1 ano do assassinato da companheira Dilma: Violação dos direitos povos e a privatização do rio Tocantins

Dilma Ferreira deixou um legado inspirador de perseverança na luta em defesa de seus direitos. Lutou até o último dia de sua vida em defesa de seu território e contra o avanço explorador das empresas transnacionais sobre a Amazônia e seus povos. Em 22 de março de 2019, quando é celebrado o dia internacional da água, a maranhense de 48 anos e coordenadora regional do Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB) em Tucuruí (PA), Dilma, foi brutalmente assassinada. Junto a ela, foram executados também o seu companheiro, Claudionor Costa da Silva, e o vizinho do casal, Milton Lopes.

Coordenadora regional do Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB) em Tucuruí (PA), Dilma Ferreira (Foto: MAB)

A violência empregada contra a liderança que era Dilma não vem à toa. Eles são assassinados em um contexto de um Brasil pós golpe de Estado de 2016, que intensificou a agenda neoliberal na economia e a sanha de avançar com grandes projetos na região amazônica. A conjuntura se aprofunda em 2019 com o início da gestão de um governo abertamente fascista liderado por um ex-militar saudoso do período ditatorial mais sangrento da história recente do país.

Quatro dias após o assassinato de Dilma, a Polícia Civil do Pará prendeu o fazendeiro Fernando Ferreira Rosa Filho, conhecido como Fernando Shalom, identificado como mandante do assassinato de Dilma. As buscas foram intensificadas depois que três corpos carbonizados foram encontrados a 20 km do local do triplo homicídio. O fazendeiro tornou-se suspeito de ter assassinado as 6 pessoas.

Dilma era atingida pela construção da barragem de Tucuruí. Na coordenação do MAB no Pará, foi protagonista no debate de mulheres atingidas por barragens no Brasil. Dilma Ferreira é a imagem da mulher atingida que foi reconstituída como sujeito de luta em uma região devastada por um grande empreendimento. Ela estabeleceu um marco na resistência histórica em uma região que não foi devidamente reparada em relação aos impactos da construção da barragem de Tucuruí no rio Tocantins.

A região ainda experincia os efeitos históricos da construção da barragem de Tucuruí. Inúmeras comunidades não foram reparadas devido aos impactos da privação do rio Tocantins. O projeto realizado durante o governo militar durou de 1978 até 1980 e expulsou mais de 32 mil pessoas de suas casas. Muitas famílias ainda vivem próximo, desta que é uma das maiores barragens do país, sem acesso a energia elétrica em suas casa e quando a tem pagam uma das tarifas mais caras do país. 

De acordo com a Plataforma Operária e Camponesa para Energia, as contas de luz aumentaram mais de 80% nos últimos dez anos e podem aumentar no mínimo 20% em menos de um ano, caso o plano do governo federal de privatizar a Eletrobrás se concretize. Até hoje, a concessão da barragem é de propriedade estatal. No entanto, há uma forte pressão para que a barragem seja privatizada.

Historicamente, a luta dos afetados por Tucuruí tem sido por reconhecimento e Dilma se colocou nessa frente: “Uma mulher consciente não passa despercebida. E no contexto da Amazônia, todos os que lutam e em processo de resistência acabam sendo perseguidos”, define Cleidiane, da Coordenação Nacional do MAB no Pará. Ela pontua que até hoje as pessoas continuam sendo violadas: “os municípios afetados por Tucuruí têm os mais baixos Índices de Desenvolvimento Humano do Brasil e toda a riqueza gerada não é investida em educação, saúde e melhoria da qualidade de vida, muito menos em infraestrutura para a região”.

No Brasil, construir barragem é sinônimo de violação de direitos humanos. Em 2010, a Secretaria Especial de Direitos Humanos, órgão ligado à Presidência da República, em um Relatório Nacional, comprovou que há um padrão de violação de direitos em obras de barragens no país. Com foco nisso, o MAB vem pautando a Política Nacional dos Atingidos por Barragens (PNAB), resultado de uma longa luta dos atingidos por barragens, que há décadas denunciam as violações e buscam construir um marco legal que possa garantir direitos às vítimas de barragens. O objetivo principal da PNAB é criar uma base legal para populações atingidas por barragens que prevê a definição do conceito de atingido, formas de reparação e a criação de instituições para a organização dos trabalhos.

Para o MAB, define-se população atingida aqueles que sofrem os impactos provocados pela construção, operação ou rompimento de barragens quando há perda da propriedade ou posse de imóvel; desvalorização de imóveis em decorrência de sua localização próxima ou em nível abaixo dessas estruturas; perda da capacidade produtiva das terras e de elementos naturais da paisagem geradores de renda; e perda do produto ou de áreas de exercício da atividade pesqueira ou de manejo de recursos naturais.

Outro elemento que tem intensificado a violação dos direitos na região é a privatização do rio Tocantins sob a forma da construção de hidrovias. Com a barragem de Tucuruí é possível ter maior controle do rio, o que potencializa os interesses para a construção de hidrovias com a finalidade de transportar até os portos as agrocommodities produzidos na região para exportação. A dragagem, necessária para a construção das hidrovias, assim como o fluxo de embarcações carregados de grãos causará impactos na vida das comunidades que vivem com o rio Tocantins: morte dos peixes, assoreamento dos rios, entre outros reflexos.

Os atingidos por barragens não têm suas condições de melhoria de vida asseguradas no processo de construção das barragens, e acabam se tornando uma população extremamente vulnerável. Soma-se a isso o verdadeiro estado de exceção vigente no Brasil e, em especial, na Amazônia brasileira. Na região em que a Dilma vivia, assim como em grande parte da Amazônia, há um contexto similar: a disputa pela ocupação da terra, conflito entre pequeno agricultores e comunidades tradicionais com os grandes fazendeiros (gado e agrocommodities) e grandes empreendimentos.

O que aconteceu com Dilma é resultado da política sistemática de extermínio dos defensores dos territórios e os direitos dos povos que vem sendo executada no Brasil. As ações são carregadas de injustiça e impunidade contra as/os lutadoras/res. Empresários e acionistas internacionais com o apoio do Estado estão dispostos a exterminar os seres humanos e o patrimônio ambiental para garantir o lucro dentro do modelo de acumulação e desapropriação. Com a ascensão do neoliberalismo sob os territórios se intensifica a luta e resistência em defesa da vida e dos direitos. Consequentemente, a perseguição a todas e todos que se levantam contra esta lógica de extermínio. Todo esse contexto de lucro global, resulta em violências locais, muitas vezes, sanguinárias como o assassinato de Dilma.

