Amigos da Terra Brasil apresenta PL 572 na 8ª Sessão de Negociações do Tratado Vinculante na ONU

 

No evento paralelo organizado pelo Global Interparliamentary Network (GIN, Rede Global de Parlamentares), em conjunto com a Campanha Global para Desmantelar o Poder Corporativo nessa segunda-feira (24/10), durante as negociações do Tratado Vinculante junto à ONU (Organização das Nações Unidas), em Genebra, a Amigos da Terra Brasil apresentou o PL 572/2022, iniciativa para regulamentar as empresas transnacionais no nosso país.

Esses eventos paralelos ocorrem no intervalo das negociações, e o da segunda teve a voz do GIN. Participaram da mesa o europarlamentar Miguel Urban; Sydney Mushanga, parlamentar do país africano Zâmbia; e Lilán Galán, do Parlamento Uruguaio. A deputada federal Fernanda Melchionna iria representar o Brasil mas não pôde comparecer, cedendo seu espaço de fala à coordenadora da Amigos da Terra Brasil e Internacional, Letícia Paranhos.

A atividade visou relacionar as lutas e processos por leis e marcos regionais e nacionais que sejam complementares ao Tratado Vinculante. Nesse sentido, Letícia enfatizou que a proposta do PL 572/2022, primeiro projeto de Lei Marco de Direitos Humanos e Empresas em todo o mundo protocolado no mês de março passado no Parlamento brasileiro, tem a cara da Campanha Global.

 

Evento paralelo organizado pela GIN e pela Campanha Global para Desmantelar o Poder Corporativo durante a 8ª Sessão de Negociações do Tratado Vinculante junto à ONU. Crédito: Amigos da Terra Internacional

 

Ela explicou que, se for aprovada, será uma lei pioneira porque traz três elementos inéditos. A primeira é por ser uma lei sobre direitos humanos, em que a primazia deles é real. “Ou seja, os direitos humanos valem mais do que qualquer acordo de livre comércio e investimento, mais do que o lucro das empresas”, disse. O projeto também aborda um novo olhar sobre o entendimento de centralidade e sofrimento da vítima que existe no Direito Internacional. Paranhos apontou que a partir da perspectiva trazida pelo MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens), este conceito foi transformado para se falar da centralidade do sofrimento das comunidades atingidas. “Centralidade no sentido de dar poder ao povo que realmente é violado pelas transnacionais, desde o processo de prevenção à violação dos direitos humanos”.

O terceiro ponto do PL 572/2022 que a coordenadora da Amigos da Terra destacou é a questão das obrigações diretas para as empresas transnacionais, que é um “vazio no Direito”, já que não há regulamentação e nem obrigação de respeitar os direitos humanos. “Ao contrário, os Estados têm obrigação de fiscalizar as empresas, mas não existe como obrigá-las a respeitar. Já as empresas, no momento em que têm um acordo de livre comércio com um país ou bloco, e se sentem prejudicadas por alguma medida governamental, como uma política pública, podem demandar o Estado numa corte, que chamamos de Tribunal dos Ricos e dos Poderosos, um sistema de arbitragem entre investidor e Estado que, em geral, é muito difícil de um país ganhar”, contou. Paranhos emendou que quando o Estado ganha também perde, pois “se envolver numa demanda judicial com uma empresa é muito complicado, especialmente os do Sul Global, onde os países têm menos dinheiro e poder político”.

A coordenadora citou o crime cometido pela empresa VALE envolvendo o rompimento das barragens com lama tóxica de rejeitos de mineração nas cidades de Mariana (em 2015) e de Brumadinho (2019), em Minas Gerais, que matou mais de 300 pessoas e afetou a fauna e a flora da região. “Existe esta assimetria de poder, esta injustiça que podemos ver no caso da VALE em que o processo de ‘reparação’ não foi capaz de construir sequer uma casa, enquanto os lucros da empresa só aumentaram. A legislação do Governo Bolsonaro aumentou em mais de 500% o orçamento do Ministério de Minas e Energia, inclusive tornando suas atividades como essenciais mesmo durante a pandemia. A empresa, criminosa aos olhos do mundo, não teve suas atividades paradas nem um só dia. Vivemos em uma lama de impunidade”, falou.

A empresa nunca parou suas atividades no Brasil mesmo com os crimes que cometeu. Por outro lado, existem comunidades extremamente violadas e arrasadas e uma bacia hidrográfica inteira afetada, a do Rio Doce. “E isso não é um caso isolado, ocorrem vários outros no mundo, estamos falando de uma crise sistêmica em que as empresas transnacionais estão no centro desta crise, que gera tantas opressões e violações”, disse.

Na atividade paralela, Paranhos analisou que a sociedade civil pressiona por esta regulação de um lado, e de outro a própria União Europeia tem se dedicado a escrever leis de Devida Diligência para tentar regular as empresas que têm sede no continente. Essas legislações ajudam, mas muitas vezes estão esvaziadas devido à pressão empresarial. “E quando os impactos dessas legislações chegam na América Latina, no Sul Global, aterrissam ainda mais esvaziadas e acabam quase que se tornando uma maquiagem para dizer que respeitam. O PL 572/2022 vem justamente para obrigá-las, de forma efetiva, a respeitar os direitos humanos das comunidades e o meio ambiente”.

A 8ª Sessão de Negociações do Tratado Vinculante na ONU prossegue até esta 6ª feira (28/10). Acompanhe as redes sociais da ATBr para mais informações.

Foto: Amigos da Terra Internacional

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