Encerramento do Seminário Direitos Humanos e Empresas conta com o lançamento de cartilha popular sobre o PL 572/22

Material aborda a arquitetura da impunidade praticada por empresas e explica a importância do PL 572/22 na primazia dos direitos humanos sob a lógica dos negócios

A violação de direitos humanos, dos povos e da natureza é uma prática constante e estrutural das transnacionais e das empresas. Para obterem lucros, elas externalizam os custos para a realidade cotidiana das pessoas, via a exploração de seus trabalhos e territórios. Processo que se intensifica na relação geopolítica global, fazendo com que países da periferia do sistema capitalista, o sul global, lidem com a superexploração, o etnocídio, o ecocídio e o genocidio em larga escala. E nessa relação desigual, os países do centro do sistema capitalista acumulam historicamente riquezas. Do lado de cá, se contam os corpos. Sejam de entes queridos, de amigos, de companheiros de luta, sejam os corpos dos rios e das florestas. 

Os impactos socioambientais da impunidade corporativa são alarmantes. Situação que fica evidenciada por casos como o do afundamento de cinco bairros de Maceió, devido à mineração de sal-gema da Braskem. Cerca de 60mil pessoas atingidas, milhares em situação de deslocamento obrigatório. O que chamavam de lar, já não pode mais ser. Os vínculos com o território foram dilacerados pela ganância da empresa, que impôs o risco de morte como imperativo diário de quem morava na região. Há ainda os crimes da Vale, BHP e Samarco, com inúmeras violações de direitos no rompimento das barragens em Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais. Situações que traduzem a falta de responsabilização das empresas, de ação efetiva do estado, e, principalmente, a violação dos direitos das comunidades atingidas. Situação exposta também no recente caso de trabalho escravo em três vinícolas da Serra Gaúcha: Salton, Aurora e Garibaldi. 

É evidente que existe uma assimetria de poder entre pessoas e transnacionais. Enquanto grandes empresas e transnacionais seguem aumentando os lucros, ano a ano, não há uma casa sequer construída para as comunidades atingidas pelo rompimento das barragens citadas. E a violação também é da memória, agora marcada pelas imagens de um desastre minerário anunciado há muito na história do Brasil. 

Os povos atingidos têm seus direitos violados antes mesmo de projetos entrarem em seus territórios. Como é o caso da violação do direito à informação, ou à consulta livre, prévia e informada, conforme dispõe a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). E para complementar, as empresas e transnacionais que lucram com as violações de direitos, ainda se promovem com propagandas trazendo uma imagem de sustentáveis, éticas e responsáveis. 

Com a lógica de que o lucro vale mais que a vida, se articulam em redes bem estruturadas para saírem impunes: negam seu envolvimento, evitam a responsabilidade com acordos em tribunais de arbitragem internacional, manipulam pesquisas científicas, disseminam falsas informações, criminalizam e perseguem defensores dos direitos humanos e enfraquecem comunidades.

É preciso frear o poder das corporações e pautar o debate a partir dos direitos humanos e da vida. Trazendo o protagonismo de pessoas trabalhadoras, atingidas pelas violações de direitos e de minorias sociais. E é com essa premissa que o “Seminário Direitos Humanos e Empresas, o Brasil na Frente” apresentou ferramentas, acúmulos e como avançar na luta pela garantia dos direitos humanos. 

Cartilha Popular sobre o PL Nº.572/2022: uma ferramenta educativa na luta pelos direitos humanos 

Organizações civis, sindicais e movimentos sociais realizaram, de 14 a 16 de março, em Brasília, o Seminário Direitos Humanos e Empresas, o Brasil na Frente – Lei Marco no caminho global de mais regras para as empresas. Nos encontros, foi debatida a importância de regulamentar a atuação de empresas nacionais e estrangeiras no Brasil. Assim como a relevância da aprovação do PL 572/22 – Lei Marco Sobre Direitos Humanos e Empresas, projeto de lei de autoria coletiva que tramita atualmente na Câmara dos Deputados. 