Na foto, a ex-presidente Dilma Rousseff ao lado de Dilma Ferreira da Silva em audiência no Palácio do Planalto, em 2011 (Foto: Leandro Silva/MAB)

Nós somos as verdadeiras Marias, guerreiras, lutadoras que estão aí no desafio da luta do dia a dia”, disse Dilma Ferreira às mulheres atingidas na ocasião do encontro nacional de 2011 do MAB. Ela deixa um legado da luta da mulher amazônica, que resistiu até o fim de sua vida, que seguiu lutando para garantir os direitos dos povos. Independentemente do tamanho do inimigo, ousou continuar a luta. Mulher aguerrida, Dilma era também mãe, deixou uma filha de 24 anos. 

Por Dilma, por sua luta, continuamos lutando!

Águas para vida, não para morte!

Para celebrar a memória da vida e da luta de Dilma, conversamos com Soniamara Maranho, Tchenna Maso e Cleidiane Vieira, companheiras da Coordenação Nacional da Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), sobre a situação dos defensores dos direitos dos povos no Brasil e o contexto atual na região de Tucuruí. Ouça aqui.

Da luta pela moradia em Porto Alegre à defesa dos direitos dos povos na Amazônia

A Amigos da Terra Brasil é uma Organização não governamental dedicada à proteção do meio ambiente e à promoção do desenvolvimento com sustentabilidade e justiça social. Em 1983, ingressou como membro brasileiro da Federação Internacional Friends of the Earth (FoEI), maior rede de grupos ambientais de base, com 73 grupos nacionais e mais de dois milhões de membros e simpatizantes em todo o mundo.

A luta em defesa do meio ambiente e dos povos e a busca pela construção de uma sociedade mais justa e igualitária é vasta e está conectada de diversas maneiras. Por isso, a organização apoia iniciativas de defensores e defensoras dos povos em todo o país, seja na luta pela moradia em Porto Alegre, seja no combate das queimadas na Amazônia.

Nos últimos anos, a Amigos da Terra tem oportunizado a construção de banheiros em aldeias guaranis sob a ótica indígena, apoiado campanhas financeiras para fortalecer a agroecologia e combater o monocultivo, participado das discussões contra o uso massivo de agrotóxicos, integrando o campo à cidade com a realização da feira agroecológica Frutos da Resistência.

Além disso, vem alertando acerca da possível expansão do capital mineral e os riscos que a mineração representa à biodiversidade e à manutenção dos modos de vida das comunidades, participando ativamente no Comitê de Combate à Megamineração no Rio Grande do Sul e nos atos contra a Mina Guaíba, que pretende ser a maior mina de carvão a céu aberto no Brasil.

A partir de uma articulação entre Amigos da Terra Brasil e Amigos da Terra Alemanha (Bund), a luta da Vila Nazaré foi ouvida dentro da reunião de acionistas da Fraport, em 2018. A comunidade resiste até hoje contra uma série de violações de direitos de uma remoção forçada para ampliação da pista do aeroporto Salgado Filho. Em parceria com a associação de moradores (AMOVIN) e o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), a Amigos da Terra acompanha a luta pelo respeito às famílias desde o início.

Como forma de visibilizar as situações de violência, violações de direitos dos povos e comunidades tradicionais, e os mecanismos de financeirização da natureza, nossa organização dispõe de uma equipe de comunicação que busca produzir conteúdos que ecoem as vozes daqueles que, por vezes, são marginalizados e não possuem espaço na dita mídia hegemônica.

Para que você conheça um pouco dessa atuação, selecionamos as reportagens e conteúdos produzidos no último período, referente aos ataques sofridos por comunidades indígenas no Rio Grande do Sul, a luta da Vila Nazaré pelo direito à moradia, os riscos do avanço da mineração e o combate às queimadas na região do Acre:

Fraport cria cenário de guerra na Vila Nazaré: escombros, ameaças e remoções ilegais

Visita ao assentamento Apolônio de Carvalho e ao loteamento Guaíba City evidencia danos sociais e ambientais do projeto Mina Guaíba, da Copelmi

Retomada Mbya Guarani da Ponta do Arado recebe placas solares para geração de energia e maior segurança frente às recentes ameaças sofridas

Em um final de semana, três ataques a comunidades indígenas no RS

O ganha-ganha por trás das queimadas da Amazônia

O ganha-ganha por trás das queimadas da Amazônia [parte 2]

Pescador é baleado no rosto na Baía da Guanabara

Tiros de balas de borracha partiram de oficiais da Marinha, que perseguiram pescadores que estavam próximos a terminais de gás e petróleo. Com informações da Ahomar (Associação Homens e Mulheres do Mar).

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Na noite do último sábado (8/3), dois pescadores foram perseguidos e alvejados com tiros de balas de borracha na Baía da Guanabara, Rio de Janeiro. Eles pescavam próximos a área de Marinha e a terminais de gás e petróleo. Os tiros partiram de oficiais da Marinha. Edilson Aderaldo Marques Filho, um dos fundadores da Ahomar, foi atingido duas vezes na cabeça – uma delas próximo ao olho – e uma na costela. Ele foi atendido em hospital na cidade de Duque de Caxias e passa bem, embora a visão esteja comprometida.

Imagem Edilson, atingido na cabeça por oficiais da Marinha enquanto pescava na Baía da Guanabara.

Em território em disputa – há grande interesse de petroleiras na região -, os pescadores artesanais da região sofrem há anos com violência, perseguição e ameaças. Hoje, apenas 12% de seu território é livre para a atividade pesqueira. Além da limitação espacial, pescadoras e pescadores têm ainda de conviver com a poluição inerente às atividades da indústria petroleira, que torna quase impossível o sustento das famílias que dependem da pesca.

