Entenda porque é importante que o Senado rejeite o “PL do Veneno”

Aprovada pela Câmara dos Deputados no dia 9/02, a proposta agora aguarda avaliação do Senado

Você gostaria que a comida que você ingere possuísse elementos químicos que possam gerar infertilidade, malformações de fetos, até câncer? Não, certo? Pois é isso que pode acontecer caso o Senado Federal aprove o projeto de lei 6299/2002. No dia 09 de fevereiro, com 301 votos contra 150 aprovaram o texto-base na Câmara dos Deputados em caráter de urgência, com uma articulação encabeçada por lideranças da bancada ruralista. Além das críticas profundas ao conteúdo do projeto por parte de organizações de pesquisa, saúde e socioambientais, o projeto pode avançar sem o necessário debate com a sociedade sobre os impactos que trará na vida de toda a população para beneficiar o lucro de apenas um setor da economia nacional e concentrar o poder nas mão de uma dúzia de empresas transnacionais que controlam a cadeia global de produção do agronegócio. 

O PL do Veneno, como ficou conhecido, visa que o controle da autorização de novos agrotóxicos no Brasil deixe de ser uma atuação direta do Ministério da Saúde, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Ministério do Meio Ambiente e do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais) e passe a ser gerido apenas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). Além disso, a competência de multar empresas e institutos de pesquisa passaria a ser somente do MAPA. É basicamente deixar a raposa cuidando do galinheiro. 

Além disso, o texto proposto alteraria a lei atual que proíbe a importação de agrotóxicos que apresentem características teratogênicas, carcinogênicas, mutagênicas e causem distúrbios hormonais e danos ao aparelho reprodutor, passado a mera condição generalista de “riscos inaceitáveis”. Se aprovado, o PL ainda altera os prazos para registros dos agrotóxicos pelos órgãos federais,  encurtando para até dois anos, o que poderia prejudicar estudos toxicológicos aprofundados, e quando não houver manifestação conclusiva dentro dos prazos estabelecidos, o agrotóxico receberá uma autorização temporária.

A atual lei já permite o registro eterno de agrotóxicos, enquanto outros países fazem reavaliações periódicas, com o PL aprovado acabaria com os poucos poderes que entidades atuantes no cenário brasileiro têm para requerer o cancelamento de determinado agrotóxico. Um exemplo disso ocorreu em 2017, e passou a valer em 2020, quando a Anvisa publicou uma resolução proibindo o uso e a comercialização do paraquat, criado pela Syngenta, um dos agrotóxicos mais letais do mundo, associado a doenças como depressão, parkinson e câncer. A proibição de uso do produto químico já ocorre na União Europeia desde 2003. Vale lembrar que o bloco pretende aumentar as exportações de suas empresas fabricantes da Europa para o Brasil, caso seja ratificado o acordo de livre comércio com o Mercosul. Por Isso, é importante não apenas barrar o PL 6299/2002 na votação no Senado, mas garantir, através das próximas eleições, que a maioria parlamentar represente os interesses e a saúde do povo e a justiça ambiental e desbanque a bancada do boi.

Afinal, o que propõe o Pacote do Veneno?

Além dos pontos já destacados, como a avaliação de novos agrotóxicos estar sujeita apenas ao Ministério da Agricultura e aos interesses econômicos do agronegócio, caso o PL 6299/02 seja aprovado no Senado Federal o projeto trará as seguintes mudanças na legislação atual:

  • O termo “agrotóxico” será chamado “pesticida”, em uma tentativa de maquiar as toxicidades conhecida dessas substâncias;
  • Será admitida a possibilidade de registro de substâncias proibidas em seus países de origem por apresentarem componentes cancerígenos; serão estabelecidos níveis aceitáveis para isso, embora não existam níveis seguros para substâncias que se demonstrem cancerígenas; 
  • A regulação sobre propaganda de agrotóxicos irá acabar;
  • Será permitida a venda de alguns agrotóxicos sem receituário agronômico e de forma preventiva, favorecendo ainda mais o uso indiscriminado;
  • Estados e municípios enfrentarão dificuldades para ter medidas mais restritivas, embora essas esferas tenham o dever de proteger seu patrimônio natural.
  • Agrotóxicos destinados exclusivamente à exportação serão dispensados de registro. Também são dispensados da apresentação dos estudos agronômicos, toxicológicos e ambientais, sem considerar trabalhadores expostos a esses produtos e resíduos gerados de sua produção.

