuta foi permeada por relatos que se assemelham e entrelaçam, especialmente no tocante a questões estruturais ligadas à saúde, política de aluguel social, casas provisórias, acesso limitado à água potável, aumento na conta de luz e uma série de humilhações. “A RGE e a Corsan não respeitaram acordos com a Defensoria Pública, e as contas de água e de luz das pessoas aumentaram”, denunciou, mencionando o acordo de isenção de cobrança.

Também chamou atenção para a dificuldade do manejo de lixos e dejetos nos municípios atingidos, além da preocupação com as zoonoses (doenças transmitidas por animais). Quanto à educação, destacou a questão das escolas afetadas, da falta de infraestrutura adequada e das crianças que não conseguem dar continuidade ao ano letivo. Pontuou ainda que é muito preocupante a questão dos imigrantes. Muitas vezes refugiados de seus países, vêm ao Brasil em busca de melhores condições de vida, mas se deparam mais uma vez com um cenário de violações de direitos, desamparo e com a condição de refugiados climáticos. Laura relatou que foi até embaixadas buscando diálogo.

Outra violação constantemente presente nos relatos da população foi quanto ao atendimento socioassistencial, via Centros de Referência em Assistência Social (CRAS). O serviço não tem dado conta, o que gera uma série de humilhações e exaustão em quem busca atendimento.

“Justiça para limpar essa lama” | Foto: Carolina C.

Assista a integra da audiência aqui

Na sequência, o coordenador do escritório do governo federal em Lajeado, secretário de Comunicação Institucional da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Emanuel Hassen de Jesus (conhecido como Maneco), fez um relato sobre as ações do governo federal no atendimento à crise das enchentes no estado. Começou sua fala evidenciando a necessidade de olhar para o meio ambiente. “Temos que recolocar esse tema na pauta. Meio Ambiente não é só cuidar do desmatamento da Amazônia. Cada um de nós, como cidadãos, temos que colocar esse tema no nosso dia a dia, o da sustentabilidade. Ou eventos extremos serão cada vez mais frequentes, causando tragédias.”

Ex-prefeito de Taquari, Maneco lembrou que o governo federal realizou duas visitas ao Rio Grande do Sul. Ele apontou que, na região, 99% dos anúncios da União se realizaram ou estão para se realizar. “Na educação o dinheiro está lá, faltando o município licitar. Demora para a pessoa enxergar o livro de volta, o computador, tem um processo até ser comprado. Mas o dinheiro está garantido e os municípios estão trabalhando para ele ser viabilizado. Mesma coisa com o Minha Casa Minha Vida. Vamos enxergar as casas quando elas forem construídas. Em Lajeado e Encantado a tendência é que em 30, 45 dias comece a construção. Dois municípios que tiveram portaria publicada. Algumas prefeituras são mais rápidas, outras mais devagares”, comentou.

Entre as ações do governo federal, destaca-se a criação do “Minha Casa Minha Vida Rural Calamidades”. De acordo com o secretário, até a sexta-feira passada (24) haviam 110 casas cadastradas na região. Em relação à construção de omradias, a União dividiu a responsabilidade: o município providencia as áreas e o governo do estado constroi as casas temporárias, até o governo federal fazer a moradia definitiva pelo Minha Casa Minha Vida.

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O secretário também afirmou que mais de 52 milhões foram destinados à Defesa Civil aos municípios, recursos para sotuaçoes como abrigo ou aluguel social. “O governo deu tudo que os municípios tinham direito, conforme número de pessoas desabrigadas.”

Na saúde, afirma que o repasse foi de 100% do que os municípios pediram. “Vieram R$ 49 milhões na região para recursos em hospitais e reequipar postos de saúde, R$ 29 milhões para a educação, e todos os municípios da região que requisitaram recursos para reequipar Centros de Referência em Assistência Social (CRAS) e Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) receberam 100% do que pediram”, disse.

Quanto à agilidade no processo de atendimento à população, Maneco mencionou que uma casa pode demorar mais de ano e meio para ficar pronta e que os processos demoram. Salientou, ainda, que não é papel do governo federal fiscalizar.

“Não é culpa de ninguém, é de todo mundo. Não tinha legislação e programas para momentos como a gente tá vivendo, de uma sequência de tragédias no país inteiro. Temos enchentes no sul, seca na Amazônia, incêndio no Pantanal, todo dia, toda hora. O Brasil chegou a ter quase 30% dos municípios em estado de calamidade. Precisamos melhorar, porque a tendência é essas coisas seguirem acontecendo”, defendeu.

As cidades ainda estão cheias de entulhos das enchentes / Foto: Carolina Colorio

Moradores relatam preocupações 

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Arroio do Meio, Astor Klaus, ressaltou que os pequenos agricultores perdem muito com as enchentes. “Se perdeu muita produção de alimentos, que replantamos depois da primeira enchente. A segunda enchente veio e foi-se de novo o plantio”, contou, questionando qual recurso para este tipo de situação.

Diego Alexandre Dutra, atingido da cidade de Cruzeiro do Sul, pontuou que tanto o governo federal quanto o estadual mandam recursos, contudo ele não chega até a população. “Eu fiz sete cadastros mas em nenhum deles eu fui contemplado, porque não tenho Bolsa Família. Mas a enchente não pegou só aqueles de baixa renda, na extrema pobreza. Cruzeiro do Sul está esquecida. Dinheiro chega, mas falta organização e principalmente transparência: onde o recurso está sendo utilizado, como?”

Bairro Centro, em Roca Sales. Novembro, 2023. Foto: Carolina Colorio

De acordo com ele, em relação à assistência social havia só uma pessoa para fazer o cadastro. ”Filas e filas e filas, pessoal reclamando e ninguém atendido. Pedimos atenção especial do poder público do estado, do poder federal”, adicionou. Pai de três meninas, Diego conta que essa é a primeira enchente que ele enfrenta, e que a enchente de setembro levou tudo. “Cruzeiro do Sul tem pouco maquinário, ninguém veio nos salvar. A Defesa Civil não tem um barco, um motor, nada. Fomos para o telhado na primeira enchente, amarraram cordas para o pessoal ir subindo. Cruzeiro precisa de muita atenção agora.”

Rever a política de assistência social

Carine Bagestam, consultora do Ministério de Desenvolvimento Social, em parceria com a ONU-OIM, mencionou ser nítido que as assistências sociais nos municípios são uma política fragilizada. “Antes da emergência tinha um déficit, sem equipe mínima”, disse. Para ela, especialmente agora, é fundamental uma reformulação dos critérios e cadastros. “Ontem tivemos reunião com a secretária do estado e reforçamos que tem que ter uma construção estadual e federal para rever a política de assistência social, especialmente em contexto de calamidade”, reiterou.

Ela também chamou atenção sobre a crise habitacional. “Não há informação clara sobre as casas provisórias. As famílias estão esperando, querem saber em quantos dias chega a casa e quem vai acessar.” Contou que o recurso da assistência social está em caixa, que os municípios receberam. “O que sentimos no Vale é que os alojamentos são muito provisórios. A maioria dos municípios começou a tirar pessoas dos alojamentos sem uma inspeção de segurança das casas e nem saber para onde essas famílias iriam, correndo perigo eminente dessas famílias voltarem para casas de risco”, sinalizou.

“Meio Ambiente não é só cuidar do desmatamento da Amazônia”, defende Maneco / Foto: Fabiana Reinholz

O perigo das barragens

A integrante do MAB, Maria Aparecida Castilho Luge reforçou a realidade dos atingidos pelas barragens na região. Ela salientou a necessidade de estudos em relação à questão. “É preciso transparência. De quem são essas barragens?”, questionou. Durante a visita da Missão às cidades, que antecedeu a audiência pública, foram inúmeros os relatos, em especial em Roca Sales, conectando as barragens aos impactos das últimas enchentes e alterações no fluxo das águas.

“Verificamos a falta de um sistema de alerta das enchentes, pois não existe um monitoramento dos rios na região. Isso poderia ser executado em parceria com as universidades”, sugeriu o presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos do RS (CEDH RS), Júlio Alt. Segundo ele, é imprescindível que haja mecanismos efetivos para reconhecer uma calamidade e alertá-la à população, o que passa por um esforço coletivo com estudos, envolvimento de universidades, municípios, poder estadual, coletivos e movimentos, para pensar alternativas desde a questão das barragens, seus impactos e a prevenção de seu uso.

Ainda no enfoque ambiental, Júlio reforçou que é necessária uma atuação drástica frente à catástrofe climática. “Que a gente possa pensar também em parcerias para recompor matas ciliares, a Mata Atlântica, pensar um regime ambiental. Sugerimos implementar um código ambiental nacional, para que a médio e longo prazo a gente possa arrefecer os impactos de calamidade pública”, disse.

Outros pontos destacados por ele foram a criação de grupos e comitês para fiscalizar onde está o recurso repassado pelo governo federal e a criação de um plano de trabalho. “Precisamos pensar alternativas desde a questão das barragens, dos impactos nos territórios.”

Na reunião moradores relataram as dificuldades enfrentadas / Foto: Fabiana Reinholz

Falta de sintonia entre governos prejudica população

Para o coordenador jurídico do CDES, Cristiano Muller, há uma dessintonia que faz com que os investimentos do governo federal não cheguem a quem realmente precisa. Ele propôs que o escritório do governo federal na região não seja fechado e que seja criado um canal de informação e participação dos atingidos, no sentido de que sejam feitas reuniões ampliadas de prestação de contas dos municípios para o governo.