A divulgação de informações sobre a realidade dos atingidos deve ser de conhecimento de toda a sociedade. Assim como a compreensão a respeito da forma com que as empresas e transnacionais se organizam para seguirem impunes. Evidenciar estes pontos é imprescindível para assegurar direitos e garantir que a vida venha antes do lucro. Tendo isso em vista, o encerramento do Seminário contou com o lançamento da “Cartilha Popular sobre o PL Nº.572/2022” , uma ferramenta para fortalecer a articulação das lutas. Apresentando os pontos centrais do projeto de lei, o material adentra a arquitetura da impunidade e propõe como é possível se engajar na construção do Projeto de Lei.


CARTILHA POPULAR PL 572

A cartilha explica como surgiu o PL 572/22, que frente a tantas desigualdades vem para criar um marco nacional sobre direitos humanos e empresas e estabelecer diretrizes para a promoção de políticas públicas no tema. O objetivo da lei é garantir a primazia dos direitos humanos sob a lógica dos negócios. Assim como proteger mais adequadamente os direitos fundamentais das comunidades atingidas, o que perpassa prever recursos que garantam os protagonismos destes grupos, superando o desequilíbrio entre os direitos das empresas e dos povos. 

São apontadas ainda porque uma lei marco nacional é necessária, o que há de inovador no PL e que outras iniciativas de normas podem fortalecê-lo, como é o caso da Política Nacional dos Atingidos por Barragem (PNAB), PL nº. 2788/2019. 

Apesar de muitos direitos estarem reconhecidos em outras leis, o texto da PL 572/22 apresenta de forma sistematizada um conjunto de ferramentas tanto para prevenir como para mudar o desfecho de violações. 

O Seminário Direitos Humanos e Empresas, o Brasil na Frente, aconteceu no prédio da CONTAG (Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares), no Núcleo Bandeirante, no Distrito Federal. A atividade foi organizada pela CUT (Central Única dos Trabalhadores), entidade ambientalista Amigas da Terra Brasil,  Fundação Friedrich Ebert (FES – Brasil), Centro de Direitos Humanos e Empresas (Homa),  Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e Oxfam Brasil.

Além das entidades promotoras, estiveram presentes no seminário o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida; a deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL/RS), uma das propositoras do PL;  a organização quilombola CONAQ; o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e CPT (Comissão Pastoral da Terra); órgãos judiciários, entre eles o MPF (Ministério Público Federal), o MPT (Ministério Público do Trabalho) e a DPU (Defensoria Pública da União); CNDH (Conselho Nacional de Direitos Humanos); a ONG Justiça Global e o veículo de comunicação Repórter Brasil, especializado em denunciar situações de trabalho análogo à escravidão. 

O seminário faz parte da “Campanha Essa Terra Tem Lei – Direitos para os Povos e Obrigações para as Empresas”. Em três dias de atividades e muita articulação das lutas, parlamentares, pesquisadores de universidades e representantes de movimentos sociais e organizações da sociedade civil elaboraram sobre a importância de responsabilizar as empresas por suas violações de direitos humanos.  Foram propostos, ainda, os próximos passos e incidências para a aprovação do PL/572/2, que é o primeiro projeto nacional de obrigações para as transnacionais para complementar o Tratado Vinculante da Organização das Nações Unidas (ONU).  

 

“Nada a ver”? Fraport deve assumir sua responsabilidade no reassentamento da Vila Nazaré!

Em reunião dos acionistas da Fraport, Stefan Schulte, diretor da empresa, mostra desconhecer realidade da Vila Nazaré, que será removida devido às obras do aeroporto Salgado Filho. A Fraport é a responsável pelas obras, mas diz não ter relação com as remoções.

“Nós da Fraport não temos nada a ver com a decisão. Fazer o realojamento das pessoas era uma das precondições da assinatura do contrato entre as autoridades e a empresa”. Assim o dirigente da Fraport, Stefan Schulte, resumiu a grave situação das famílias da Vila Nazaré, que sofrem com um conturbado processo de remoção do local que habitam há cerca de 60 anos – o motivo da remoção são as obras de ampliação da pista do aeroporto Salgado Filho. A Fraport é a responsável pelas obras: desde 2016 é a operadora do aeroporto de Porto Alegre, após vencer licitação para explorar o seu uso por 25 anos. Ainda assim, a empresa alemã nega envolvimento no processo de remoção das famílias: em reunião com seus acionistas, ocorrida na última terça-feira (28), afirmou não ter “nada a ver” com o caso; ainda em 2018, seus representantes em Porto Alegre negaram-se a participar da mesa da audiência pública que debateu a situação da vila, não respondendo a nenhum dos questionamentos dos moradores que lotaram o saguão da escola Ana Nery, ansiosos por informações concretas sobre seus futuros. E desde o início desinformação parece ser a tática: muitas pessoas souberam que perderiam suas casas por meio de notícias na televisão e no rádio, o que mostra que em momento algum a comunidade participou das negociações sobre seu destino.

