Torres do Inter: especulação imobiliária avança na Orla da cidade de Porto Alegre/RS

Movimentos sociais, quilombolas, grupos de torcedores e torcidas organizadas do Inter, contrários ao projeto que institui duas torres gigantes no terreno do Estádio Beira Rio, realizaram reunião em 28 de dezembro de 2020 para pensar estratégias de resistências. Foto: Isabelle Rieger / Amigos da Terra Brasil

“As pessoas são expulsas do Quilombo Lemos, localizado próximo ao terreno do Beira Rio, na mesma movimentação da expulsão das pessoas da Ilhota para a Restinga nos anos 60, para fins do ‘progresso’. Chega com atropelo uma contrapartida que não contempla nada na situação de quem mora no entorno.” – Liderança do Quilombo Lemos

Previsto para entrar em votação na Câmara dos Vereadores de Porto Alegre, o projeto de lei complementar 004/19, que inclui um artigo na Lei 1.651, sancionada em 1956, institui as duas maiores torres do Rio Grande do Sul no terreno do Estádio Beira-Rio, cedido pelo Governo Brizola para a construção de um espaço de esporte e lazer. Como contrapartida para usar o espaço que hoje é ocupado por quilombos, escolas de samba e população em geral, o megaempreendimento movido pela especulação imobiliária coloca a duplicação da rua José de Alencar, a restauração do Asilo Padre Cacique, a remodelação do posto de saúde Santa Marta, no centro da Capital, e a instalação de um projeto cicloviário. Nada é falado sobre o terreno de escolas de samba tradicionais que integram o Carnaval de Porto Alegre e os quilombos que compõem a região – que provavelmente serão despejados e forçados a viver em regiões mais periféricas; sobre como ficará a situação do pôr do sol e da luminosidade no bairro, do aumento do número de veículos circulando, causando congestionamento; ou sobre os impactos ambientais causados pelos edifícios gigantes.

O projeto pretende autorizar a venda do terreno que hoje é o estacionamento do estádio, em frente à estátua do Fernandão e do Portão 7, ou seja, um terreno que pertence ao complexo do Beira Rio. Movimentos sociais, quilombolas, grupos de torcedores e torcidas organizadas do Inter contrários ao projeto querem evitar que aquele terreno seja vendido para a empreiteira construir prédios de luxo para moradia e escritórios de trabalho. Ou seja, prédios altamente elitizados, quem morará? Quem vai lucrar? Por que não houve debate sincero com a torcida colorada sobre o que fazer com um pedaço do seu patrimônio? Para o povão colorado que vai ver o jogo ao redor do estádio, que tenta entrar, vai diminuir consideravelmente o espaço e a capacidade de pessoas, e sabemos como é preconceituosa, racista, machista a “segurança” da elite. Se o território for vendido, o Inter e a torcida perderão para sempre um local que podem usar – e que está sendo vendido para a iniciativa privada a preço de banana. 

Em reunião realizada em 28 de dezembro pelos movimentos contrários à instalação das torres no terreno do Internacional, foi reiterada a necessidade de não aceitar nenhuma contrapartida que não beneficiasse toda a população do entorno. Para isso, estão sendo reivindicadas a regularização fundiária dos quilombos localizados nos arredores, a realização de um estudo de impactos ambientais e a entrega legal dos terrenos das escolas de samba para estas. Sendo assim, é visível o alinhamento do poder público com a burguesia, já que privilegiam nas compensações do projeto apenas serviços para a classe média, como o alargamento de uma faixa para automóveis. Nada se é falado sobre a construção de moradias populares para de quem será tirada a casa. 

O que se vê na cidade de Porto Alegre é uma constante entrega dos espaços públicos para a iniciativa privada. Como observado neste projeto, é a alteração do regime urbanístico em detrimento do ambiente e da sociedade, garantindo ganhos milionários ao proprietário privilegiado, da indústria da construção civil e da especulação imobiliária.

Situação semelhante ocorreu com a Fazenda do Arado Velho, uma área 4 vezes o tamanho do Parque Farroupilha (Redenção), no bairro Belém Novo, no Extremo Sul de Porto Alegre, em que foram realizadas incessantes mudanças do Plano Diretor da cidade para privilegiar este e outros tantos empreendimentos imobiliários, empreiteiras e construtoras. Essa especulação imobiliária fez o Barra Shopping Sul e o Pontal do Estaleiro, faz o novo projeto do Cais Mauá. Como já é de praxe, o Estado cede o espaço para a iniciativa privada sem ver a cor do dinheiro, tudo passa para as empresas. Estima-se que, por exemplo, no caso do Beira-Rio, o terreno valha R$1 bilhão. Assim, essa privatização não é benéfica nem para a população, nem para o poder público, só para os bolsos de quem detém os direitos de posse dos empreendimentos. 

É necessário, portanto, mobilizar-se contra mais uma entrega do patrimônio porto-alegrense para a iniciativa privada. Não às torres do Inter! Não ao PLC 004/19!

Movimentos contrários à implantação das duas maiores torres do Rio Grande do Sul. Fotos: Isabelle Rieger / Amigos da Terra Brasil

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