“Foram R$ 29 milhões em recursos em educação e ontem ouvimos denúncia de creche fechada e crianças amontoadas em um salão. O que ficou claro na audiência pública é que no CRAS as pessoas são humilhadas, que pedem muitos documentos. Temos que entender as pessoas atingidas como todas que estão em situação de calamidade, não só as de baixa renda. Quem define quem foi atingido não é política pública, é a água. Não podemos excluir essas pessoas”, acrescentou.

Segundo observou Júlio Alt, muitas pessoas não sabem como acessar essas políticas, ou, quando tentam, é muito burocrático. Claudete Sillas, da Secretaria Estadual de Direitos Humanos, reforçou a questão da saúde mental e da mobilidade, propondo CRAS móveis, tendo em vista que, para quem perdeu tudo na enchente, deslocar-se inúmeras vezes em busca de atendimento é mais uma violação de direito.

A saúde mental da população é outro tema que precisa de atenção, tendo em vista uma série de traumas causados pelas enchentes e da consequente falta de amparo. “As pessoas estão depressivas, precisam ser ouvidas, precisam ser aconchegadas. Há urgência de um atendimento de saúde mental e mudar um pouco desse esquema de saúde”, acrescentou.

A moradora do bairro Conservas, em Lajeado, Michele Siqueira, sente falta de comunicação com relação às enchentes. Ela também chamou a atenção para a situação das estradas que estão desbarrancando. “Na primeira enchente com imensa quantidade de água já desceu a parede de terra e colocaram pedras ali. A estrada está diminuindo. Não temos proteção naquela lateral, já começou a dar acidente pela quantidade de chuva, asfalto liso. É perigoso”, disse.

Michele mora a 500m do rio Taquari e contou que nunca tinha visto a água subir tanto. Com a enchente de setembro ela perdeu tudo. “Nosso bairro, Conservas, está uma bomba relógio. Não é só quantidade de chuva, é de água. A Defesa Civil encaminhou caminhões e eles se negaram a atender as pessoas porque a ponte estava trancada com o excesso de água”, relatou.

Bairro Centro, em Roca Sales. / Foto: Carolina Colorio

Orçamento 2024

Há muito tempo cientistas do clima e boa parte da militância socioambientalista alertam sobre a gravidade da emergência climática, denunciando o racismo ambiental e uma série de riscos. Sobretudo para as populações empobrecidas, periféricas, indígenas, ribeirinhas e quilombolas. Mesmo assim, tanto as esferas municipais, quanto estaduais e federal, não apresentam soluções estruturais para o tema.

A aprovação do orçamento previsto para a adaptação climática no RS, em 2024, é um exemplo. Do total de R$ 80,348 bilhões, somente 157,933 milhões são para o tema: menos de 0,02% do orçamento total aprovado. Além disso, no eixo Sustentabilidade Ambiental no Plano Plurianual (2024-2027), consta a proposta de aplicar pouco mais de R$ 260 milhões, enquanto há um investimento previsto de mais de R$ 1,6 bilhão para o setor da agropecuária – atividade que, conforme dados de 2021 do Sistema de Estimativa de Emissão de Gases, é responsável por quase metade das emissões de gases de efeito estufa no estado.

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Levando em conta as enchentes e catástrofes climáticas, o investimento em Defesa Civil também deixa a desejar. Para o próximo ano, o governo gaúcho pretende realocar R$ 50 mil na Defesa Civil, que é a primeira a agir durante emergências e a responsável pelo resgate da população atingida. O montante total para um ano inteiro de atuação da Defesa Civil, que precisa urgentemente de melhorias na infraestrutura, compra de equipamentos e na contratação de profissionais, especialmente tendo em vista os inúmeros episódios catastróficos no estado, equivale a menos do que o preço de um carro popular.

Conforme dados de boletim do governo do estado, atualizado em 27 de outubro, chuvas intensas e enchentes impactaram 107 cidades, afetando até aquele momento 402.297 pessoas. Destas, 22.283 pessoas ficaram desalojadas,  5.216 ficaram desabrigadas, 943 feridas, seis desaparecidas e 52 morreram. Em novembro quase 700 mil pessoas foram afetadas, direta ou indiretamente.

Manifestação durante audiência / Foto: Carolina Colorio

Rede de solidariedade 

O representante MPA de Arroio do Meio, Lari João Hoftomer, destacou a importância da solidariedade. Desde a enchente de 2010, o movimento desenvolve ações neste sentido, levando sementes crioulas, mudas e ramas para famílias de agricultores que são atingidas.

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Sobre a última enchente, lembrou da visita de solidariedade. “Arrecadamos dinheiro onde era possível. Entregamos mudas, sementes e ramas de mandioca.” Ele alientou a importância de olhar para a agricultura familiar e para as sementes crioulas, que dentro do princípio da agroecologia são práticas de produção que causam menor impacto socioambiental, numa lógica oposta à do agronegócio – um dos maiores expoentes para a emissão de gases de efeito estufa no Brasil, devido a alteração do uso do solo.

Atuando desde setembro na região, o MAB tem feito o atendimento emergencial e de articulação junto às comunidades para acessarem as políticas públicas necessárias. Juntamente com o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) e o Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional do Rio Grande do Sul (Consea-RS), o movimento montou uma cozinha solidária em Arroio do Meio, após a primeira enchente. Mais de 1,2 mil refeições chegaram a ser feitas por dia, além disso, o MAB tem apoiado mais de 600 famílias que já receberam 2.100 cestas básicas, milhares de litros de água e 500 kits com produtos de limpeza. O movimento segue com as doações.

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A coordenadora do MAB, Alexania Rossato, reitera relatos feitos na audiência, quando foi exposto que, em algumas situações, a entrega de cestas básicas distribuídas pelo movimento foi o único apoio que as famílias receberam. Ela também reforçou o desinteresse das autoridades locais em participar da missão. “Prefeitos convidados não compareceram e se negaram  a ouvir as demandas do povo, assim como se negam a caminhar onde o povo mora. O que ouvimos no mutirão que fizemos, durante todo o dia, é que essa  realidade se repete em todas as prefeituras.”

Alexania relembrou do documento com reinvindicações dos atingidos, entregue ao governo em setembro, após a primeira enchente. Durante a reunião de 28 de setembro, ela questionou se seria possível dar sequência ao que foi proposto, e exigiu respostas em relação à questão de moradia e segurança alimentar. Trazendo um pouco de esperança, a liderança destacou a aprovação do Projeto de Lei (PL) 2788/2019, que cria a Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB) e aguarda sanção presidencial.

“A sensação é que há uma naturalização da enchente, virou comum. Só que não é assim, quem vive, quem sofre a enchente, que tem que limpar suas casas de novo. Recomeçar. Não dá pra nós naturalizar a enchente na vida das pessoas e tratar como uma coisa comum”, pontou Alexania.

Sobre a Missão

Na Missão de Monitoramento de Direitos Humanos do Vale do Taquari foram checadas violações de direitos e como as ações de reparação às famílias atingidas são feitas, bem como as medidas tomadas para reconstruir os locais e as condições de vida e de trabalho das pessoas afetadas. Ela foi organizada em três momentos: o primeiro de visita a cidades afetadas e conversa com moradores em seus bairros, o segundo com audiência pública e o terceiro com reunião com autoridades.

A Missão foi organizada pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), pela Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, pelo Conselho Estadual de Direitos Humanos, pelo CDES Direitos Humanos e pela Acesso Cidadania e Direitos Humanos.

Como encaminhamento da Missão, a Comissão de Direitos Humanos irá realizar um relatório das denúncias recebidas durante os dois dias. O documento será entregue ao Ministério Público do RS (MP RS) e ao Tribunal de Contas do RS (TCE RS). Também será solicitada uma audiência com o governo do estado.

Conteúdo também publicado no Jornal Brasil de Fato em: https://www.brasildefato.com.br/2023/12/03/rs-missao-de-monitoramento-no-vale-do-taquari-expoe-violacoes-a-familias-atingidas-por-enchentes 

Amigas da Terra Brasil participa de Missão de Monitoramento dos Direitos Humanos de atingidos por enchentes no Vale do Taquari (RS)

Nestes dias 27 e 28 de novembro, acontece a Missão de Monitoramento dos Direitos Humanos no Vale do Taquari. Depois de duas grandes enchentes que atingiram a região, em menos de três meses, a Missão fará visitas em quatro municípios para verificar como estão sendo feitas as ações de reparação das famílias e a reconstrução das condições de vida e de trabalho dos atingidos.

As atividades estão sendo organizadas pela Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, pelo Conselho Estadual de Direitos Humanos, pelo CDES Direitos Humanos, pela Acesso Cidadania e Direitos Humanos e pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

Além das visitas nos bairros de Lajeado, Cruzeiro do Sul, Arroio do Meio e Roca Sales, no dia 27 será realizada uma Audiência Pública no Seminário Sagrado Coração de Jesus, em Arroio do Meio, com a presença de atingidos de todas as cidades do Vale do Taquari e de autoridades. O objetivo é ouvir os relatos dos moradores da região sobre como estão sendo implementadas as políticas públicas e apresentar um relatório de monitoramento dos direitos humanos.

A Missão se encerra no dia 28 com uma mesa de diálogo com as autoridades locais para acompanhamento das ações que estão sendo realizadas e indicação de novas possibilidades para a reconstrução das regiões atingidas. Estarão presentes autoridades, entre elas a deputada estadual Laura Sito, presidente da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, e representantes da Comissão de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado, da Ordem dos Advogados do Brasil e do Tribunal de Justiça do estado.