O plano da prefeitura de Porto Alegre é dividir a vila, indo parte para o loteamento Nosso Senhor do Bom Fim, local mais próximo da Nazaré, e outra parte para o Timbaúva, no loteamento Irmãos Marista, local distante de serviços básicos de saúde, educação e transporte público, nos limites entre Porto Alegre e a cidade de Alvorada. As famílias já se posicionaram contra a mudança para o Timbaúva. Contudo, são apenas 364 unidades habitacionais no Nosso Senhor do Bom Fim – hoje, cerca de 2 mil famílias vivem na Vila Nazaré, o que significa que a maior parte das pessoas será expulsa para o Timbaúva mesmo contra a sua vontade. Além disso, pontos comerciais não foram considerados no processo de reassentamento e muitas famílias perderão suas fontes de renda.

Em sua fala, resposta a acionistas críticos que questionaram as atitudes da empresa em Porto Alegre, Stefan Schulte ainda defendeu a ação da Itazi, empresa contratada pela Fraport para cadastrar e acelerar a remoção das famílias. Em seu site, a Itazi se orgulha da “agilidade que consegue impor ao processo expropriatório”. O cadastramento, feito de maneira violenta e com a presença da Polícia Militar, constrangeu moradoras e moradores: além da figura ameaçadora de policiais, perguntas descabidas e estigmatizantes foram feitas, sem nenhuma relação com a desapropriação – sobre antecedentes criminais, por exemplo.

Uma coisa parece curiosa: se agora a Fraport diz não ter relação alguma com as remoções das famílias da Nazaré, por que ela própria contratou uma empresa para “agilizar o processo expropriatório”? Stefan Schulte ainda mostra desconhecimento sobre a realidade da vila: a Itazi fez o cadastramento de apenas parte da comunidade, que está localizada exatamente na cabeceira da pista e que deve ser removida primeiro: os números que traz (veja íntegra da resposta abaixo), portanto, são parciais. Estranhamente nem Itazi nem Fraport divulgam os números do cadastramento que fizeram. Outra ilegalidade do processo é que o Demhab (Departamento Municipal de Habitação), órgão da prefeitura de Porto Alegre, está condicionando o reassentamento das famílias à renda familiar, excluindo famílias com renda superior a R$ 3 mil (cerca de três salários mínimos); ou seja, muita gente perderá suas casas e irá parar na rua.

É importante que a Fraport, transnacional alemã, assuma sua responsabilidade no reassentamento da Vila Nazaré, a ser removida do local que habita há seis décadas devido ao interesse comercial da empresa em expandir a pista do aeroporto. Existem terrenos – inclusive públicos – em área vizinha a onde hoje está a Nazaré que podem ser destinados para a moradia popular. A questão não é falta de espaço: um condomínio para quase 40 mil pessoas será construído na região; já as 2 mil famílias da Nazaré serão expulsas dali, onde viveram e construíram seus laços sociais e afetivos e firmaram suas raízes. A Fraport é cúmplice dessa violação do direito fundamental que é a moradia – indo, portanto, contra a Constituição brasileira e tratados internacionais sobre o tema, dos quais o Brasil é signatário.

Veja abaixo a íntegra da resposta do diretor da Fraport, Stefan Schulte:
“Foi uma decisão das autoridades do Rio Grande do Sul de realojar os moradores da Vila Nazaré, essa decisão foi tomada em 2010, por motivos de segurança e saúde. Nós da Fraport não temos nada a ver com a decisão. Fazer o realojamento das pessoas era uma das precondições da assinatura do contrato entre as autoridades e a empresa. Nós não acreditamos que sejam 5 mil pessoas, fizemos o censo, e segundo este levantamento constatamos 932 famílias, pra daí chegar a 5 mil deveriam ser 6 pessoas por família. Sobre o realojamento, mais que 100 famílias já aceitaram, e as entidades públicas já construíram as casas necessárias para as pessoas se mudarem, só precisam aceitar. Sobre o processo de realojamento e o censo, a Itazi é uma empresa que age em base e conforme as leis brasileiras, a citação que o senhor fez só reflete uma parte daquilo que consta na página web da empresa. O que é o mais importante é que tudo se dê em base e com respeito às leis brasileiras. E isso está sendo feito e respeitado. Sobre o bairro Irmãos Marista, segundo dizem nossos colegas brasileiros, a situação e a qualidade de vida e de segurança pública é equivalente à Vila Nazaré.”