Abaixo, veja vídeo gravado na noite do ataque pelo irmão de Edilson, que o acompanhava na pesca e não teve ferimentos. Após filmar a ação militar, sofreu ainda ameaças e quase teve o celular apreendido:

Em visita recente à região, junto à Ahomar e à Fase, gravamos estes depoimentos, que explicitam estes ataques sistemáticos aos pescadores da região (e aqui um texto produzido à época). A visita foi parte da campanha por áreas livres de petróleo Nem Um Poço A Mais:

Também este vídeo da Pública aborda os conflitos na região da Baía da Guanabara:

Mulheres Atingidas por Barragens em Altamira são exemplo de luta por direitos

O dia 8 de março é um marco internacional de luta das mulheres por direitos. Em Altamira, no Pará, as mulheres impactadas pela barragem de Belo Monte são exemplo de força e resistência no enfrentamento aos desafios trazidos pela construção de grandes empreendimentos. Com a chegada da hidrelétrica no Rio Xingu, mais de 10 mil famílias precisaram sair de seus lares para ir morar em casas pré-moldadas, desconectando-se do modo de vida que estavam acostumadas, a maioria das famílias perdeu o vínculo comunitário e, em raras situações, foi possível manter a rede de apoio e solidariedade que existia entre as mulheres há tantos anos.

A população de Altamira aumentou de 99 mil habitantes em 2010, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), para 170 mil, segundo a prefeitura municipal de Altamira, em levantamento de 2013. O incremento populacional trazido pela construção da barragem não foi acompanhado de políticas públicas ou por parte da empresa para estabelecer toda estas pessoas, em maioria trabalhadores e migrantes em busca de promessas de prosperidade. Com as obras para a construção da hidrelétrica, os RUCs (Reassentamentos Urbanos Coletivos) construídos pela empresa longe do centro para reassentar as famílias impactadas, com escolas, saúde e transporte público deficitários, favoreceu um incremento na violência do município. Como relata Francinete Novais, do RUC Laranjeira: “a empresa faz a propaganda que a casa é boa, mas vai fazer quatro anos que eu moro nesta casa e eu já precisei reformar quatro vezes”.

A cidade chegou a liderar o ranking das mais violentas do país em 2017 e caiu para o segundo lugar em 2019 segundo o Atlas da Violência. Mães, avós, irmãs, tias, passaram a ver a juventude ser morta frequentemente. As creches e escolas que levam a marca da Prefeitura Municipal de Altamira e da empresa Norte Energia estão sucateadas e não conseguem atender a toda a população. Hoje, há poucas alternativas para que os jovens possam ter seus momentos de lazer e educação. Junto a isso, cresce também a violência contra a mulher, que se dá para além de quando ocorre um feminicídio, ela acontece na dificuldade de diálogo com a empresa e as lideranças mulheres. Está também na burocracia no atendimento de saúde que torna um entrave na realização de exames para as mulheres na saúde pública. 

Em Altamira, as mulheres enfrentam o preconceito e a discriminação ao viver nos RUCs, localizados na periferia da cidade. Ivanir, desempregada, relata qual a situação que passa ao procurar um emprego formal: “já coloquei vários currículos, quando a pessoa vê que sou do RUC Água Azul e dizem que aqui é muito violento, mas eu moro aqui à 5 anos”. A dificuldade em conseguir emprego na região central do município e a falta de oportunidade de geração de renda dentro dos  próprios reassentamentos. Francinete descreve que “várias mulheres que eu conheço estão desempregadas. Eles (Norte Energia) não colocaram nenhuma atividade para gente, nem um curso, nada. Os homens têm prioridade para trabalhar. Nós mulheres também queremos trabalhar, não queremos depender de homem”, defende.

A gestão financeira das famílias tem sido um dos principais desafios com o desemprego de jovens e mulheres aliado ao preços na tarifa de energia elétrica. Hoje o valor pago pela energia na região é a mais cara do país, cerca de R$ 0,67/KWh.Em comparação com São Paulo, R$ 0,34/KWh, o valor é 50% mais caro, segundo dados da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica). Além de receber os impactos de Belo Monte, a população não teve benefícios na conta de luz, pelo contrário a conta de luz que antes era em média de R$ 70,00 mensais, passou a ser R$ 300,00 mensais.

O atual processo de desenvolvimento do modelo capitalista e também do atual modelo energético é o que mais viola direito humanos e neste processo as mulheres são as mais impactadas. Quando uma barragem é instalada em um território, as mulheres são as que mais sofrem. Como afirma Josiane, uma das atingidas e reassentadas: “quando falta de água, somos nós mulheres que mais sofremos, pois somos nós que temos que cozinhamos, limpamos a casa, lavamos roupa”. Por isso, muitas vezes, a defesa da água passa a ser uma tarefa das mulheres. 

Também, quando a hidrelétrica chega aos territórios, são as mulheres as primeiras a se organizarem e lutarem por seus direitos e, de modo consequente, passam a ser perseguidas por sua força ser uma ameaça a conclusão do megaempreendimento. Infelizmente, temos a triste experiência do ocorrido com Dilma e Nicinha, lutadoras contra a violação de direitos na construção das barragens, que foram assassinadas por colocar suas forças em defesa de seus territórios. 

E diante de tantos desafios, as mulheres têm seguido firmes. Seguem como protagonistas em defesa da vida, do corpo-território, da vida comunitária, da vida dos seus territórios e da manutenção de seu modo de vida. É neste sentido que passam a ser guardiãs dos territórios, sendo co-criadoras para resistir e reinventar a luta em defesa das vidas, por democracia e por direitos. 

Veja o depoimento das mulheres atingidas por barragens de Altamira que, tomadas de consciência dos seus direitos, seguem tomando voz e lutando contra a violação promovidas pelo sistema capitalista-patriarcal: 

Atingidas por barragens marcham em defesa dos direitos das mulheres em Altamira/PA

Mulheres atingidas por barragens sairam às ruas de Altamira, no Pará, na manhã desta sexta-feira (06) para denunciar a violência e os ataques aos direitos historicamente conquistados pelas mulheres. A ação faz parte das lutas do 8 de Março, Dia Internacional de Luta das Mulheres e do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB).


A marcha com o tema “Nós mulheres estamos combinando de não morrermos pelo ódio e prepotência do machismo, capitalismo e racismo” reuniu centenas de mulheres e homens de diferentes idades e seguiu pelas ruas centrais de Altamira. O ato encerrou em frente ao Fórum Municipal para exigir Energia elétrica sem exploração da tarifa (o município tem uma das tarifas mais caras do país, mesmo com a produção de Belo Monte); Políticas Públicas nos bairros, nos Reassentamentos Urbanos Coletivos (RUCs) e no campo; Saúde Pública com a construção de Hospital Materno Infantil, ações de prevenção a casos de câncer e debate da política de descriminalização do aborto; Demarcação das terras rurais às mulheres; Enfrentamento contra a violência à mulher; políticas de enfrentamento ao encarceramento feminino e segurança pública aos jovens da região.

Nos cartazes também haviam denúncias das violações sofridas por mulheres amazônicas e visibilidade para a luta em defesa da floresta.