“As mudanças climáticas já são uma realidade presente no nosso cotidiano e no Vale do Taquari atingiram diretamente milhares de pessoas. O Estado brasileiro e os governos das esferas federal, estadual e municipais precisam proteger vidas”, disse Alexania Rossato, coordenadora do Movimento dos Atingidos por Barragens. “A Missão quer alertar para o problema, ouvir a população e fazer o monitoramento dos diretos humanos”, completou Júlio Alt, presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos.

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Álbum de fotos da ATBR sobre a ronda no Vale do Taquari, no Rio Grande do Sul, nos dias 27 e 28 de novembro de 2023.

*Texto do post é o relise enviado à mídia
** Foto: Carolina Colorio/ ATBr

Crises sistêmicas e o Estado que queremos

O respeito ao outro, ao meio ambiente e modos de produção que não gerem crises estruturais são soluções para as crises

As tempestades, os ciclones, os desmoronamentos, as enchentes, as secas estão por todos os lados no Brasil. As crises desencadeadas por esses eventos mostram o completo colapso das relações de produção, como consequência delas as relações sociais, e nossa interação com a natureza, no sistema capitalista. O desequilíbrio entre as chuvas e as secas é resultado das mudanças climáticas, que como podemos ver no Brasil já não são eventuais, começam a se tornar contínuas.

Em julho deste ano, a cidade de Maquiné, dentre outras da região no estado do Rio Grande do Sul, sofreu com as fortes chuvas, deixando populações desabrigadas, isoladas, com problemas de acesso à energia e alimentos. No mês passado, novamente o estado enfrentou a mesma problemática. A tempestade deixou, pelo menos, 51 mortos; causou enchentes, destruição de casas e quebra de pontes. Os efeitos atingiram o estado de Santa Catarina. Segundo os meteorologistas, a intensidade desses eventos aumenta porque as águas dos oceanos estão mais quentes.

Na região Norte do país, o evento extremo oposto, as secas. As cidades amazônicas registram as maiores temperaturas. Oito estados enfrentam a mais severa seca dos últimos 40 anos. O voluptuoso Rio Amazonas está baixando, em média, 13 a 14 centímetros por dia. Os estados decretaram emergência ambiental pela escassez da água. Os animais morrem. As populações ribeirinhas perdem o rio, seu meio de transporte, e ficam isoladas. Os fatores para tais alterações são atribuídos ao El Niño, mas também às intensas modificações no meio ambiente do bioma, sobretudo o desmatamento.

Nos últimos anos, várias cidades brasileiras sofreram os impactos dos desastres climáticos. Apesar disso, os estados não modificaram suas escolhas econômicas. As opções políticas pelos subsídios ao agronegócio, à mineração, aos grandes empreendimentos e a políticas desiguais de ordenação territorial afetam diretamente na produção das catástrofes climáticas, assim como nas sequelas deixadas por elas. As políticas climáticas reduzem-se ao conservacionismo ambiental, da criação de  áreas de proteção, e às metas de redução de carbono, insuficientes para dar respostas à crise socioambiental.

O clima não é um assunto apenas físico, é profundamente social, histórico e cultural. Enquanto as soluções à crise climática forem pensadas sem envolver mudanças estruturais, notadamente a de sistema, seguiremos produzindo desencontros. A questão é que as altas classes não enfrentam os males do clima da mesma forma. Sua condição econômica lhes permite viver em zonas privilegiadas ou ter recursos para atendimento emergencial. Por isso, é no Sul Global, assim como na periferia, que as repercussões climáticas produzem maiores danos. Nessa história, comunidades e sujeitos, que pouco ou nada contribuem para as mudanças climáticas, são os que mais pagam sua conta.

Os estados, além das opções equivocadas de política econômica, não investem na estruturação da atenção da Defesa Civil, da assistência social emergencial e nem na provisão de apoio adequado às vítimas dos desastres naturais. Mesmo que os fatos estejam se repetindo ano a ano, mês a mês, governantes não conseguiram estruturar políticas públicas. Muitos dos recursos destinados às calamidades não são adequadamente empregados no atendimento às vítimas e na adoção de medidas de prevenção de desastres.

Isso porque o Estado assume uma percepção de que a vulnerabilidade social é um problema do indivíduo. Assim, pessoas que vivem em casas precárias, em barrancos, morros, próximas de rios, são responsáveis individualmente por desenvolver capacidades para lidar com essas situações. Isso ocorre da mesma forma nas situações trágicas. Os Estados não consideram que a situação econômica, de moradia, é resultado do acesso desigual, dos problemas de distribuição de renda, próprios da economia capitalista. O desfecho é que as vítimas estão completamente desamparadas pelo Estado.

Contra essa lógica, movimentos populares e organizações da sociedade civil, em sua luta anticapitalista, exercem valores solidários de apoio às vítimas, demonstrando uma prática de ser distinta. No Vale do Taquari, a região mais atingida com as enchentes de setembro no Rio Grande do Sul, criou-se a Campanha “Sementes da Solidariedade”.

Cozinha Solidária no Vale do Taquari, no Rio Grande do Sul – Victor Frainer | Levante Popular da Juventude

Composta pelo MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), Consea/RS (Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional), MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores), CPT (Comissão Pastoral da Terra), MAB (Movimento dos Atingidos e Atingidas por Barragens), Cáritas, Sindicato de Trabalhadores Rurais e Instituto Cultural Padre Josimo, visitou a região atingida levantando informações sobre as perdas, fornecendo apoio emergencial, inclusive da entrega de sementes para plantarem lavouras perdidas. Também foi construída uma cozinha solidária para apoiar na alimentação das famílias.

A experiência da militância do MAB, com o cenário de calamidade que se instaura aos rompimentos da barragem, contribuiu no apoio para as vítimas poderem se organizar em grupos, reivindicar indenizações, articularem-se para acessar moradias. Experiência apreendida na luta popular, que se constitui como um saber partilhado entre o povo. “Além da entrega das quentinhas, nós do MAB, fomos fazendo contato com pessoas, lideranças e referências, e percebemos que tinham demandas de casas, acesso a informações e direitos”, comenta Alexania Rossato, do MAB/RS. “Mais que levar comida, é preciso levar organização para as famílias”, “de serem sujeitos do processo histórico”, descreveu Alexania. Segundo a militante do MAB, a solidariedade “é parte do princípio do movimento, na situação delicada, gravíssima, que as pessoas passaram”.

Na esteira do acúmulo da experiência histórica da luta popular, a Cozinha Solidária do MTST serviu de referência para a construção da solidariedade no Vale do Taquari. Caio Belloli de Almeida, militante do MTST que esteve na região, destacou ser “muito importante a participação do MTST na Cozinha Solidária, nesta iniciativa, porque como movimento social que proveu a alimentação para as pessoas assistidas, a Prefeitura apenas entregava, não ajudava a construir. Inclusive, em alguns momentos, a Prefeitura ameaçou interromper o processo, foi muito importante o MTST estar lá para conseguir incidir na política”.

Lucas Gertz, do Levante Popular da Juventude, participou deste processo da cozinha. Para ele, os aprendizados da solidariedade da pandemia na produção de alimentos ajudaram a construir a experiência histórica para organizar as cozinhas emergenciais. Lucas caracteriza que vivemos “um processo de aquecimento, de ebulição global, o que torna muito mais importante e urgente as nossas organizações e a sociedade se voltarem ao debate ambiental”. Todo o processo vivenciado nas enchentes está relacionado à forma como estabelecemos as relações de produção, o fenômeno da privatização e a falta de prioridade para a vida na Terra, destaca Lucas.

De forma semelhante, o MST montou uma cozinha solidária no município de Encantado, também no Vale do Taquari, fornecendo marmitas diárias aos desabrigados. A cozinha, organizada com apoio do Levante Popular da Juventude, distribuiu marmitas produzidas com produtos da reforma agrária, orgânicos, vindos de cooperativas do movimento. Marildo Mulinari, militante do MST, conta que a cozinha foi instalada logo no dia seguinte à tragédia. A vivência tem sido rica com a comunidade: “O pessoal vem nos agradecer, dizer que se não fosse nós, não teriam o que comer porque foi a casa, foi tudo embora, as pessoas não tinham mais as coisas”.

Segundo Marildo, mais de 500 militantes estiveram envolvidos em toda a produção das marmitas, uma força tarefa mobilizada para o apoio às pessoas afetadas. Salete Carollo, uma das militantes do MST que foi à região em solidariedade, nos descreveu que foi uma experiência muito forte “para a gente que vem da agricultura, e principalmente, olhando para essa dimensão. É de como o ser humano se move, é pelo amor, pela terra, pela ternura; e se move com o coração para ajudar aqueles que mais precisam”. A fala de Salete é tocante do espírito, dos valores da militância que movem a ajuda humanitária, que são o valor da vida em sua integralidade. A comida que os assentados produzem, da terra que conquistaram, foi o que alimentou os atingidos. As mesmas mãos que trabalharam na produção do alimento trabalharam para o transformar em comida, para servir ao outro. É essa lógica de orientação do trabalho vivo, a da produção de mais vida, a que o mundo deveria estar orientado.

Cedenir de Oliveira, coordenador do MST, também esteve na Cozinha Solidária de Encantado e nos contou que todos que participaram da solidariedade ficaram impactados com a tragédia. “Nós do MST entendemos que poderíamos contribuir na confecção de alimentos, com o aprendizado ao longo de nossos 40 anos de existência, de produzir alimentos em condições adversas, nas estradas, nas marchas, então nós já adquirimos uma expertise”. Cedenir ressalta que o MST recebeu muita solidariedade até se consolidar nos assentamentos, produzir, ter cooperativas. Hoje, conquistou sua dignidade e encontra-se em condições de retribuir. Nas palavras do militante do MST, a solidariedade é um “valor importante para desenvolver não só na tragédia, mas no dia a dia, para romper a cultura do ódio e ignorância para construir uma sociedade mais justa e igualitária”.