Shell enfrenta ação legal histórica na Holanda por não atuar sobre as mudanças climáticas

Amigos da Terra Internacional

Amsterdã, 4 de Abril de 2018: A organização Amigos da Terra Holanda anunciou hoje que levará a Shell ao tribunal caso a empresa não aja de acordo com as exigências de parar com a destruição do clima.

Donald Pols, diretor dos Amigos da Terra Holanda, disse: “A Shell está entre as dez maiores empresas poluidoras do clima a nível mundial. Sabe-se que há mais de 30 anos está a causar uma mudança climática perigosa, mas continua a extrair petróleo e gás e investe bilhões na prospecção e no desenvolvimento de novos combustíveis fósseis.”

O caso é apoiado pelos Amigos da Terra Internacional, federação ambientalista que desenvolve campanhas pela justiça climática e apóia comunidades atingidas por projetos de energia suja e pelas mudanças climáticas. Amigos da Terra Internacional têm 75 grupos membros nacionais ao redor do mundo, muitos deles trabalhando para impedir que a Shell extraia combustíveis fósseis nos seus países.

Karin Nansen, presidenta da federação Amigos da Terra Internacional, comentou: “Esse caso envolve pessoas em todo o planeta. A Shell causa enormes danos, as mudanças climáticas e a energia fóssil têm impactos devastadores pelo mundo afora, mas especialmente no hemisfério Sul. Com esta ação judicial, temos a possibilidade de responsabilizar legalmente a Shell.”

O caso dos Amigos da Terra Holanda faz parte de um crescente movimento global para responsabilizar as empresas transnacionais pela sua contribuição histórica para a mudança climática perigosa, bem como pelas violações dos direitos humanos e dos povos decorrentes de suas operações em todo o mundo.

Em janeiro, a cidade de Nova Iorque foi a tribunal para exigir uma indenização às cinco maiores empresas de petróleo, incluindo a Shell, pelas conseqüências das mudanças climáticas. As cidades de São Francisco e Oakland, assim como vários condados da Califórnia, estão fazendo o mesmo. Um agricultor peruano está processando a empresa alemã de energia RWE por contribuir para que os glaciares derretam acima da sua aldeia, resultado das mudanças climáticas.

Enquanto isso, no Brasil, o presidente ilegítimo Michel Temer indica o nome de ex-executivos da Shell para ocupar a o Conselho de Administração da estatal Petrobrás, fortalecendo os indícios de que o golpe de 2016 teria respondido aos interesses das transnacionais petroleiras. Vale lembrar que uma das primeiras mudanças de lei sancionadas após o impeachment da Presidente Dilma Rousseff foi a de alteração das regras de exploração do pré-sal, beneficiando diretamente as grandes da energia suja, como a Shell”, acrescentou Lúcia Ortiz, dos Amigos da Terra Brasil, coordenadora internacional do Programa de Justiça Econômica da federação.

O caso dos Amigos da Terra Internacional é único porque é o primeiro processo climático a exigir que uma empresa de combustíveis fósseis atue para parar de contribuir com a mudança do clima, ao invés de buscar compensações. Esse caso inovador, se for bem sucedido, limitará significativamente os investimentos da Shell em petróleo e gás a nível global, exigindo que se cumpram as metas climáticas acordadas pelos países na COP de Paris em 2015.

Nansen acrescentou: “Se vencermos este caso, haverá grandes consequências para outras empresas fósseis e se abrirá a porta para mais ações legais contra outros poluidores do clima. Amigos da Terra Internacional quer ver regras obrigatórias e vinculantes para corporações como a Shell, que muitas vezes se consideram acima da lei, inclusive quando se trata das metas climáticas”.

AQUI mais detalhes sobre as violações da Shell ao redor do mundo (em espanhol). Já aproveita e assina a petição online contra a Shell!