Fotos Carol Ferraz

Amigos da Terra Brasil sofre ataque do governo Bolsonaro

Ameaça de despejo da organização socioambiental é mais um ataque a quem defende os direitos dos povos e do meio ambiente no Brasil

#CasanatResiste #AmigosdaTerraExiste

Há mais de 50 anos em atividade, a Amigos da Terra Brasil vem sofrendo desde novembro de 2019 uma tentativa de despejo do imóvel que ocupa na Rua Olavo Bilac, em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul. A ordem vem da Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia, responsável pela gestão do Patrimônio da União no governo Bolsonaro. O imóvel, que é cedido pela União à Amigos da Terra desde 2004, também sedia o Centro de Documentação Magda Renner, uma vasta biblioteca e memorial da história do ambientalismo brasileiro e gaúcho.

O contrato de cessão do local prevê renovações automáticas a cada oito anos, sob a condição de que a Amigos da Terra se comprometa com a recuperação e a manutenção da área, que era antes nada mais que uma edificação precária em um terreno abandonado. E assim tem sido feito: a Casanat, como é chamada a casa recuperada (da sigla Criação em arquitetura Sócio-Ambiental para o núcleo Amigos da Terra), tornou-se um centro de referência para práticas sustentáveis em meio urbano no coração de Porto Alegre. Além das reconstruções estruturais, ali foram instaladas diversas tecnologias sociais, desde o “círculo de bananeiras”, que beneficia o saneamento sustentável, até o uso de cisternas para a captação da água da chuva, usada depois no sistema interno da casa. O acervo do centro de documentação é aberto ao público, para consulta, e já foi visitado por diversas pesquisadoras e pesquisadores para que aprofundassem seus estudos sobre o tema socioambiental.

Inimigo dos povos que defendem a natureza – povos originários, campesinos, quilombolas, quebradeiras de coco, seringueiras e seringueiros, entre outros -, Bolsonaro ataca também as organizações que defendem essa bandeira, a da natureza e dos direitos dos povos. A súbita notificação de rescisão do contrato de cessão, entregue pessoalmente pelo superintendente da pasta de desestatização no Rio Grande do Sul, Gladstone Themóteo Menezes Brito da Silva, e a negativa a todas tentativas de diálogo feitas desde então apenas reforçam a tese de que este é um ataque político à Amigos da Terra Brasil e a todas e todos que dedicam suas vidas na luta por justiça ambiental e contra todas as formas de opressão.

Em fevereiro, foi entregue um extenso dossiê ao superintendente que comprova a recuperação do imóvel e seu evidente uso de interesse público, com a realização de diversos eventos ao longo dos últimos anos, como palestras, oficinas, feiras e rodas de conversa. O material foi prontamente ignorado e persiste a ameaça de despejo. Nos próximos dias, seguiremos o único caminho possível frente a um governo que se nega a dialogar, que é a judicialização.

COMO AJUDAR?
Você pode ajudar de diferentes formas! Algumas sugestões:

1) Assine nesse link o abaixo-assinado em solidariedade à Amigos da Terra;
2) Nos envie uma carta institucional de apoio. Modelo aqui
3) Compartilhe os conteúdos que publicarmos nas suas redes pessoais e das organizações a que pertence, sempre usando as hashtags #CasanatResiste e #AmigosDaTerraExiste e marcando @amigosdaterrabr
4) Publique vídeos prórios (pode ser no Stories do Instagram!) falando sobre a importância da Casanat e da atuação da Amigos da Terra Brasil. Ao publicar, marque o nosso perfil @amigosdaterrabr – assim poderemos republicar o conteúdo em nossas páginas também!
5) Vem nos visitar! Em breve divulgaremos uma série de atividades previstas para as próximas semanas, com mostra de filmes, debates e rodas de conversa. Seguiremos nossas atividades para manter o caráter público do imóvel recuperado e devolvido à sociedade pela Amigos da Terra Brasil, após décadas de abandono por parte da União.

Aqui mais informações sobre a CaSAnAT

A intenção de Bolsonaro é desarticular, mas o tiro sairá pela culatra: unidos na solidariedade, vamos transformar mais esse ataque em oportunidade para denunciar a morbidez desse governo fascista e fortalecer a luta dos povos por seus direitos!

El Salvador: uso de força próprio de ditadores do século XX

CESTA-Amigos de la Tierra El Salvador repudia a forma de agir do atual presidente Nayib Bukele, que ameaçou fechar o Parlamento.

Na tarde de domingo, 9, o presidente Nayib Bukele invadiu na Assembleia Legislativa escoltado por militares do Exército, armados com rifles, e membros da Polícia Nacional Civil, afirmando que acompanharia a reunião extraordinária que seus Ministros haviam convocado para aquele dia. O motivo extraordinário de suposto interesse nacional era conter o empréstimo de 109 milhões de dólares para um plano de controle territorial, cujo conteúdo não é público.

Após discursar para seus aliados reunidos no entorno da Assembleia Legislativa, o presidente voltou ao prédio para rezar. Ao sair novamente, manifestou que havia decidido não levar adiante a tomada de poder sobre a Assembleia Legislativa, porque haveria “conversado” com Deus e este lhe dito que tivesse paciência. Afirmou ainda que não era necessário expulsar os deputados da Assembleia naquele momento e que o povo o faria nas próximas eleições, em fevereiro de 2021.

Repúdio Social a brutalidade de Bukele

As ações do presidente encontraram mobilização social e a rejeição a esta forma de governar, militarizando o Parlamento e ameaçando o povo. “É totalmente condenável a forma de atuar do presidente da república”, manifesta CESTA-Amigos de la Tierra El Salvador.

“Não há contato com processos de consulta com os diferentes setores da população para sua elaboração”, defende o movimento feminista salvadorenho.

#ULTIMAHORA #ElSalvador Movimiento feminista llama a construir una sociedad desde la alegría y no de la militarización @FUERZARMADASV @PNCSV @AsambleaSV pic.twitter.com/PdLsm4na5N— Revista La Brújula (@labrujula_rev) February 11, 2020

Em comunicado, a organização ambientalista considera que é injustificável realizar uma convocação extraordinária que: “se aplica unicamente em casos de extrema emergência como uma guerra ou uma catástrofe nacional, mas nunca para justificar um empréstimo financeiro do governo”. “O presidente não tem nenhum direito de invadir junto ao exército o salão da Assembleia Legislativa (…) nem ameaçar aos deputados”, afirma CESTA. Bukele “fez um chamado ao povo em insurgência, sendo assim foram seus seguidores reunidos lá quem realizou ações de violência para remover os deputados de seus cargos”, opinam.