A solidariedade militante aos efeitos trágicos das enchentes semeia os valores da sociedade que estamos construindo, centrada na vida humana e na natureza como maiores riquezas do universo. O respeito ao outro, a reciprocidade, o cuidado como política, a construção de outras relações com o meio ambiente, o fim do modo de produção que dá origem estrutural a essas crises são os caminhos para uma real transformação da sociedade, e o horizonte de solução da nossa crise.

Coluna originalmente publicada no Jornal Brasil de Fato, em 11 de outubro de 2023, na página: www.brasildefato.com.br/2023/10/11/crises-sistemicas-e-o-estado-que-queremos 

Conheça as propostas apoiadas pela Amigos da Terra para o Plano Plurianual (PPA)

Até esta sexta-feira (14), está aberta votação para que a população  decida quais políticas serão prioridade do governo federal. Cada pessoa pode votar em 3 programas de entidades da sociedade civil, além de 3 propostas apresentadas pelo próprio governo para o Plano Plurianual (PPA).

A votação é para incidir no principal instrumento de planejamento orçamentário de médio prazo do Governo Federal, o Plano Plurianual (PPA).Ele define as diretrizes, os objetivos e as metas da administração pública federal, contemplando as despesas de capital (como, por exemplo, os investimentos) e outras delas decorrentes, além daquelas relativas aos programas de duração continuada. O PPA é estabelecido por lei, com vigência de quatro anos. Ele se inicia no segundo ano de mandato de um presidente e se prolonga até o final do primeiro ano do mandato de seu sucessor.

Conheça e vote nas propostas da Marcha Mundial das Mulheres (MMM), Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e do Movimento dos Atingidos por Barragens  (MAB), apoiadas pela Amigas da Terra Brasil: 


🚩 Programa Periferia Viva (MTST): https://abrir.link/5cUx4

🚩 Criação da Política Nacional de Cuidados (MMM): http://abrir.link/nhdit

🚩 Criação do Fundo Nacional para as populações atingidas por barragens (MAB): http://abrir.link/XHcU7

Essa é a última semana de votação nas propostas para o Plano Plurianual.  É possível votar até sexta-feira, 14 de julho. Para votar acesse aqui

Caravana do Plano Plurianual (PPA) Participativo realizou plenária no Rio Grande do Sul

Plenária na Assembleia Legislativa gaúcha. Foto: Pepe Vargas/Twitter

Em Porto Alegre (RS), a caravana do Plano Plurianual (PPA) Participativo realizou no sábado (08/07) a plenária do Rio Grande do Sul. Propostas de políticas públicas de representantes de diversos segmentos da sociedade civil, como trabalhadores, estudantes, defensores da saúde pública, mulheres e indígenas, foram apresentados aos ministros do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, e da Secretaria-Geral da Presidência da República, Márcio Macedo.

Maria do Carmo Bittencourt, representante do Fórum Estadual de Mulheres do Rio Grande do Sul, defendeu diversas propostas, entre elas o fortalecimento do combate à violência de gênero e um programa de crédito subsidiado que beneficie as mulheres camponesas. “Também queremos defender que a Política Nacional de Cuidados entre no PPA. A gente sabe que o governo já lançou a Política Nacional de Cuidados, mas precisamos que ela entre no orçamento com muita força”, cobrou. Em maio, o governo anunciou a instalação de um grupo de trabalho para elaborar um projeto que vise a garantia de direitos para pessoas que exercem função de cuidador, que são majoritariamente mulheres, sejam membros da família ou trabalhadores remunerados.

Por meio da caravana, que está percorrendo todos os estados, o governo busca elaborar um PPA de forma participativa, a partir de um processo de consulta popular. Com a realização da plenária no Rio Grande do Sul, restam pendentes apenas os estados do Sudeste. Conforme o cronograma divulgado no site da Secretaria-Geral da Presidência da República, a caravana realiza a etapa de Minas Gerais na quarta-feira (12). Já na quinta-feira (13), estão previstas atividades pela manhã no Rio de Janeiro e no final do dia no Espírito Santo. A última plenária deve ocorrer na sexta-feira (14) em São Paulo.

Ao fim do processo de consulta popular, a Secretaria-Geral da Presidência da República irá sistematizar as contribuições da população e encaminhá-las ao Ministério do Planejamento, que submeterá à análise das equipes técnicas para eventual incorporação ao texto final do PPA. O plano deve ser entregue ao Congresso Nacional até 31 de agosto, acompanhando a LOA, para debate e votação dos parlamentares. A relatoria já está designada para o deputado federal Elvino Bohn Gass (PT-RS).

8 de março volta às ruas sem medo e sem anistia!

Nessa 4ª feira (08/03), a Aliança Feminismo Popular (AFP), composta pela Marcha Mundial das Mulheres do Rio Grande do Sul (MMM RS), Movimento das Trabalhadoras e Trabalhadores Sem Teto (MTST) e Amigos da Terra Brasil, marcou presença no ato unificado do #8m2023  em Porto Alegre (RS). O ato se concentrou na Esquina Democrática, no centro da cidade, e encerrou no Largo Zumbi dos Palmares. Contou com a presença de movimentos sociais, coletivos e organizações feministas, fechando um dia de intensas atividades, que começaram logo pela manhã.

No ato, os cantos das companheiras ecoavam as reivindicações deste #8m , que pautaram desde a responsabilização de Jair Bolsonaro por seus crimes até a construção de soberania nos territórios, garantindo que água, moradia, alimento, energia, saúde e educação sejam um direito assegurado a todas, todes e todos. As vozes se levantaram pelo fim do feminicídio, em defesa das liberdades democráticas, pela revogação da lei de alienação parental, pelo combate à fome, por empregos e salários iguais entre gêneros. Clamavam, ainda, pelo perdão das dívidas de famílias empobrecidas, revogação das reformas Trabalhista, da Previdência e do Ensino Médio, que nos impõem tantos retrocessos. Outra pauta central foi a descriminalização e legalização do aborto e seu debate dentro da saúde pública, assim como a defesa do SUS (Sistema Único de Saúde) e do SUAS (Sistema Único de Assistência Social).

CLIQUE AQUI para acessar galeria de fotos do ato unificado realizado no centro da Capital gaúcha. Crédito: Jonatan Brum/ ATBr

Artigo da ATBr no jornal Brasil de Fato >> 8 de março: nossa bandeira é a economia feminista

Animações da Capire e da ATI (Amigos da Terra Internacional) explicam o que é a economia feminista. VEJA AQUI

O PATRIARCADO MATA – JUSTIÇA POR DEBORA!


Mulheres organizadas nos movimentos sociais realizaram ato de denúncia ao perigo de rompimento da barragem da Lomba do Sabão e ao feminicídio de Débora Moraes – Foto: Carolina Lima/ Brasil de Fato

No início da manhã, mulheres do MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens) realizaram ato ecumênico em denúncia ao feminicídio de Débora Moraes, coordenadora do movimento assassinada pelo marido em 2022 em Porto Alegre (RS). A manifestação também evidenciou os riscos do rompimento da barragem da Lomba do Sabão, desativada desde 2013, e o descaso vivido pela população atingida. Mais informações nesta matéria do jornal Brasil de Fato

Em paralelo, mulheres camponesas ocuparam a superintendência do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). Também ocorreu audiência pública no parlamento gaúcho sobre o tema das mulheres e reunião com secretarias do governo estadual.

Seguimos em marcha, até que todas sejamos livres!

8ª Sessão de Negociações do Tratado Vinculante na ONU: a luta para responsabilizar as empresas transnacionais continua!

 

#RegrasParaAsEmpresas #DireitosParaOsPovos

Nesta 2ª feira, dia 24 de Outubro, inicia a 8ª Sessão de Negociações do Tratado Vinculante para regular as Empresas Transnacionais em matéria de Direitos Humanos na ONU (Organização das Nações Unidas), em Genebra (Suíça). Será uma semana de intensos debates e reuniões na tentativa de avançar na construção de um instrumento internacional jurídico e legalmente vinculante, que leve as transnacionais a serem responsabilizadas pelos crimes que cometem contra os direitos humanos das comunidades e povos nos mais diversos países, especialmente no Sul Global.

Participarão chefes de Estado e representantes da sociedade civil de todos os continentes. Pelos movimentos e organizações sociais do Brasil, teremos representantes do MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens); do HOMA – Centro de Direitos Humanos e Empresas, da UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora); e da Amigos da Terra Brasil (ATBr).

A coordenadora da Amigos da Terra Brasil e Amigos da Terra Internacional (ATI), Letícia Paranhos, lembra que a luta por um Tratado Vinculante iniciou em 2014, com a aprovação da Resolução 26/9 no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. Esta resolução criou o grupo de trabalho intergovernamental para elaborar um Tratado Vinculante de Direitos Humanos e Empresas, que se reúne anualmente em sessões de negociação na sede da ONU, em Genebra, como a que acontece a partir desta 2ª feira (24 de Outubro).

Letícia avalia que nesta 8ª Sessão de Negociações do grupo de trabalho será necessário defender conteúdos fundamentais na proposta de texto do Tratado Vinculante. Os golpes de Estado sofridos na América Latina como um todo, pelos quais assumiram governos neoliberais, debilitaram o conteúdo do Tratado. “Não podemos deixar que este instrumento se torne vazio. Com as eleições e o retorno de governos democráticos na região, necessitamos que os Estados retomem elementos-chave para que seja, de verdade, uma ferramenta capaz de romper com a assimetria de poder em que nos encontramos hoje, em que as empresas cometem crimes e saem impunes”, disse em entrevista à ATI.