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Liberar mais agrotóxicos impacta os custos com saúde pública

Diferente do que argumentam os defensores do projeto, o PL não fará com que se modernize a comercialização de químicos para uso do agronegócio. Ao contrário, o Brasil será muito mais permissivo para o registro de agentes mais tóxicos e obsoletos, tornando-se o foco dos mercados desses produtos, que em grande parte já são proibidos em outros países exatamente por serem muito tóxicos. Assim, o Brasil se tornará reduto para escoamento dos produtos que já não podem ser comercializados naqueles países e os produtos mais modernos e de menor toxicidade serão ofertados preferencialmente para aqueles países cuja regulação é mais protetiva.

Se aprovadas, as alterações irão promover uma maior fragilização das diversas ações desempenhadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), especialmente quanto ao monitoramento das águas, da qualidade dos alimentos, dos ambientes de trabalho e das populações expostas aos agrotóxicos, além da própria sobrecarga na atenção de casos de adoecimento da população. O avanço da pauta se soma ao cenário preocupante em que mais de 2.000 agrotóxicos já foram liberados nos últimos quatro anos, incluindo herbicidas proibidos de uso interno na Europa. Um recorde negativo que impacta no sistema de saúde com o uso de químicos que apontam evidências que podem resultar no adoecimento e morte da população, em especial daqueles em situação de maior vulnerabilidade.

O Inca (Instituto Nacional do Câncer) aponta que a exposição aos agrotóxicos pode gerar impactos agudos na saúde dos trabalhadores que utilizam os pesticidas como irritação da pele e olhos, coceira, convulsões, até a morte. Contudo, toda a população está suscetível à exposição a agrotóxicos por meio do consumo de alimentos e água contaminados. Os efeitos adversos decorrentes da exposição aos agrotóxicos podem aparecer muito tempo após o contato. Dentre os efeitos que podem gerar a exposição ao longo do tempo são citados infertilidade, impotência, abortos, malformações, neurotoxicidade, desregulação hormonal, efeitos sobre o sistema imunológico e câncer.

Precisamos discutir a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos

O Brasil já é, desde 2009, o maior consumidor mundial de agrotóxicos Ao invés de discutirmos a flexibilização das leis para o uso de mais veneno nos nossos alimentos, poderíamos estar discutindo a redução gradual do uso de agrotóxicos e o estímulo à transição orgânica e agroecológica. É o que propõe a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos, a PNaRA (PL nº 6.670/2016) defendida por centenas de entidades do campo e da cidade, ligadas à produção e à defesa da agroecologia, da saúde pública, da ciência e da natureza.

Entre as medidas propostas pelo PL 6670/2016 está a reavaliação periódica de registro das substâncias (na legislação atual, o registro é eterno, sem reavaliação ou revogação); a proibição da aplicação de veneno próximo a áreas de proteção ambiental, de recursos hídricos, de produção orgânica e agroecológica, de moradia e de escolas; e a redução da pulverização aérea. Ou seja, garantindo e defendendo, como é dever do Estado e dos representantes do povo no parlamento, os direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais de toda a população brasileira.

Mobilize-se para barrar que esse desastre aconteça!

A Amigos da Terra Brasil está mobilizada contra esse projeto de morte. É importante reafirmar que a luta contra os agrotóxicos está atrelada à luta contra o agronegócio, as grandes corporações e em defesa da vida. Ao passo que o agronegócio recebe altos incentivos do governo, não contribui com retorno social como o pagamento de impostos. Assim, acaba gerando um custo duplo ao Estado, pois gera implicações na saúde pública com o aumento de casos de contaminações e doenças que os agroquímicos geram, não só para quem trabalha na aplicação, mas também no prato de toda a população. Somaremos mais essa vitória contra a lógica que coloca o lucro frente a vida, assim como ocorreu em Nova Santa Rita (RS), em que foi mantida pela Justiça a suspensão de pulverização de agrotóxicos.

Se o conteúdo deste projeto fosse benéfico à sociedade brasileira, a Câmara dos Deputados teria promovido um debate aberto com a população sobre os resultados antes de sua aprovação em caráter de urgência. Precisamos estar cientes dos resultados desastrosos que o PL 6299/2002 pode trazer. Fale sobre ele com a sua rede. Pressione os Senadores para que votem NÃO ao PL do Veneno e assine o baixo-assinado da campanha “Chega de Agrotóxicos”.

#ChegaDeAgrotóxico #PL6299Não #NãoAoPacoteDoVeneno

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