“O presidente realizou um ato de brutalidade e assédio próprio de ditadores do século XX que tanto sangue derramaram em nosso país e em outros países da América Latina, segue fresca em nossa memória a guerra de 12 anos que tivemos em nosso país ao fim do século XX, uma situação que não queremos voltar a repetir”, afirma o comunicado de CESTA-Amigos de la Tierra El Salvador.

Para a organização, o mandatário deixa claro que não está qualificado para o cargo “com esta ação e outras de capricho público que teve nos meses passados (…). Pedimos que a comunidade nacional e internacional repudie estas ações do presidente Nayib Bukele”.

Nesta segunda, 10, houve manifestações repudiando as atitudes de Bukele, como do movimento feminista salvadorenho “contra o autoritarismo e o militarismo na Praça Salvador del Mundo, na capital San Salvador.

O Movimento de Vítimas, Afetados e Afetadas pelas Mudanças Climáticas (MOVIAC, na sigla em espanhol) também repudiaram o uso de violência por parte das forças armadas e o simbolismo religioso “para uso midiático e manipulação da conciência coletiva para fins eleitoreiros”. A organização compara, ainda, esta situação com o golpe de Estado cometido na Bolívia contra o governo de Evo Morales e as intenções golpistas na Venezuela, “que obedece a política intervencionista do governo dos Estados Unidos”, defende.

O MOVIAC exige o fim das ações prepotentes e assediadoras de Bukele e que sejam realizadas investigações exaustivas sobre a responsabilidade do uso das forças armadas para pressionar a Assembleia Legislativa.

Repúdio do Parlamento

Na tarde de segunda-feira, 10, a Corte Suprema da Justiça emitiu uma notificação em relação a convocatória do Conselho de Ministros para uma sessão plenária extraordinária no domingo, 9. Esta resolução foi aceita pelos parlamentaristas e por Bukele.

A resolução da Suprema Corte deixa medidas cautelares, entre elas que o presidente não pode usar as Forças Armadas para fins que não sejam as que lhes correspondem.

Por sua vez, os deputados emitiram um pronunciamento, via Twitter, repudiando as ações realizadas durante o dia 9 de fevereiro: “Os deputados, repudiam o insulto e as ameaças às deputadas e aos deputados, bem como as perseguições realizadas. E pedem que os congressos do mundo se solidarizem em defesa da democracia e do Estado de Direito em El Salvador. Por outro lado, recomenda-se que o senhor presidente desista de suas ameaças e uso das forças para dissolver o Parlamento Salvadorenho”, destacam.

Confira a declaração da CESTA-Amigos de la Tierra El Salvador na íntegra em espanhol.

O que aprendemos com Brumadinho?

Um ano após o crime da Vale em Brumadinho, a vida das atingidas e dos atingidos é cercada pela poluição da água do rio Paraopeba com a lama tóxica. São muitos os reflexos: crescimento de casos de doenças — de pele e problemas gastrointestinais, sobretudo com relação a saúde mental; desemprego e perdas econômicas nas cidades dependentes do rio; falta de informação e assessoria técnica independente; descasos com as vítimas (dentre elas, 11 ainda desaparecidas) e seus familiares; além de cortes no auxílio emergencial pago pela Vale.

Enquanto isso, a empresa segue impune. A Vale obteve R$7 bilhões de lucro em 2019 e, como se não bastasse, ainda recuperou o valor de mercado que tinha antes do rompimento da barragem, chegando à R$ 301 bilhões. O que representa R$ 5 bilhões a mais em relação ao que possuía antes do crime ambiental.

No dia 25 de janeiro de 2020, completou um ano de um dos maiores crimes ambientais do Brasil. A barragem de rejeito de mineração da empresa Vale, localizada na comunidade Córrego do Feijão no município de Brumadinho-MG, rompe deixando 272 vítimas. A lama de rejeitos percorreu mais de 300 quilômetros do rio Paraopeba.

Para marcar o um ano do crime da Vale, um ano de impunidade, um ano de luta e resistência, atingidos e atingidas marcharam em defesa dos seus direitos e de suas vidas. A Marcha dos e das Atingidos e Atingidas iniciou no dia 20 de janeiro em Belo Horizonte. Seguiu pelo município de Pompéu, no interior do estado, e chegou até a região metropolitana de Belo Horizonte, passando por Juatuba, Citrolândia, São Joaquim de Bicas, Betim, percorrendo o caminho inverso a trajetória de destruição deixada pela lama, até chegar ao Córrego do Feijão no dia 25 de janeiro.

A caravana, que durou seis dias, contou com mais de 350 marchantes. Entre os presentes estiveram atingidas e atingidos da bacias do Rio Paraopeba e Rio Doce, militantes do Movimento dos Atingidos por Barragens e demais movimentos, organizações e entidades aliadas de todo o Brasil e ainda de 17 países. 

O objetivo da Marcha é marcar o primeiro ano do crime da Vale em Brumadinho e expor a atual situação em que estão as comunidades em relação a lama tóxica. Tem ainda como ação sinalizar a luta e a resistência dos atingidos e atingidas, denunciar a impunidade das empresas transnacionais Vale, Samarco e BHP Billiton após os crimes em Mariana e Brumadinho (que em em 4 anos deixou mais de 300 vítimas), além de reivindicar a mudança no modelo exploratório da mineração no país.

Foto: Movimento dos Atingidos por Barragens

Justiça para quem?

Foi em frente à sede do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e na Agência Nacional de Mineração (ANM), no dia 20 de janeiro, que os marchantes denunciaram a omissão destes órgãos públicos em fazer justiça aos atingidos pelos crimes da mineradora e a impunidade da empresa frente aos crimes cometidos.  No estado, existem 840 barragens e, dentre elas, pelo menos 83 têm alto risco de rompimento, assim como ocorreu em Brumadinho. Além disso, segundo o Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), em 2019 cerca de 108 mil pessoas foram reconhecidas como “afetadas” por Brumadinho e receberam “Auxílio Emergencial”, que consiste no pagamento, pela Vale, de um salário mínimo para adultos, meio salário mínimo para adolescentes e um salário mínimo para crianças por um ano. Entretanto, esses valores monetários são insuficientes para reparar o dano causado na vida dos atingidos. 