Este ano de 2022 também é marcante porque a Campanha Global para Desmantelar o Poder Corporativo, Reivindicar a Soberania dos Povos e Pôr fim à Impunidade, uma coalizão com mais de 200 organizações, movimentos e comunidades atingidas de todo o mundo, comemora 10 anos. Por meio deste espaço, do qual integra a Amigos da Terra, os participantes incidem de forma organizada e forte nas negociações do Tratado Vinculante, mas também aprofundam a solidariedade, o apoio entre as diferentes lutas contra as transnacionais e a construção do direito internacional a partir de baixo.

A Campanha Global lançou material em que explica a importância do Tratado Vinculante, que pode vir a ser um marco em âmbito do direito internacional para que, pela primeira vez, se tenha uma regulação em matéria de direitos humanos e de empresas transnacionais, e traz as questões-chave que as organizações e comunidades defendem que o tratado contenha.

Clique na imagem abaixo para acessar a cartilha da Campanha Global:

 

BRASIL: ORGANIZAÇÕES DENUNCIAM CRIMES DAS TRANSNACIONAIS NA AMAZÔNIA E A RELAÇÃO DO SETOR DA MINERAÇÃO COM GOVERNO BOLSONARO

Em 2021, na 7ª Sessão de Negociações, o MAB, o HOMA e a ATBr levaram denúncias que ressaltaram a importância de marcos jurídicos e da luta das organizações e movimentos sociais por reparações justas. Foi destacada a situação dos atingidos e das atingidas pelo rompimento das barragens com lama tóxica de rejeitos de mineração nas cidades de Mariana (em 2015) e de Brumadinho (2019), em Minas Gerais, que matou mais de 300 pessoas, destruiu as comunidades, afetou a fauna e a flora da região e intoxicou rios. Passados 7 anos do primeiro crime, cometido pela empresa VALE, as famílias não foram sequer indenizadas, enquanto que as empresas não pararam suas atividades e obtiveram lucros recordes.

Para esta 8ª Sessão de Negociações do grupo de trabalho da ONU, as organizações brasileiras denunciam a atuação das empresas transnacionais nas mudanças climáticas na Amazônia e o avanço do setor da mineração sobre territórios e comunidades tradicionais, a fim de expandir esta prática predatória, tendo como suporte a flexibilização de leis ambientais e a “vista grossa” do Governo Bolsonaro em relação a crimes ambientais e contra os direitos das populações.

Os movimentos brasileiros também irão pautar a proposta de Lei Marco Brasileira sobre Direitos Humanos e Empresas (PL 572/22), como uma proposição que deve ser complementar ao Tratado Internacional e que também é uma resposta às propostas de Devida Diligência que estão aterrissando desde a Europa na América Latina, considerada por muitas organizações do Sul Global como insuficiente em termos de diretrizes para a agenda. O PL 572/22, se aprovado, será a primeira proposta nacional contendo obrigações diretas para as empresas, entendendo-as como violadoras de direitos e, portanto, obrigadas a prevenir e reparar tais crimes. Além do mais, o PL garante a participação das comunidades atingidas como protagonistas em todo esse processo de prevenção e reparação.

Esses dois temas estão retratados nas cartilhas que HOMA e a ATBr lançam nesta semana da 8ª Sessão de Negociações do Tratado Vinculante, em que participam na ONU.

 

Clique nas imagens abaixo para acessar os materiais:

                

 

Vídeo da coordenadora Letícia Paranhos sobre o que esperar da 8ª Sessão de Negociações do Tratado Vinculante na ONU:

Roda de conversa com movimentos sociais e candidaturas do RS pauta reabertura das negociações do Acordo Mercosul-UE

Nesta quarta (28),  às 19h, aconteceu a roda de conversa “Riscos às estratégias populares de combate à fome, defesa dos serviços públicos e cuidado dos territórios”. O encontro foi presencial na sede do Sintrajufe/RS, em Porto Alegre (RS) e teve transmissão ao vivo pelo Facebook da Amigos da Terra Brasil e Ong Fase. 

A atividade integrou o Curso Regional Sul e Sudeste da Frente Brasileira contra os Acordos Mercosul – União Europeia/EFTA, e foi coorganizado por uma articulação de instituições que integram a Frente: Amigos da Terra Brasil, FASE-RJ, REBRIP e CONTRAF.  Estiveram presentes ainda companheiras e representantes do Jubileu Sul, Conaq, Movimento Atingidos por Barragens (MAB), produtoras e produtores de assentamentos como o de Nova Santa Rita, advogados populares, Marcha Mundial das Mulheres, MTST e Aliança Feminismo Popular. 

A Roda de Conversa teve como proposta dialogar com candidaturas do Rio Grande do Sul sobre os acordos. Na ocasião, organizações e movimentos sociais membros da Frente requisitaram compromisso de que o Acordo UE-Mercosul seja debatido com a sociedade como prioridade na agenda política do próximo governo. Reivindicaram também que haja consulta com os povos e populações atingidas para elaboração da política externa brasileira.

O encontro ocorreu em um momento estratégico, pré-eleições, em que é fundamental dialogar com candidaturas e firmar compromissos para o próximo período. No momento de diálogo com as candidaturas no RS foi tratado o aprofundamento de análises e de posicionamentos sobre as tendências relacionadas à possível reabertura das negociações do Acordo em 2023.

Caroline Rodrigues, da FASE-RJ e da Frente Importação, liberação e deriva de Agrotóxicos como armas de guerra: resistências e articulação de contra-propostas | Foto: Jonatan ATBr

Também foi debatida a arquitetura da impunidade e a aprovação do PL 572/2022, sobre empresas e direitos humanos,  ferramenta construída nas lutas. Dentro de um cenário de assimetria de poder entre comunidades atingidas por corporações e corporações, que saem ilesas de processos extremamente violentos às quais condicionam os territórios, a PL é uma ferramenta de resistência e garantia dos direitos humanos e dos povos. Seja desde a prevenção até a reparação dos danos.  Além dela, mobilização popular é fundamental. 

No encontro entre movimentos sociais e parlamentares foram ainda debatidos os  impactos dos acordos na vida cotidiana da população. Foram pautadas situações práticas nos territórios em luta, com exemplos latentes como a privatização da água no Rio de Janeiro, medida que mercantiliza um bem comum limitando o seu acesso em um país em que uma parcela considerável da população não tem direito básico a saneamento.  Ou o impacto de grandes projetos, como no caso Fraport, em que para expandir um aeroporto para Copa do Mundo, em Porto Alegre, a Vila Nazaré,  comunidade com mais de 60 anos de história, foi extinta do mapa urbano.  Outro caso apresentado foram as lutas no Rio Grande do Sul, como nos assentamentos de Nova Santa Rita, que em levante contra políticas de expansão do agronegócio e de liberação de agrotóxicos, que colocam em risco os meios de vida e de produção de produtoras e produtores de alimentos sem veneno, pautam outro horizonte político. Na luta os produtores que denunciam a pulverização aérea de agrotóxicos, que afeta suas lavouras, resistem e se levantam contra políticas de morte, reavivando um projeto político que coloca a vida no centro. 

Candidata a deputada federal pelo PSOL, Claudia Ávila e candidato a deputado estadual pelo PSOL, Matheus Gomes | Fotos: Jonatan ATBr

|Foto: Jonatan ATBr

A partir de relatos dos territórios em luta, o debate trouxe a conexão entre Acordos Internacionais e incidência desses na realidade cotidiana das  pessoas, expondo ainda demandas para resistir e construir soberania popular. Os desafios dos próximos anos, que passam  tanto pelas lutas da política institucional quanto da luta dos povos e movimentos, numa construção coletiva que pauta soberania, foram expostos. Tanto medidas como Dossiê de denúncia a Ricardo Salles e  que aponta o desmonte de legislação ambiental no Brasil, até construção de alternativas de coligação de forças, com perspectivas anticoloniais e antirracistas entraram na conversa.

O aprofundamento do capitalismo, via neoliberalização e avanço da iniciativa privada, impacta negativamente os biomas, sabedorias ancestrais e formas de organização social. E com acordos que fomentam o avanço da multinacionais e megacorporações na América Latina, como é o caso do Acordo Mercosul-UE, se intensificam lógicas como a das privatizações, desestatizações e incidência de maior militarização da vida e armas de guerra, como é o caso da liberação de agrotóxicos, expansão da mineração e do agronegócio e mercantilização e financeirização da vida, que resultam em mais ruptura no metabolismo ecológico sob emergência climática.

 Na esteira da neoliberalização, com políticas de estado que se traduzem nas violações de políticas econômicas, com privatizações e concessões, é imprescindível assumir compromissos para a conjuntura que se abre a partir da eleição de domingo, dia 02. Tendo isso em vista, a Frente Brasileira Contra os Acordos Mercosul-UE e Mercosul – EFTA entregou carta compromisso para as candidaturas, visando a necessidade de participação social e controle social da política externa. Medidas que se contrapõe a uma ofensiva do acordo,  que intensifica a precarização da vida e das relações de trabalho, o avanço da mercantilização dos bens comuns e o aumento exponencial da violência e dependência econômica dos países da América Latina na relação política geoglobal.  

 Confira como foi o evento na íntegra acessando a nossa transmissão online: 

Campanha contra a privatização do Parque Estadual do Turvo (RS): o parque é nosso, é bem comum!