O próprio conceito de atingido usado pela empresa Vale não contempla todas as pessoas que tiveram sua vida afetada após o rompimento da barragem, como é o caso de Alexandro Magela de Oliveira, 37 anos, morador do Assentamento Queima Fogo. Não apenas as pessoas de Brumadinho foram atingidas, inúmeras comunidades da bacia do Rio Paraopeba tiveram suas casas e suas atividades econômicas prejudicadas senão completamente destruídas pelas lama. A empresa tem usado como estratégia a individualização do processo, isolando as pessoas atingidas e fazendo acordos individuais, para ter mais poder e desmobilizar a ação coletiva.

O MAB solicitou que esse auxílio de emergência fosse estendido até que fosse alcançado um “reparo abrangente” e que as comunidades impactadas fossem envolvidas no processo de definição dos critérios para receber o Auxílio Emergencial: “Questionamos o papel dessa justiça que escuta muito mais os criminosos do que as vítimas. Não pararemos até que haja um reparo completo. As pessoas precisam de ajuda de emergência para comprar comida; eles estão passando fome porque perderam seus empregos no campo e como pescadores artesanais”, defende Joceli Andrioli, membro da Coordenação Nacional do MAB, em entrevista à  Rádio Mundo Real. 

Eles reivindicam também uma Política Estadual dos Atingidos por Barragens (PEAB) que assegure assistência às pessoas ou populações afetadas por impactos decorrentes da construção, instalação, ampliação ou operação de barragens e outros empreendimentos e que principalmente garanta a responsabilização das empresas frente aos impactos causados. Se mostra essencial uma Política Estadual dos Atingidos por Barragens para trazer a definição do conceito de atingidos por barragens, listar seus direitos, determinar as formas de reparação, os mecanismos de financiamento, prevendo a participação da população em todos os processos.

Perda de Vidas: a contaminação do Rio Paraopeba
Após ao rompimento da barragem e a lama tóxica se espalhar pelo Rio Paraopeba, o número de casos de doenças tem aumentado. São doenças de pele, diarreia, coceira, manchas na pele, alcoolismo, insônia, depressão. A marcha, ao passar por municípios de Pompéu e Juatuba mps dias 21 e 22 de outubro, os atingidos e atingidas relataram que em toda a bacia do Rio Paraopeba o consumo de remédios controlados, o número de tentativas de suicídio e aborto espontâneos cresceram. Muitas vezes, o adoecimento não é imediato.

Neste um ano houve aumento nas doenças mentais da população. A perda de esperança e o medo constante estão acabando com o projeto de vida de muitas pessoas. Isso também se deve à perda das atividades econômicas tradicionais como a agricultura, a pesca e o turismo que dependia do Rio Paraopeba. “As pessoas perderam muito. A água do rio é marrom, às vezes, você vê peixes… mortos. A tristeza é grande. Sinto esperança de ver o rio que vi em algum momento, de nadar livremente, de pescar, para as meninas brincarem, mas neste momento nossa vida cotidiana é muito difícil”, disse Erliete Rocha de Campos à Rádio Mundo Real. 

Atualmente, a água consumida através das torneira, oferecido pela empresa COPASA, gera insegurança à população. As pessoas estão consumindo a água sem saber se está potável ou, em muitos casos, precisam comprar água para consumo. Muitas pessoas estão vivendo na beira do rio, mas sem água. Um dos principais medos da população é o contato e o consumo de metais pesados presentes na água e no lençol freático, e o quanto poderá contaminar a agricultura. Outra incerteza é o que a presença destes metais pesados e a combinação deles irá causar ou reagir nos corpos.

A ONG SOS Mata Atlântica acaba de lançar um estudo sobre a qualidade da água do Rio Paraopeba, reafirmando que está “sem condições de uso”.  A Organização destaca que o período das chuvas muda o cenário, já que leva os rejeitos para o Baixo Paraopeba, ao Reservatório de Retiro Baixo, ou seja, aumenta as chances de que a contaminação chegue ao Rio São Francisco.

Uma das principais reivindicações da população atingida é a contratação das Assessorias Técnicas Independentes, para a garantia de consultoria e acompanhamento não tendencioso, de modo que sejam organizados diagnósticos e possibilidades de soluções para as demandas das regiões – construindo de modo participativo todos os passos necessários para a luta por reparação integral. O Ministério Público de Minas Gerais orienta a solicitação de revisão do Plano Municipal de Saúde de cada município atingido pela lama, para que os Planos Municipais contemplem a saúde dos atingidos por barragens. A lama matou o rio, matou tudo o que vivia no rio, matou a água que dava vida à alimentação e subsistência das famílias. A lama matou a vida e a memória das pessoas.

 

“Águas para vida, não para a morte!” | Foto: Movimento dos Atingidos por Barragens

 

A impunidade inabalável
Mesmo tendo provas de que a Vale sabia que a barragem tinha riscos de romper e contabilizou em seu orçamento as possíveis mortes e mesmo assim a empresa segue sem ser responsabilizada pelos crimes. O  Seminário Internacional “Um ano do crime da Vale em Brumadinho”, realizado em Betim no dia 24 de janeiro, teve mais de 500 pessoas, de todo o Brasil e de 17 países. O Seminário destacou a importância de responsabilizar as empresas para que crimes como o cometido pela Vale pare de acontecer. 

Juan Pablo, do Movimiento Rios Vivos (Colômbia) e do Movimiento de Atingidos por Represas (MAR) fala sobre o modelo energético que viola direito na América Latina.

O modelo minero-energético adotado pela Vale e pelas empresas transnacionais se beneficia de uma “arquitetura da impunidade”. No qual a impunidade é mantida graças ao sistema hegemônico capitalista-neoliberal que atua enfraquecendo os Estados e dando poder a cada vez um número mais reduzido de atores empresariais e instituições financeiras. Para isso é preciso cooptar a democracia e moldar o sistema judiciário com base em interesses privados. Por um lado, não existe no direito internacional um marco legal para regular empresas transnacionais, muito menos um mecanismo ou corte para julgar crimes corporativos.

O sistema faz uso de diferentes maquiagens para seguir atuando de maneira impune, é comum enxergar no discurso das empresas e nas suas agendas comerciais uma aparente perspectiva “sustentável” – com visões tecnicistas e individualistas colocando territórios e saberes populares à serviço do capital e gerando acumulação primitiva através de mecanismos de financeirização da natureza. e, até mesmo de classe – usualmente mencionam normas da Organização Internacional do Trabalho, mas não asseguram nenhum mecanismo que obrigue o cumprimento de leis trabalhistas. Essas e outras maquiagens enganam a população sobre as reais consequências da instalação de empresas ou das parcerias público-privadas.

As promessas de crescimento econômico como resultado da implantação de empresas transnacionais devem ser desmentidas e as injustiças que sustentam essa arquitetura visibilizadas. Um exemplo é a Fundação Renova, criada pela Vale e pela BHP para indenizar as famílias impactadas pelas lama, mas na realidade tem implantado a indústria das indenizações, usando diferentes formas de cooptar entidades e empresas para agir em torno de controlar os territórios e não resolver a situação dos atingidos. 

A Amigos da Terra Internacional, juntamente com outros movimentos incluindo o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) faz parte da Campanha Global para Reclamar a Soberania dos Povos Desmantelar o Poder das Transnacionais e Por Fim à Impunidade que, dentre outros processos, acompanha e incide no Grupo de Trabalho Intergovernamental das Nações Unidas sobre corporações transnacionais e outras empresas comerciais com respeito aos direitos humanos. Tchenna Maso, do MAB, fala sobre como os crimes da Vale estão se tornando um padrão das empresas transnacionais e ressalta a importância de internacionalizar a luta por garantia de direitos:

O que ocorreu em Brumadinho alerta o que pode ocorrer em outros lugares. No Rio Grande do Sul, projeto de mineração no sul do estado, entre Lavras do Sul e Dom Pedrito, projeto prevê construção de barragem duas vezes maior que a de Brumadinho (MG). Em caso de ruptura, rejeitos atingiriam Rosário do Sul, Praia de Areias Brancas, e poderiam chegar até o Uruguai. Atualmente, o Rio Grande do Sul surge como a nova fronteira minerária do Brasil: são mais de 5 mil requerimentos para pesquisa mineral em solo gaúcho. Caso avancem os projetos, o estado se tornaria o terceiro maior minerador do país. 

No estado gaúcho há mais de 800 barragens. Atualmente ocorre o desmonte das políticas públicas para os atingidos por barragens. Em 2019, com o governo do Eduardo Leite, dois decretos que regulamentavam os direitos das populações atingidas por barragens no estado foram revogados. O Decreto nº 51.595, de 23 de junho de 2014, que instituía a Política de Desenvolvimento de Regiões Afetadas por Empreendimentos Hidrelétricos – PDRAEH, e a Política Estadual dos Atingidos por Empreendimentos Hidrelétricos no Estado do Rio Grande do Sul – PEAEH previa uma série de itens relacionado aos direitos que possuem os atingidos por barragens, buscando assim diminuir as violações e impactos causados pelos grandes empreendimentos hidrelétricos. 

Brumadinho ensina dos riscos, das consequências que a mineração traz aos territórios. Para as empresas, o lucro está acima da vida! A Campanha Global para Reclamar a Soberania dos Povos Desmantelar o Poder das Transnacionais e Por Fim à Impunidade visa assegurar que estes crimes não ocorram e que as empresas sejam responsabilizadas.

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Foto: Movimento dos Atingidos por Barragens

1 ano de dor. 1 ano de luta!
272 pessoas tiveram suas vidas ceifadas em prol do lucro de uma empresa. A tragédia anunciada em Mariana, se repetiu em Brumadinho. Pela mesma empresa: a Vale. O dia 25 de janeiro de 2020 foi de muita dor. Foi o dia de relembrar o pânico e sofrimento que deste dia por diante transformou a vida de inúmeras famílias e comunidades. O dia que faz repensar sobre o poder das corporações, faz refletir sobre o modelo energético insustentável e inviável, sobre as injustiças sociais e ecológicas em prol do lucro das empresas. 

Nenhuma  morte foi acidente. Existe um responsável: a Vale. 

No 25 de janeiro foi quando a  marcha chegou na Comunidade Córrego do Feijão para prestar solidariedade às vítimas, aos familiares, à comunidades. É possível perceber os traços da destruição na comunidade: muitas pessoas foram embora, muitas casas a venda (na maioria sendo comprada pela Vale), dificuldades de acesso água a água. A empresa compra as casa como estratégia para ter controle sobre a região e apagar a memória do crime cometido. Além disso, em áreas em que é possível visualizar a destruição deixada pela lama tóxica, a empresa colocou escudos para que a população não veja, bem como, onde ficou lama, plantou grama.

Seguir depois de tamanha extermínio não é fácil. É preciso transformar toda dor e sofrimento em energia para seguir lutando, para que isso não se repita mais! É só através da autonomia dos povos e comunidades que será possível transformar o atual modelo energético para uma transição justa e popular.

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Após trancamento da ferrovia no dia 23 de janeiro, empresas acatam reivindicação para suspender atividades no dia em que o crime em Brumadinho completa um ano e atingidos conquistam paralisação do trem da Vale no dia 25 de janeiro. Fotos: Movimento dos Atingidos por Barragens

Guarani sofrem ataque de intimidação enquanto EIA-RIMA da Mina Guaíba é questionado

Foto: Heitor Jardim/Amigos da Terra Brasil

Em um mesmo final de semana de setembro, três aldeias guarani foram atacadas no Rio Grande do Sul. Uma delas foi a Aldeia Guajayvi, localizada no munícipio de Charquedas, a 50 km de Porto Alegre e a três km de onde a empresa Copelmi pretende instalar a Mina Guaíba, empreendimento de mineração de carvão a céu aberto e que está sofrendo forte resistência da comunidade do estado. No começo de dezembro, fomos escutar o Cacique Cláudio Acosta, 51 anos, sobre as ameaças, que aconteceram simultaneamente a uma investigação do Ministério Público Federal sobre irregularidades no licenciamento ambiental do empreendimento. Segundo o relato do Cacique Cláudio Acosta, foram três dias de tensão, sexta (13), sábado (14) e domingo (15). Em uma sexta-feira, chegou na porteira um carro branco, que ficou estacionado por 20 minutos, tirando fotos, filmando. No dia seguinte, um carro vermelho, com dois homens diferentes. Dessa vez, com armas, exibidas na cintura. “Falaram que tinham ordem de que se fizéssemos qualquer movimento estranho era para atirar e matar”, relata Cláudio. No domingo, um terceiro carro, com homens que filmaram os índígenas da cerca. “Tentamos fotografar, mas temos medo”, admite. O Cacique Cláudio Acosta registrou boletim de ocorrência na 17ª Delegacia de polícia Regional do Interior e protocoulou, em Charqueadas, junto ao Ministério Público Federal, um pedido para que as autoridades da região proteja sua vida e a de outros integrantes da aldeia Guajayvi.