O Parque Estadual do Turvo, localizado na região noroeste do Rio Grande do Sul, está ameaçado mais uma vez pelo avanço da financeirização da natureza e da mercantilização da vida. Alvo de ataques permanentes do Governo do Estado, do Governo Federal e de empresas e corporações internacionais e nacionais, agora ele corre risco de ser privatizado nos próximos dias. Seu leilão está agendado para o dia 31 de agosto, com outorga mínima de R$ 71.900. A natureza tem valor em si, não em ser transformada em mercadoria pela iniciativa privada, que solidifica desigualdades socioterritoriais e traz políticas de morte para os povos, comunidades e ecossistemas.


Leia mais:
Matéria especial da Amigos da Terra Brasil sobre o processo de privatização de parques estaduais e urbanos: bit.ly/BrasilAVenda

Cartilha das organizações FASE e Terra de Direitos, em parceria com o Grupo Carta de Belém (GCB), expõe os problemas do Programa Adote um Parque do governo federal. Acesse em
https://www.cartadebelem.org.br/wp-content/uploads/2021/09/Adote-um-Parque-vers%C3%A3o-Web.pdf

Com uma biodiversidade única, o Parque do Turvo concentra um dos maiores fragmentos da Floresta Estacional decidual do Rio Grande do Sul. Onde farfalham folhas de árvores de cedro, grápia, canjerana e louro que alcançam até 30 metros de altura. O parque é considerado a Unidade de Conservação (UC) que abriga a maior parte das espécies ameaçadas de extinção do estado, tanto da flora quanto da fauna. São pelo menos 95 espécies, sendo 50 vegetais e 45 animais, como a onça-pintada, o puma, a anta, o pica-pau-rei, a jacutinga e o uru. Em sua área correm águas pelo Salto do Yucumã, na tradução da língua tupi-guarani o “Grande Roncador”, uma das maiores quedas longitudinais do planeta. Com 1.800 metros de extensão e quedas d’água de até 12 metros, elas seguem o curso do Rio Uruguai, na divisa entre o Brasil e a Argentina. 

Salto do Yacumã, no Parque Estadual do Turvo | Fonte: MAB

O projeto de concessão do Parque do Turvo afetará de forma irreparável as comunidades locais e a toda a população gaúcha. Privatizado, ele deixará de servir à pesquisa, ao monitoramento da região e de toda questão do rio, para passar ao controle privado, que limita o seu acesso. Só quem tem dinheiro poderá acessar o parque, pagando entrada.  A Amigos da Terra apoia a Campanha Contra a Privatização do Parque Estadual do Turvo (RS)! Somamos com o Movimento de Atingidos por Barragens (MAB) e demais entidades ambientalistas e comunidades locais na defesa do Turvo. 

Da esquerda para a direita: Lúcia Ortiz e Letícia Paranhos (ATBr) e Soniamara Maranhão (MAB)

Somos contra a sua privatização e defendemos que ele permaneça como patrimônio do povo gaúcho e bem comum. Não como propriedade privada para a geração de lucro de empresas por meio da exploração e financeirização da natureza, que dilacera o território para gerar capital para poucos, enquanto muitos sofrem os impactos desse tipo de iniciativa, tendo a convivência com ampla biodiversidade rompida. Acreditamos que parte desse plano de privatização está dentro de uma  iniciativa maior de privatização dos parques, e que é um passo na construção de ambiente propício para que barragens, entre elas a de Panambi/ Garabi, sejam implementadas na região. É o anúncio de um desastre. 

A privatização do parque faz parte do plano nefasto de privatizações do governo de Eduardo Leite, que vendeu a CEEE Distribuidora por R$ 100 mil e a Companhia Estadual de Energia Elétrica Geração (CEEE-G) por R$ 928 milhões, preços irrisórios perto do valor da energia na vida da população, que deveria ter livre acesso a essa como bem comum. Mesmo dentro dessa lógica mercantilista, se considerado o patrimônio dessas empresas, é evidente que os valores são irrisórios. Além disso, o  projeto de concessão do Parque Estadual do Turvo é marcado por parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que atua de forma irresponsável no país. 

Em outubro de 2021, uma série de questionamentos apresentados por pesquisadores contestaram a privatização devido aos impactos que geraria. Nunca houveram respostas do governo estadual a respeito, mais especificamente das secretarias de Planejamento Gestão e Governança (SPGG) e de Meio Ambiente e Infraestrutura (SEMA), além da Coordenação de Meio Ambiente do Ministério Público do Estadual (MPE). O fato é um dos motivos que fez com que o Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá) solicitasse a impugnação do edital de concessão do Parque Estadual do Turvo à iniciativa privada. O pedido foi entregue na sexta-feira passada (19/08). Afirmando que os documentos do plano de concessão do parque contêm “diversas e profundas inconsistências”, o InGá também sustenta que estes se contrapõem ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação, ao Sistema Estadual de Unidades de Conservação, ao Plano de Manejo do parque e a própria Constituição Federal.

Parte de um projeto político de governo que enfraquece o senso comunitário e que intencionalmente corrói a noção de responsabilidade do estado, está a passagem da privatização. Em um plano de precarização intencional para mobilizar a opinião pública a favor das concessões, o governo do estado não cumpriu com as suas responsabilidades, não investiu nos parques e em infraestrutura, o que esbarra na inviabilização de institutos de preservação e de pesquisas sérias sobre os territórios. Visando entregar tudo à iniciativa privada, ele mesmo constrói um discurso que mobiliza a população a pensar que o estado não é capaz de cumprir com deveres e garantir direitos. Que só a iniciativa privada pode trazer melhorias para a população. Sabemos que não é assim! 

Pela garantia da biodiversidade, das vidas em suas águas que correm, árvores que crescem e pessoas que lutam, nos posicionamos contra a privatização! O Parque Estadual do Turvo não é mercadoria, é bem comum!

A luta segue! Poste fotos com cartazes ou placas contra a privatização em suas redes, se articule com as lutas em sua região, paute o debate e some com a gente nessa luta. A preservação do Turvo e dos ecossistemas é a preservação de nossas vidas!  

#OParqueÉNosso

#NãoàPrivatizaçãoDoParqueEstadualDoTurvo

Confira a entrevista concedida por Fernando Campos Costa, da Amigos da Terra Brasil, sobre o processo de privatização do Parque Estadual do Turvo por parte do governo do estado do Rio Grande do Sul e governo federal e as consequências para o povo gaúcho e a natureza:

1 ano do assassinato da companheira Dilma: Violação dos direitos povos e a privatização do rio Tocantins

Dilma Ferreira deixou um legado inspirador de perseverança na luta em defesa de seus direitos. Lutou até o último dia de sua vida em defesa de seu território e contra o avanço explorador das empresas transnacionais sobre a Amazônia e seus povos. Em 22 de março de 2019, quando é celebrado o dia internacional da água, a maranhense de 48 anos e coordenadora regional do Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB) em Tucuruí (PA), Dilma, foi brutalmente assassinada. Junto a ela, foram executados também o seu companheiro, Claudionor Costa da Silva, e o vizinho do casal, Milton Lopes.

Coordenadora regional do Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB) em Tucuruí (PA), Dilma Ferreira (Foto: MAB)

A violência empregada contra a liderança que era Dilma não vem à toa. Eles são assassinados em um contexto de um Brasil pós golpe de Estado de 2016, que intensificou a agenda neoliberal na economia e a sanha de avançar com grandes projetos na região amazônica. A conjuntura se aprofunda em 2019 com o início da gestão de um governo abertamente fascista liderado por um ex-militar saudoso do período ditatorial mais sangrento da história recente do país.

Quatro dias após o assassinato de Dilma, a Polícia Civil do Pará prendeu o fazendeiro Fernando Ferreira Rosa Filho, conhecido como Fernando Shalom, identificado como mandante do assassinato de Dilma. As buscas foram intensificadas depois que três corpos carbonizados foram encontrados a 20 km do local do triplo homicídio. O fazendeiro tornou-se suspeito de ter assassinado as 6 pessoas.

Dilma era atingida pela construção da barragem de Tucuruí. Na coordenação do MAB no Pará, foi protagonista no debate de mulheres atingidas por barragens no Brasil. Dilma Ferreira é a imagem da mulher atingida que foi reconstituída como sujeito de luta em uma região devastada por um grande empreendimento. Ela estabeleceu um marco na resistência histórica em uma região que não foi devidamente reparada em relação aos impactos da construção da barragem de Tucuruí no rio Tocantins.

A região ainda experincia os efeitos históricos da construção da barragem de Tucuruí. Inúmeras comunidades não foram reparadas devido aos impactos da privação do rio Tocantins. O projeto realizado durante o governo militar durou de 1978 até 1980 e expulsou mais de 32 mil pessoas de suas casas. Muitas famílias ainda vivem próximo, desta que é uma das maiores barragens do país, sem acesso a energia elétrica em suas casa e quando a tem pagam uma das tarifas mais caras do país. 

De acordo com a Plataforma Operária e Camponesa para Energia, as contas de luz aumentaram mais de 80% nos últimos dez anos e podem aumentar no mínimo 20% em menos de um ano, caso o plano do governo federal de privatizar a Eletrobrás se concretize. Até hoje, a concessão da barragem é de propriedade estatal. No entanto, há uma forte pressão para que a barragem seja privatizada.

Historicamente, a luta dos afetados por Tucuruí tem sido por reconhecimento e Dilma se colocou nessa frente: “Uma mulher consciente não passa despercebida. E no contexto da Amazônia, todos os que lutam e em processo de resistência acabam sendo perseguidos”, define Cleidiane, da Coordenação Nacional do MAB no Pará. Ela pontua que até hoje as pessoas continuam sendo violadas: “os municípios afetados por Tucuruí têm os mais baixos Índices de Desenvolvimento Humano do Brasil e toda a riqueza gerada não é investida em educação, saúde e melhoria da qualidade de vida, muito menos em infraestrutura para a região”.