Em 2013, com três famílias, os guarani retomaram estas terras através de uma concessão do estado do Rio Grande do Sul. O terreno era usado pela Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) para plantação de eucaliptos e confeccção de postes de luz. Hoje é usufruto guarani, que já plantaram mais de 2 mil mudas nativas na região e acompanham o ressurgimento da mata. No meio dos eucaliptos, resistiu uma árvore Guajuvira, que dá nome à aldeia e é usada pelos indígenas no artesanato e na medicina. Neste período de sete anos, nunca tinham vivido um incidente semelhante ao final de semana de ataques. “Nesse tempo que estamos aqui ninguém foi parar no hospital. Então a gente vê que espiritualmente é uma área boa”. No entanto, atualmente, o cacique Cláudio Acosta está receoso: “eu já não saio mais para a cidade de Charqueadas com medo”.
O ataque aos mbya guarani da aldeia Guajyvi aconteceu em um momento de forte contestação do Estudo de Impacto Ambiental produzido pela empresa Copelmi. Após o ataque, no dia 23 de setembro, o Comitê de Combate à Megamineração no RS lançou uma nota de repúdio ao incidente e em solidariedade aos guaranis. “Aldeia pode estar sendo vista como uma ameaça à instalação do projeto Mina Guaíba, uma vez que sua presença torna flagrante o fato de a empresa Copelmi não ter realizado em seus Estudos de Impacto Ambiental (EIA) o chamado Componente Indígena, desrespeitando a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ao não realizar consulta prévia à esta Aldeia e à outros territórios indígenas do entorno, bem como ao não avaliar os impactos socioambientais e de saúde à estas comunidades, questões que já estão sendo acompanhadas por inquérito do Ministério Público Federal”.
O artigo “As aldeias Guajayvi e Pekuruty e suas invisibilidades no EIA-RIMA”, produzido por Guilherme Dal Sasso e Lorena Fleury e exposto no Painel dos Especialistas, mostra que há pelo menos duas aldeias na Área de Influência Direta do empreendimento, sem que essas tenham sido consultadas nos estudos produzidos pela Copelmi. O texto traz elementos, como a existência de 37 sítios arqueológicos na região, que evidenciam a presença indígena há pelo menos 600 anos na região.
Nos dias 2 a 4 de outubro, a comunidade guarani da aldeia Guajayvi se reuniu com o Conselho Missionário Indigenista para criar estratégias de aumento da segurança e também para cobrar do poder público a execução de Audiências Públicas sobre a Mina Guaíba dentro das comunidades indígenas.
Quando visitamos a aldeia, no dia 5 de dezembro, havia dois dias que o Ministerio Público tinha ligado para o Cacique Cláudio Acosta questionando sobre a Mina Guaíba. No dia 17 de dezembro, o Ministério Público manifestou-se favorável a uma Ação Civil Pública que pede à Justiça Federal a suspensão do processo de licenciamento da mina alegando justamente que a Copelmi não respeitou a Convenção 169. A Justiça Federal ainda não julgou a ação.
A Copelmi não consultou a comunidade guarani porque a resistência é óbvia. “A mina vai trazer muita doença, espirtualmente e no corpo”, defende o cacique. “Ficamos preocupados em geral porque está acontecendo muita coisa no mundo, terremoto, cidades alagadas. O ser humano não se dá conta porque está acontecendo isso aí. Mas aí chega esse projeto da mina que vai furar não sei quantos metros para baixo. Daqui a alguns anos vai faltar um pedaço de terra, e isso nos preocupa”.
O ataque à aldeia Guajayvi aconteceu no mesmo final de semana em que outras duas comunidades mbya guarani foram atacadas, a aldeia Yjerê, na Ponta do Arado, em Porto Alegre, e a Aldeia Yy Purá, no município de Terra de Areia. O Amigos da Terra Brasil registrou o depoimento das lideranças das três comunidades, pois acreditamos que os incidentes são movimentos articulados de ofensiva crescente contra os povos originários do nosso país, muitas vezes com megacorporações por trás.

Foto: Heitor Jardim/Amigos da Terra Brasil

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Homens se dizendo policiais ameaçam Guraranis da retomada em Terra de Areia

Os ataques seguem aos Mbya Guaranis da Ponta do Arado

Justiça determina retirada da cerca junto ao acampamento guarani na Ponta do Arado

Após considerar ilegal a lei que favorecia a empresa Arado – Empreendimentos Imobiliários S.A sobre a alteração do Plano Diretor de Porto Alegre sem participação popular, a Justiça também determinou que a empresa respeite o direito de ir e vir dos guaranis e o acesso à água.

Nova vitória na Justiça para a retomada Mbya Guarani na Ponta do Arado, agora em âmbito federal. Antes, a Justiça Estadual já havia garantido a manutenção da posse da área pelos indígenas, o que contempla entre outros direitos, o de ir e vir, bem como o acesso a recursos diversos (públicos ou privados). Agora, a Arado – Empreendimentos Imobiliários S.A terá de providenciar a retirada da cerca junto ao acampamento dos guaranis na Ponta do Arado, zona sul da cidade, bem como a liberação dos acessos, a fim de permitir que os indígenas acessem a trilha junto à Orla do Lago Guaíba e o sentido do centro urbano do bairro Belém Novo. Para o TRF4, “tal cercamento gera confinamento desumano”.

Com a decisão da esfera federal, a empresa também deverá remover “a obstrução cimentícia por ela inserida” no poço antigo onde os mbya guaranis tinham acesso à água potável. Em julho de 2018, o acesso por parte das famílias da retomada havia sido proibido pelas empresas que pretendem construir condomínios e hotéis de luxo no local.

A Justiça ainda deferiu que a empresa retire a estrutura de vigilância privada contígua à área ocupada, para evitar intimidações indevidas e conflitos com os indígenas. Desde 2018, os mbya guaranis da Ponta do Arado denunciavam o isolamento involuntário e o monitoramento compulsório que vinham sofrendo por parte da Arado Empreendimentos Imobiliários.

No dia 15 de setembro de 2019, os guarani mbya da Retomada da Ponta do Arado sofreram um ataque por parte dos seguranças da Arado Empreendimentos. Foi o segundo ataque a tiros do ano. 

Confira a decisão aqui.

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