No Brasil, construir barragem é sinônimo de violação de direitos humanos. Em 2010, a Secretaria Especial de Direitos Humanos, órgão ligado à Presidência da República, em um Relatório Nacional, comprovou que há um padrão de violação de direitos em obras de barragens no país. Com foco nisso, o MAB vem pautando a Política Nacional dos Atingidos por Barragens (PNAB), resultado de uma longa luta dos atingidos por barragens, que há décadas denunciam as violações e buscam construir um marco legal que possa garantir direitos às vítimas de barragens. O objetivo principal da PNAB é criar uma base legal para populações atingidas por barragens que prevê a definição do conceito de atingido, formas de reparação e a criação de instituições para a organização dos trabalhos.

Para o MAB, define-se população atingida aqueles que sofrem os impactos provocados pela construção, operação ou rompimento de barragens quando há perda da propriedade ou posse de imóvel; desvalorização de imóveis em decorrência de sua localização próxima ou em nível abaixo dessas estruturas; perda da capacidade produtiva das terras e de elementos naturais da paisagem geradores de renda; e perda do produto ou de áreas de exercício da atividade pesqueira ou de manejo de recursos naturais.

Outro elemento que tem intensificado a violação dos direitos na região é a privatização do rio Tocantins sob a forma da construção de hidrovias. Com a barragem de Tucuruí é possível ter maior controle do rio, o que potencializa os interesses para a construção de hidrovias com a finalidade de transportar até os portos as agrocommodities produzidos na região para exportação. A dragagem, necessária para a construção das hidrovias, assim como o fluxo de embarcações carregados de grãos causará impactos na vida das comunidades que vivem com o rio Tocantins: morte dos peixes, assoreamento dos rios, entre outros reflexos.

Os atingidos por barragens não têm suas condições de melhoria de vida asseguradas no processo de construção das barragens, e acabam se tornando uma população extremamente vulnerável. Soma-se a isso o verdadeiro estado de exceção vigente no Brasil e, em especial, na Amazônia brasileira. Na região em que a Dilma vivia, assim como em grande parte da Amazônia, há um contexto similar: a disputa pela ocupação da terra, conflito entre pequeno agricultores e comunidades tradicionais com os grandes fazendeiros (gado e agrocommodities) e grandes empreendimentos.

O que aconteceu com Dilma é resultado da política sistemática de extermínio dos defensores dos territórios e os direitos dos povos que vem sendo executada no Brasil. As ações são carregadas de injustiça e impunidade contra as/os lutadoras/res. Empresários e acionistas internacionais com o apoio do Estado estão dispostos a exterminar os seres humanos e o patrimônio ambiental para garantir o lucro dentro do modelo de acumulação e desapropriação. Com a ascensão do neoliberalismo sob os territórios se intensifica a luta e resistência em defesa da vida e dos direitos. Consequentemente, a perseguição a todas e todos que se levantam contra esta lógica de extermínio. Todo esse contexto de lucro global, resulta em violências locais, muitas vezes, sanguinárias como o assassinato de Dilma.

Na foto, a ex-presidente Dilma Rousseff ao lado de Dilma Ferreira da Silva em audiência no Palácio do Planalto, em 2011 (Foto: Leandro Silva/MAB)

Nós somos as verdadeiras Marias, guerreiras, lutadoras que estão aí no desafio da luta do dia a dia”, disse Dilma Ferreira às mulheres atingidas na ocasião do encontro nacional de 2011 do MAB. Ela deixa um legado da luta da mulher amazônica, que resistiu até o fim de sua vida, que seguiu lutando para garantir os direitos dos povos. Independentemente do tamanho do inimigo, ousou continuar a luta. Mulher aguerrida, Dilma era também mãe, deixou uma filha de 24 anos. 

Por Dilma, por sua luta, continuamos lutando!

Águas para vida, não para morte!

Para celebrar a memória da vida e da luta de Dilma, conversamos com Soniamara Maranho, Tchenna Maso e Cleidiane Vieira, companheiras da Coordenação Nacional da Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), sobre a situação dos defensores dos direitos dos povos no Brasil e o contexto atual na região de Tucuruí. Ouça aqui.

O que aprendemos com Brumadinho?

Um ano após o crime da Vale em Brumadinho, a vida das atingidas e dos atingidos é cercada pela poluição da água do rio Paraopeba com a lama tóxica. São muitos os reflexos: crescimento de casos de doenças — de pele e problemas gastrointestinais, sobretudo com relação a saúde mental; desemprego e perdas econômicas nas cidades dependentes do rio; falta de informação e assessoria técnica independente; descasos com as vítimas (dentre elas, 11 ainda desaparecidas) e seus familiares; além de cortes no auxílio emergencial pago pela Vale.

Enquanto isso, a empresa segue impune. A Vale obteve R$7 bilhões de lucro em 2019 e, como se não bastasse, ainda recuperou o valor de mercado que tinha antes do rompimento da barragem, chegando à R$ 301 bilhões. O que representa R$ 5 bilhões a mais em relação ao que possuía antes do crime ambiental.

No dia 25 de janeiro de 2020, completou um ano de um dos maiores crimes ambientais do Brasil. A barragem de rejeito de mineração da empresa Vale, localizada na comunidade Córrego do Feijão no município de Brumadinho-MG, rompe deixando 272 vítimas. A lama de rejeitos percorreu mais de 300 quilômetros do rio Paraopeba.

Para marcar o um ano do crime da Vale, um ano de impunidade, um ano de luta e resistência, atingidos e atingidas marcharam em defesa dos seus direitos e de suas vidas. A Marcha dos e das Atingidos e Atingidas iniciou no dia 20 de janeiro em Belo Horizonte. Seguiu pelo município de Pompéu, no interior do estado, e chegou até a região metropolitana de Belo Horizonte, passando por Juatuba, Citrolândia, São Joaquim de Bicas, Betim, percorrendo o caminho inverso a trajetória de destruição deixada pela lama, até chegar ao Córrego do Feijão no dia 25 de janeiro.

A caravana, que durou seis dias, contou com mais de 350 marchantes. Entre os presentes estiveram atingidas e atingidos da bacias do Rio Paraopeba e Rio Doce, militantes do Movimento dos Atingidos por Barragens e demais movimentos, organizações e entidades aliadas de todo o Brasil e ainda de 17 países. 

O objetivo da Marcha é marcar o primeiro ano do crime da Vale em Brumadinho e expor a atual situação em que estão as comunidades em relação a lama tóxica. Tem ainda como ação sinalizar a luta e a resistência dos atingidos e atingidas, denunciar a impunidade das empresas transnacionais Vale, Samarco e BHP Billiton após os crimes em Mariana e Brumadinho (que em em 4 anos deixou mais de 300 vítimas), além de reivindicar a mudança no modelo exploratório da mineração no país.

Foto: Movimento dos Atingidos por Barragens

Justiça para quem?

Foi em frente à sede do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e na Agência Nacional de Mineração (ANM), no dia 20 de janeiro, que os marchantes denunciaram a omissão destes órgãos públicos em fazer justiça aos atingidos pelos crimes da mineradora e a impunidade da empresa frente aos crimes cometidos.  No estado, existem 840 barragens e, dentre elas, pelo menos 83 têm alto risco de rompimento, assim como ocorreu em Brumadinho. Além disso, segundo o Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), em 2019 cerca de 108 mil pessoas foram reconhecidas como “afetadas” por Brumadinho e receberam “Auxílio Emergencial”, que consiste no pagamento, pela Vale, de um salário mínimo para adultos, meio salário mínimo para adolescentes e um salário mínimo para crianças por um ano. Entretanto, esses valores monetários são insuficientes para reparar o dano causado na vida dos atingidos. 

O próprio conceito de atingido usado pela empresa Vale não contempla todas as pessoas que tiveram sua vida afetada após o rompimento da barragem, como é o caso de Alexandro Magela de Oliveira, 37 anos, morador do Assentamento Queima Fogo. Não apenas as pessoas de Brumadinho foram atingidas, inúmeras comunidades da bacia do Rio Paraopeba tiveram suas casas e suas atividades econômicas prejudicadas senão completamente destruídas pelas lama. A empresa tem usado como estratégia a individualização do processo, isolando as pessoas atingidas e fazendo acordos individuais, para ter mais poder e desmobilizar a ação coletiva.

O MAB solicitou que esse auxílio de emergência fosse estendido até que fosse alcançado um “reparo abrangente” e que as comunidades impactadas fossem envolvidas no processo de definição dos critérios para receber o Auxílio Emergencial: “Questionamos o papel dessa justiça que escuta muito mais os criminosos do que as vítimas. Não pararemos até que haja um reparo completo. As pessoas precisam de ajuda de emergência para comprar comida; eles estão passando fome porque perderam seus empregos no campo e como pescadores artesanais”, defende Joceli Andrioli, membro da Coordenação Nacional do MAB, em entrevista à  Rádio Mundo Real. 

Eles reivindicam também uma Política Estadual dos Atingidos por Barragens (PEAB) que assegure assistência às pessoas ou populações afetadas por impactos decorrentes da construção, instalação, ampliação ou operação de barragens e outros empreendimentos e que principalmente garanta a responsabilização das empresas frente aos impactos causados. Se mostra essencial uma Política Estadual dos Atingidos por Barragens para trazer a definição do conceito de atingidos por barragens, listar seus direitos, determinar as formas de reparação, os mecanismos de financiamento, prevendo a participação da população em todos os processos.

Perda de Vidas: a contaminação do Rio Paraopeba
Após ao rompimento da barragem e a lama tóxica se espalhar pelo Rio Paraopeba, o número de casos de doenças tem aumentado. São doenças de pele, diarreia, coceira, manchas na pele, alcoolismo, insônia, depressão. A marcha, ao passar por municípios de Pompéu e Juatuba mps dias 21 e 22 de outubro, os atingidos e atingidas relataram que em toda a bacia do Rio Paraopeba o consumo de remédios controlados, o número de tentativas de suicídio e aborto espontâneos cresceram. Muitas vezes, o adoecimento não é imediato.

Neste um ano houve aumento nas doenças mentais da população. A perda de esperança e o medo constante estão acabando com o projeto de vida de muitas pessoas. Isso também se deve à perda das atividades econômicas tradicionais como a agricultura, a pesca e o turismo que dependia do Rio Paraopeba. “As pessoas perderam muito. A água do rio é marrom, às vezes, você vê peixes… mortos. A tristeza é grande. Sinto esperança de ver o rio que vi em algum momento, de nadar livremente, de pescar, para as meninas brincarem, mas neste momento nossa vida cotidiana é muito difícil”, disse Erliete Rocha de Campos à Rádio Mundo Real. 

Atualmente, a água consumida através das torneira, oferecido pela empresa COPASA, gera insegurança à população. As pessoas estão consumindo a água sem saber se está potável ou, em muitos casos, precisam comprar água para consumo. Muitas pessoas estão vivendo na beira do rio, mas sem água. Um dos principais medos da população é o contato e o consumo de metais pesados presentes na água e no lençol freático, e o quanto poderá contaminar a agricultura. Outra incerteza é o que a presença destes metais pesados e a combinação deles irá causar ou reagir nos corpos.

A ONG SOS Mata Atlântica acaba de lançar um estudo sobre a qualidade da água do Rio Paraopeba, reafirmando que está “sem condições de uso”.  A Organização destaca que o período das chuvas muda o cenário, já que leva os rejeitos para o Baixo Paraopeba, ao Reservatório de Retiro Baixo, ou seja, aumenta as chances de que a contaminação chegue ao Rio São Francisco.

Uma das principais reivindicações da população atingida é a contratação das Assessorias Técnicas Independentes, para a garantia de consultoria e acompanhamento não tendencioso, de modo que sejam organizados diagnósticos e possibilidades de soluções para as demandas das regiões – construindo de modo participativo todos os passos necessários para a luta por reparação integral. O Ministério Público de Minas Gerais orienta a solicitação de revisão do Plano Municipal de Saúde de cada município atingido pela lama, para que os Planos Municipais contemplem a saúde dos atingidos por barragens. A lama matou o rio, matou tudo o que vivia no rio, matou a água que dava vida à alimentação e subsistência das famílias. A lama matou a vida e a memória das pessoas.

 

“Águas para vida, não para a morte!” | Foto: Movimento dos Atingidos por Barragens

 

A impunidade inabalável
Mesmo tendo provas de que a Vale sabia que a barragem tinha riscos de romper e contabilizou em seu orçamento as possíveis mortes e mesmo assim a empresa segue sem ser responsabilizada pelos crimes. O  Seminário Internacional “Um ano do crime da Vale em Brumadinho”, realizado em Betim no dia 24 de janeiro, teve mais de 500 pessoas, de todo o Brasil e de 17 países. O Seminário destacou a importância de responsabilizar as empresas para que crimes como o cometido pela Vale pare de acontecer. 

Juan Pablo, do Movimiento Rios Vivos (Colômbia) e do Movimiento de Atingidos por Represas (MAR) fala sobre o modelo energético que viola direito na América Latina.

O modelo minero-energético adotado pela Vale e pelas empresas transnacionais se beneficia de uma “arquitetura da impunidade”. No qual a impunidade é mantida graças ao sistema hegemônico capitalista-neoliberal que atua enfraquecendo os Estados e dando poder a cada vez um número mais reduzido de atores empresariais e instituições financeiras. Para isso é preciso cooptar a democracia e moldar o sistema judiciário com base em interesses privados. Por um lado, não existe no direito internacional um marco legal para regular empresas transnacionais, muito menos um mecanismo ou corte para julgar crimes corporativos.

O sistema faz uso de diferentes maquiagens para seguir atuando de maneira impune, é comum enxergar no discurso das empresas e nas suas agendas comerciais uma aparente perspectiva “sustentável” – com visões tecnicistas e individualistas colocando territórios e saberes populares à serviço do capital e gerando acumulação primitiva através de mecanismos de financeirização da natureza. e, até mesmo de classe – usualmente mencionam normas da Organização Internacional do Trabalho, mas não asseguram nenhum mecanismo que obrigue o cumprimento de leis trabalhistas. Essas e outras maquiagens enganam a população sobre as reais consequências da instalação de empresas ou das parcerias público-privadas.

As promessas de crescimento econômico como resultado da implantação de empresas transnacionais devem ser desmentidas e as injustiças que sustentam essa arquitetura visibilizadas. Um exemplo é a Fundação Renova, criada pela Vale e pela BHP para indenizar as famílias impactadas pelas lama, mas na realidade tem implantado a indústria das indenizações, usando diferentes formas de cooptar entidades e empresas para agir em torno de controlar os territórios e não resolver a situação dos atingidos. 

A Amigos da Terra Internacional, juntamente com outros movimentos incluindo o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) faz parte da Campanha Global para Reclamar a Soberania dos Povos Desmantelar o Poder das Transnacionais e Por Fim à Impunidade que, dentre outros processos, acompanha e incide no Grupo de Trabalho Intergovernamental das Nações Unidas sobre corporações transnacionais e outras empresas comerciais com respeito aos direitos humanos. Tchenna Maso, do MAB, fala sobre como os crimes da Vale estão se tornando um padrão das empresas transnacionais e ressalta a importância de internacionalizar a luta por garantia de direitos:

O que ocorreu em Brumadinho alerta o que pode ocorrer em outros lugares. No Rio Grande do Sul, projeto de mineração no sul do estado, entre Lavras do Sul e Dom Pedrito, projeto prevê construção de barragem duas vezes maior que a de Brumadinho (MG). Em caso de ruptura, rejeitos atingiriam Rosário do Sul, Praia de Areias Brancas, e poderiam chegar até o Uruguai. Atualmente, o Rio Grande do Sul surge como a nova fronteira minerária do Brasil: são mais de 5 mil requerimentos para pesquisa mineral em solo gaúcho. Caso avancem os projetos, o estado se tornaria o terceiro maior minerador do país. 

No estado gaúcho há mais de 800 barragens. Atualmente ocorre o desmonte das políticas públicas para os atingidos por barragens. Em 2019, com o governo do Eduardo Leite, dois decretos que regulamentavam os direitos das populações atingidas por barragens no estado foram revogados. O Decreto nº 51.595, de 23 de junho de 2014, que instituía a Política de Desenvolvimento de Regiões Afetadas por Empreendimentos Hidrelétricos – PDRAEH, e a Política Estadual dos Atingidos por Empreendimentos Hidrelétricos no Estado do Rio Grande do Sul – PEAEH previa uma série de itens relacionado aos direitos que possuem os atingidos por barragens, buscando assim diminuir as violações e impactos causados pelos grandes empreendimentos hidrelétricos. 

Brumadinho ensina dos riscos, das consequências que a mineração traz aos territórios. Para as empresas, o lucro está acima da vida! A Campanha Global para Reclamar a Soberania dos Povos Desmantelar o Poder das Transnacionais e Por Fim à Impunidade visa assegurar que estes crimes não ocorram e que as empresas sejam responsabilizadas.

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Foto: Movimento dos Atingidos por Barragens

1 ano de dor. 1 ano de luta!
272 pessoas tiveram suas vidas ceifadas em prol do lucro de uma empresa. A tragédia anunciada em Mariana, se repetiu em Brumadinho. Pela mesma empresa: a Vale. O dia 25 de janeiro de 2020 foi de muita dor. Foi o dia de relembrar o pânico e sofrimento que deste dia por diante transformou a vida de inúmeras famílias e comunidades. O dia que faz repensar sobre o poder das corporações, faz refletir sobre o modelo energético insustentável e inviável, sobre as injustiças sociais e ecológicas em prol do lucro das empresas. 

Nenhuma  morte foi acidente. Existe um responsável: a Vale. 

No 25 de janeiro foi quando a  marcha chegou na Comunidade Córrego do Feijão para prestar solidariedade às vítimas, aos familiares, à comunidades. É possível perceber os traços da destruição na comunidade: muitas pessoas foram embora, muitas casas a venda (na maioria sendo comprada pela Vale), dificuldades de acesso água a água. A empresa compra as casa como estratégia para ter controle sobre a região e apagar a memória do crime cometido. Além disso, em áreas em que é possível visualizar a destruição deixada pela lama tóxica, a empresa colocou escudos para que a população não veja, bem como, onde ficou lama, plantou grama.

Seguir depois de tamanha extermínio não é fácil. É preciso transformar toda dor e sofrimento em energia para seguir lutando, para que isso não se repita mais! É só através da autonomia dos povos e comunidades que será possível transformar o atual modelo energético para uma transição justa e popular.

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Após trancamento da ferrovia no dia 23 de janeiro, empresas acatam reivindicação para suspender atividades no dia em que o crime em Brumadinho completa um ano e atingidos conquistam paralisação do trem da Vale no dia 25 de janeiro. Fotos: Movimento dos Atingidos por Barragens

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